A utilidade dos instrumentos multidimensionais repousa no seu valor incremental sobre o modelo unidimensional ou bidimensional (intensidade/afeto). Cumpre lembrar que há suposições segundo as quais os instrumentos multidimensionais podem aumentar a utilidade se eles atingirem os seguintes critérios: (1) aumento da acurácia dos registros da experiência de da dor, (2) aumento do poder da sensibilidade diagnóstica, (3) aumento da comunicação sobre a experiência da dor e, portanto, da empatia com os pacientes sofrendo de dor e (4) melhora do emparelhamento entre os dados neurofisiológicos e psicológicos. Importante mencionar que com o aumento substancial na sensibilidade das técnicas de imageamento cerebral, esperam-se maiores especificidades em termos de quais áreas cerebrais correspondem a quais dimensões ou atributos da dor. Deste modo, entre a ampla variedade de escalas multidimensionais frequentemente mencionadas na literatura clínica acerca da avaliação da dor, selecionamos, para serem sumariados, o Questionário McGill de Dor e o Inventário Multidimensional de Dor cujas propriedades metrológicas têm sido aferidas e, também, sua utilidade clínica demonstrada em contextos clínico-hospitalares e de pesquisa em várias culturas e línguas diferentes.
Questionário McGill de Dor (MPQ) – O Questionário McGill de Dor se constitui num instrumento amplamente aceito como fidedigno, válido, sensitivo e preciso. Por ser genuinamente multidimensional ele avalia a dor em três dimensões, a saber: sensorial, afetiva e avaliativa, sendo baseado em palavras (descritores) que os pacientes selecionam para descrever sua própria dor. A dimensão sensorial inclui descritos que descrevem a qualidade da experiência de dor em termos de propriedades temporais, espaciais, pressão, térmica e outras similares. A dimensão afetiva inclui palavras que descrevem a qualidade da experiência de dor em termos de tensão, medo, temor, receio e propriedades autonômicas que são parte da experiência de dor. As palavras incluídas na dimensão avaliativa descrevem a intensidade subjetiva global da intensidade da dor. Alguns descritores são, sem dúvida, sinônimos; outros parecem ser sinônimos, mas variam em intensidade e muitos outros apresentam diferenças sutis ou nuances (a despeito de suas similaridades) que podem ser importantes para um paciente que está desesperadamente tentando comunicar-se com um clínico.
Este instrumento inclui várias subclasses de descritores ou adjetivos, um diagrama corporal em que o paciente possa desenhar a localização e a distribuição espacial da dor, além de alguns descritores que refletem as propriedades temporais da dor e uma escala para mensurar a intensidade global de dor presente. Este questionário é, certamente, a medida mais amplamente usada para avaliação da dor. Uma forma reduzida do mesmo foi desenvolvida, a qual aumentou a sua utilidade clínica. O tempo de aplicação situa-se entre 15-20 minutos, mas alguns clínicos experientes tomam 5-10 minutos.
Inventário Multidimensional de Dor (MPI) – Este inventário multidimensional foi construído baseando-se na premissa de que uma avaliação compreensiva e global de pacientes adultos, sofrendo de dor crônica, deveria incluir informações sobre suas condições físicas, psicossociais e comportamentais. A integração deste tipo de informação é clinicamente útil na tomada de decisões a respeito da terapia, especialmente para identificar o programa de manejo de dor e para avaliar como os resultados dos tratamentos da dor podem mudar no decorrer do tempo. Este inventário é, teoricamente, relacionado às condições cognitivo-comportamentais e leva em consideração uma variedade de aspectos da experiência de dor de um indivíduo, incluindo a percepção do paciente das reações de outros em relação aos próprios sintomas e sinais, bem como a percepção de limitações comportamentais e o impacto causado pela dor no estilo de vida do paciente (as funções).
Em suma, este inventário foi concebido como um meio de enriquecer o entendimento da dor, assistir no desenvolvimento e avaliação de novas abordagens de tratamento e fornecer ao clínico com uma estratégia viável para a avaliação das diferenças individuais entre pacientes com dor crônica. Para cada item do inventário os pacientes são solicitados a darem suas respostas numa escala numérica de 7 categorias (pontos).
Os instrumentos unidimensionais, medindo apenas a intensidade da dor, e por não considerarem outras dimensões da dor, podem ser rapidamente administrados, tornando-se, portanto, vantajosos onde uma rápida e frequente medida de dor é necessária. De outro lado, os instrumentos multidimensionais entendem que a experiência de dor é multifacetada, variando em quantidade e qualidade, e, portanto, suas múltiplas dimensões podem ser apenas capturadas por meio de múltiplos itens ou subescalas avaliando os componentes sensoriais, afetivos e funcionais.