Os olhos verdes não mentem, apenas acumulam mistérios e segredos enigmáticos, escondidos e insondáveis.
São como as Turmalinas guardadas séculos após séculos nos mais profundos solos das minhas Minas Gerais.
O verde quando você olha pensativo e absorto pela janela de um ônibus, em uma viagem sem motivos, apenas pelo prazer das paisagens, o que vês em todas as vastidões são as cores verdes em todos os seus tons.
Momentos que você se lembra do genial músico e compositor baiano, Caetano Veloso: “De repente me lembro do verde. A cor verde. A mais verde que existe. A cor mais alegre. A cor mais triste. O verde que vestes. O verde que vestiste. No dia em que te vi. No dia em que… me viste”.
Foi um tom deste que levou meu coração.
Hoje, nas minhas noites intermináveis com o absoluto silêncio sem olhares me lembro deles, apertadinhos sob uma sobranceira em curvas, protegidos pelos cabelos únicos em mexas, de uma cor inexplicável, deixando levemente transparecer um pescoço majestoso de Cisne Imperial.
Sempre soube que esta silhueta de raro esplendor, não seria eterna, como Madri que tanto amei não foi.
Esta indescritível e maravilhosa cidade da Península Ibérica, com um nome predominantemente feminino, de origem Árabe que significa “Águas Correntes”, junto com os olhos verdes também desapareceram, como disse o poeta: “assim dos lábios a vida corre, deixando um acre sabor na boca”, aproveito e complemento, rogando “licença poética” ao Vate recifense: “este, não passa”.
No trem para Barcelona a encontrei, em seu charme deselegante, ela desfilou pelo vagão e sequer deu bom dia.
Sua rudeza contrastava com seu caminhar faceiro e tímido, de moça do interior, misto de presença e silêncio, quase uma arrogância displicente.
Ela retirou da bolsa uma caneta, desviava o olhar dos meus e mirava o teto, pensava e escrevia, fazia anotações, em um caderno, com aquelas mãos dignas de um Antoni Gaudí, unhas perfeitas em um desenho arquitetônico, culminando com um esmalte discreto.
Passou muito tempo e até hoje a sinto em meus sonhos e saudades, acariciando meu rosto e meus cabelos, seu silêncio sepulcral, sua distância presente, seu cheiro que desafia o mais raro e sensível perfume já descoberto pelas mãos do homem.
Apenas com os olhos verdes dizia o que todos os homens tentavam adivinhar e sonhavam ouvir. Um enigma de mulher, fera e fêmea.
Anos depois fiquei sabendo que ela estava residindo em Ribeirão Preto, relutei, pensei e arrisquei um número, disquei, com as mãos trêmulas, depositei o aparelho no gancho, como tão bem descreveu este momento de medo e incerteza, “desliguei, foi engano” corri para o nosso maestro soberano, Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, abri um vinho e fiquei ouvindo: “Lígia”.
E quando eu lhe telefonei, desliguei, foi engano
O seu nome, não sei
Esqueci no piano as bobagens de amor
Que eu iria dizer, não, Lígia, Lígia
Eu nunca quis tê-la ao meu lado
Num fim de semana
Um chope gelado em Copacabana
Andar pela praia até o Leblon
E quando eu me apaixonei
Não passou de ilusão, o seu nome rasguei
Fiz um samba canção das mentiras de amor
Que aprendi com você
É, Lígia! Lígia!…
A gente se amou loucamente por três dias em um romântico e bucólico hotel no Centro de Barcelona.
Entre beijos sorvidos em lábios de vinho nos separamos, hoje ao ouvir Chico Buarque, não posso deixar de lembrar: “se no amamos como dois pagãos, teus seios ainda estão nas minhas mãos, diz com que cara eu vou sair”.
Nunca soube o seu nome, apenas a chamava de “Olhos Verdes”.