O novo trabalho da Cia. Druw, dirigido pela coreógrafa Miriam Druwe, mergulha uma vez mais nas artes plásticas em diálogo com a dança e coloca em cena um dos mais importantes artistas brasileiros: Candido Portinari (1903-1962). Em “Por Ti Portinari”, o grupo, com autorização e colaboração de João Candido Portinari, único filho do artista, parte da grande obra “Guerra e Paz”, criada a pedido do governo brasileiro para a sede da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, Estados Unidos.
A obra – dois painéis produzidos entre 1952 e 1956 – de 14 metros de altura, foram expostos no Brasil pela primeira vez em 24 de fevereiro de 1956, antes de embarcarem para Nova York e são um grito pela paz, contra toda e qualquer forma de violência. O espetáculo é resultado de um antigo desejo da coreógrafa Miriam Druwe.
A preocupação com os direitos autorais, contudo, fez a diretora engavetar o projeto. Em 2019, a partir de uma conversa com Marcela Benvegnu, curadora de um festival do qual sua companhia participava, a ideia tornou-se mais factível: Marcela sugeriu apresentar Miriam a João Candido Portinari, filho do artista, que não hesitou em acolher a proposta e acabou até mesmo colaborando com o espetáculo.
“O João é de uma grande generosidade. Tem um amor pela obra do pai e, por isso, digo que é um herói. Só temos acesso a esse acervo por causa de todo o trabalho que ele desenvolveu, viajando pelo mundo, catalogando as obras. Foi muito acolhedor conosco”, conta Miriam. “Quando comecei a escrever o projeto, a obra que acabou me arrebatando foi ‘Guerra e Paz’, quando mal sabíamos que entraríamos na guerra”, brinca a diretora, referindo-se à pandemia.
Em um processo criativo “colaborativo”, que envolveu a diretora, os bailarinos (dentre eles, os atores Thiago Amaral e Fabrício Licursi) e a consultoria de Cristiane Paoli Quito, o grupo passou a investigar qual era a “travessia” da guerra para a paz. Um dos “insights” que acabaram pautando o espetáculo foi que, no painel da Guerra, Portinari universalizou a dor, mas também imprimiu na tela as suas memórias de infância, ligadas aos retirantes.
Vem daí também a travessia: “Ele foi para o mundo e quis voltar pra Brodowski; quis retomar a paz retornando ao estado de infância”, diz Miriam. Foi assim que surgiram os “ganchos” e as “pontes” para a encenação. A forma de conectar a tensão entre a paz e a guerra com o universo infantil foi a inserção em cena de uma série de brincadeiras que trazem conflitos dentro delas, como a amarelinha – que vai do inferno ao céu –, ou nos próprios nomes, como “cabo de guerra” e “vivo ou morto”.
Tudo isso trazendo à tona, em projeções, outras obras do artista, como “Os Retirantes” (1944), “Os Espantalhos” (1959) e “Meninos no Balanço” (1960). A trilha sonora, assinada por Ed Côrtes, acompanha a tensão da dramaturgia, costurada ainda pela leitura de poemas de Portinari e de trechos do livro “Meninos de Brodowski”, de João Cândido.
Uma das principais preocupações, segundo Miriam, era não tornar a produção do artista um mero “pano de fundo”. Assim, o título ressoa outros sentidos: “O ‘Por Ti’ não é apenas uma homenagem a ele; mostra que o espetáculo atravessa a obra dele”.
Quem quiser acompanhar o espetáculo da Cia. Druw pode acessar o canal da companhia no YouTube gratuitamente (youtube com/ciadruw). As apresentações serão nesta sexta-feira, 29 de janeiro, às 12 e às 18 horas: no sábado (30) e no domingo, 31 de janeiro, às 12, às 16 e às 18 horas; e de segunda (1º) a quarta-feira, 3 de fevereiro, às 12 e às 18 horas.