Rui Flávio Chúfalo Guião *
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Para um apreciador de vinhos, como eu, uma viagem para Bordeaux representa a possibilidade de contato com os vinhedos e produtores do melhor néctar do mundo. São centenas de quilômetros quadrados de vinhas, cortados por estradas vicinais e que, nesta época do ano, ficam enegrecidas pelos enormes cachos pendentes das videiras.
Por toda parte, quer seja pelo método de colheita tradicional, quer seja através de máquinas, o cuidadoso produto do cultivo culmina com o recolhimento de generosos cachos, cheios do mosto que se transformarão no belo vinho bordalês.
A forma tradicional de colheita é bem interessante: coloca-se nas costas uma enorme cesta em forma de pirâmide invertida, para onde o colheitador atira os cachos, que foram colhidos manualmente, através de um podão em forma de alicate. Quando cheia a cesta, caminha-se em direção ao carro que receberá as uvas, sobe-se numa pequena escada e, com um volteio do corpo, elas são cuidadosamente despejadas.
Conforme escrevi recentemente, cultivam-se uvas há muitos anos na região de Bordeaux, que se tornou grande produtora quando a Aquitânia, área onde se encontra,foi administrada pelo Rei da Inglaterra. Seu solo é plano, com vários tipos: arenosos, calcários, pedregosos e de argila, sofrendo grande influência dos dois grandes rios que a banham: o Garonne e o Dordogne.
Quando se olha para um mapa da região, vemos que o Garonne recebe como afluente o Dordogne, criando uma grande planície em forma de triângulo entre os dois cursos, região denominada Entre-Deux-Mers (entre dois mares). Ali predominam as uvas brancas Sauvignon Blanc, Semillon e Muscadelle.
Quem gosta de vinho já ouviu falar da distinção entre margem direita e margem esquerda do rio Garonne. Basta olhar para o mapa da região. O Garonne nasce nos Alpes e deságua no Atlântico. Os vinhedos que se localizam na sua margem direita, na altura de Bordeaux, são predominantemente de uvas merlot e cabernetfranc , melhor adaptadas aos solos arenosos e calcários e que têm em Saint Emilion sua maior expressão.
Dividem-se em várias sub-regiões vinícolas: Pomerol, Lalande de Pomerol, Fronsac e Saint-Emilion, sendo mais conhecidos e caros vinhos o ChateauPetrus, o Cheval Blanc e o Angelus.
Os vinhedos da margem esquerda produzem a uva Cabernet Sauvignon, que dá vinhos mais potentes e tânicos e onde encontramos também várias sub-regiões, as mais famosas sendo Medoc, Graves, Sauternes, Saint-Estephe, Pauillac e Margaux. Os vinhos mais conhecidos e caros são o Chateau Margaux, o Lafite-Rothschild, o Latour, o Haut-Brion e Chateau d’Yquem.
Em outra ocasião, tive oportunidade de visitar o Chateau d’Yquém, que produz o vinho homônimo considerado um dos melhores vinhos de sobremesa do mundo, na região de Sauternes.
Ali, por uma combinação geográfica e de solo, as uvas são atacadas por um fungo,o Botrytis Cinerea, que ao furar a casca do bago, permite a saída da água, permanecendo no fruto somente a sua porção açucarada. Como o ataque aos cachos se dá de forma progressiva, na época da colheita, as uvas são escolhidas à mão e tirados somente os bagos já devidamente atacados. Isto exige que os colheitadores processem seu mister de quatro a cinco vezes no mesmo cacho.
O vinho é então produzido, custa bem caro, mas é uma das maravilhas que o homem pode retirar da natureza.
De maneira geral, ao se provarem os vários vinhos ali produzidos, temos a confirmação de que estamos na mais prestigiada região vinícola da França e do mundo.
* Advogado e empresário, é presidente do Conselho da Santa Emília Automóveis e Motos e Secretário-Geral da Academia Ribeirãopretana de Letras