Poeta, ensaísta, tradutora e crítica literária uruguaia, Idea Vilariño (1920-2009) pertencia ao grupo de escritores da famosa Geração de 45. Ainda jovem, lecionou literatura para o ensino médio de 1952 até o golpe de Estado de Estado de 1973 e, depois, para o ensino superior, na Faculdade de Humanidades da Universidade da República Oriental do Uruguai, nesta respondendo pela cátedra de Literatura Uruguaia desde 1985. Autora de poemas passionais, dedicados a Juan Carlos Onetti, teve com este, de 1950 a 1961, um relacionamento apaixonado, tornado mito no contexto da literatura uruguaia. Paixão turbulenta, repleta de rupturas, encontros, desencontros, reconciliações e incompatibilidades, nela, Vilariño era a autora majestosa e hierática, enquanto Onetti, o escritor genial e maldito. De acordo com especialistas, Idea Vilariño e Juan Carlos Onetti eram, na década de 50, o centro da vida intelectual de Montevidéu e Buenos Aires, respectivamente. Já conhecendo os textos, um do outro, seu encontro pessoal só veio a ocorrer posteriormente a isso, em um café no centro de Montevidéu. Nas palavras de Onetti, “Me encontrei com uma jovem magra, séria e silenciosa, intensamente sedutora”. Nas palavras de Vilariño, “Estava me seduzindo de verdade com o melhor de si mesmo e tanto que eu achei que aquilo fosse a sétima maravilha. Essa mesma noite me apaixonei por ele. Me apaixonei, me apaixonei, me apaixonei.”
O final da paixão, retratado nos versos desesperados, e melancolicamente proféticos, do poema “Ya no”, através do qual, transporta o leitor numa viagem ao interior, aos meandros da dor e da angústia perante um futuro aniquilado: “Ya no será / ya no / no viviremos juntos / no criaré a tu hijo / no coseré tu ropa / no te tendré de noche / no te besaré al irme. / Nunca sabrás quién fui / por qué me amaron otros. / No llegaré a saber por qué / ni cómo nunca ni si era de verdad / lo que dijiste que era / ni quién fuiste / ni qué fui para ti / ni cómo hubiera sido / vivir juntos / querernos / esperarnos / estar. / Ya no soy más que yo / para siempre y tú ya / no serás para mí / más que tú. / Ya no estás / en un día futuro / no sabré adónde vives / con quién / ni si te acuerdas. / No me abrazarás nunca / como esa noche / nunca. / No volveré a tocarte. / No te veré morir”. Proféticos, o que ficou retratado nestes versos vindo a se cumprir em 1987, sete anos antes de Onetti vir a falecer, por ocasião da visita que Vilariño viera a lhe fazer em Madrid, seu exílio.
Fato, este, registrado por Idea na Carta 2, que integra sua obra: “Estás longe e ao sul / aí não são quatro horas. / Recostada na tua cadeira / apoiada na mesa de café de teu quarto / atirado numa cama / a tua ou a de alguém que quisera apagar / – estou pensando em ti / não em quem busca / a teu lado o mesmo que eu quero –. Estou pensando em ti já faz uma hora / talvez meia / não sei. / Quando a luz se acabe / saberei que são nove / estirarei a colcha / vestirei a roupa preta / e me pentearei. / Irei jantar, claro. / Porém em algum momento / voltarei a este quarto / me estirarei na cama / e então tua lembrança / que digo / meu desejo de te ver / que me mires / tua presença de homem que me falta na vida / se apresentarão / como agora apareces na tarde / que já é noite / a ser / a única coisa / que me importa no mundo”.
Autora de uma poesia intimista, de vitalismo avassalador, nela Vilariño apresenta a vida como uma luta feroz e constante que desagua na morte. Produção obscura e melancólica, caracterizada por versos curtos e temáticas que, na época, eram censuradas para mulheres, escreveu alguns dos versos mais representativos da cultura e do patriotismo uruguaio, alguns deles tendo se tornado letras de músicas e hinos nacionais, como é o caso de Los orientales (Os uruguaios): “De todas as partes vêm, / sangue e coragem, / para salvar seu chão / os orientais; / vêm das coxilhas, / com lança e sabre, / dentre as ervas brotam / os orientais. / Saem dos povoados, / do monte saem, / em cada esquina esperam /os orientais. // Porque deixaram suas vidas, / seus amigos e seus bens, / porque é mais querida / a liberdade que não têm, / porque é alheia a terra / e a liberdade alheia / e porque sempre os povos / sabem romper suas correntes. / Eram dez, eram vinte, / eram cinquenta, / eram mil, eram milhares, / já não se contam. / Rebeldes e valentes / se vão marchando, / as coisas que mais querem / abandonando. / Como um vento que arrasa / vão arrasando, / como a água que limpa / vêm limpando. / Porque deixaram suas vidas…”.
Com uma poesia marcada pelo pessimismo, como a de Onetti, seu último poema tem só dois versos: “Inútil dizer mais / Nomear já basta”. Sendo Juan Carlos Onetti, Idea Vilariño e Mario Benedetti três dos pilares mais relevantes da geração de 45, por estranha coincidência, em2009, ano do centenário de Juan Carlos Onetti, morre a poetisa que foi seu grande amor, Idea Vilariño, e, duas semanas depois, o grande amigo de ambos, Mario Benedetti. Integrando o grupo fundador da revista Clinamen, ligada ao grupo de poetas e escritores como Juan Carlos Onetti, Mario Benedetti, Ángel Rama, Amanda Berenguer e Emir Rodríguez Monegal, dentre seus livros estão “Cielo Cielo” (1947), “Por aire sucio” (1950), “Nocturnos” (1955), a coletânea “Poemas de amor”(1957), um dos mais populares livros de poesia no Uruguai, “Pobre Mundo” (1966) e “No” (1980). Por adição, alguns de seus poemas, musicados, alcançaram imenso sucesso, como, por exemplo, “A una paloma” e “Ya me voy pa la guerrilla”.