Sérgio Roxo da Fonseca *
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Taís Costa Roxo da Fonseca **
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O observador pela manhã ao abrir sua janela permaneceu ali, em seu próprio espaço, notando que os pássaros tomavam conta do jardim, aparentemente para construir um ninho nas beiradas da jabuticabeira. Voavam firmes, de lá para cá, demonstrando o seu respeito de bem cumprir o dever de casa. No período da tarde o ninho já estava armado e um deles se preparava para deixar seus ovos naquele plano residencial, montado com os gravetos encontrados pelo chão.
Eram eles marido e mulher, perdoe-nos, eram pássaros vivendo a sua etapa de acasalamento. Mas como um conheceu o outro? Ou melhor, como um identificou no outro a intimidade suficiente para instalar ali a sua residência para celebrar a convivência matrimonial?
Sem resposta. Mas como um identificou no outro os instrumentos existências para, ensejando a sua aproximação, abria portas para a existência de seus filhotes?
Seguramente identificavam um no outro os elementos necessários e suficientes para a instituição do relacionamento familiar. Um conversava com o outro? Um derramava seu carinho ao outro? Se a resposta for positiva, quem ensinou a eles as regras da convivência doméstica?
Passados os dias, surgiram os filhos, melhor dizendo, os filhotes que publicavam a sua fome para que seus pais imediatamente servissem a refeição. Mas quem ensinou a uns as regras da refeição e aos outros o dever de instalar os pratos?
Coube ao observador documentar historicamente a evolução do lar, sem qualquer interferência estranha, tudo documentado pelo aparecimento de penas nos filhos como resultado da hipotética felicidade dos pais amorosos.
Talvez os dias somados abriram espaços para definir ou redefinir a convivência da família. Ou talvez, a intervenção divina, atingindo todas as famílias de pássaros, espalhadas pelo mundo afora, conformariam aquela sociedade.
Mas o observador permanecia estarrecido coma ausência de informações plausíveis.
Tanto os homens como os pássaros demonstraram a necessidade da convivência amorosa. Aos homens houve juridicamente reconhecida a informação escrita pelos seus antepassados. Do império bizantino veio o texto nascido em Roma, segundo o qual “jus est ars boni et aequi: honeste viveve,cuique tribuere, neminem laedere” (o direito é a arte do bom e do justo: viver honestamente, dar a cada um o que é seu, não lezar ninguém).
Os pássaros, com certeza, estão submetidos a regras mais antigas do que as romanas. E as obedecem, desde o momento em que construíram sua família, outorgando sobrevida aos seus filhotes, mantendo em seu ninho para o acasalamento coma esposa.
Mas como um pássaro identificou em outro pássaro os elementos identificadores de sua esposa? Como um comunicou ao outro o dever de construir um ninho? De onde extraíram que do interior dos ovos postos sobreviveriam os filhotes que deveriam alimentar?
O observador não encontrou nenhuma resposta para as questões. Nem nas folhas de seus livros. E nem mesmo no âmago de sua própria alma.
* Advogado, professor livre docente aposentado da Unesp, doutor, procurador de Justiça aposentado, e membro da Academia Ribeirãopretana de Letras
** Advogada