Manuel Ricardo Palma Soriano (1833-1919) foi um escritor peruano educado em escola jesuítica, alternando seus estudos com o serviço voluntário na marinha de seu país por seis anos. Envolvido com a política liberal desde jovem, conheceu o exílio no Chile, em 1860. Entre os cargos públicos ocupados, foi Cônsul do Peru no Estado brasileiro do Pará. Segundo seus biógrafos, A Guerra do Pacífico (1879-1883) entre o Chile e o Peru interrompeu a vida de Palma e resultou na destruição praticamente completa de sua própria biblioteca, bem como, das obras que constituíam a Biblioteca Nacional do Peru. Nomeado diretor desta, ao final do conflito, o autor permaneceu neste cargo até sua aposentadoria, em 1912. Buscando reconstruí-la, conseguiu que a mesma voltasse a ser uma das principais bibliotecas da América do Sul. Neste contexto, sua amizade pessoal com o, então, presidente chileno Domingo Santa María permitiu-lhe recuperar cerca de 10.000 livros saqueados, além de muitos outros, graças a seus esforços pessoais. Frutos de seus relacionamentos amorosos, dois filhos, entre os demais, seguiram a carreira literária: Clemente Palma, escritor de contos fantásticos e histórias de terror, inspirado na obra de Edgar Allan Poe, e Angélica Palma, escritora, jornalista e biógrafa peruana, membro ativo do movimento feminista no país.
Ricardo Palma, como era conhecido, iniciou-se na literatura através de dramas românticos e poemas, tornando-se editor de um jornal político e satírico peruano, o “El Diablo (O Diabo)”, aos 15 anos. Seu primeiro livro de versos, “Poesías (Poemas)”, apareceu em 1855. Em 1863, seu livro “Anales De La Inquisicion De Lima: Estudio Histórico”, sobre as atividades da Inquisição espanhola durante o período do vice- reinado do Peru, angariou-lhe reputação de estudioso da história de seu país. Neste mesmo contexto, Palma publicou no jornal El Burro (O Burro) e na revista satírica La Campana (O Sino) críticas satíricas da política peruana no século XIX. Fundador da revista La Broma (A Piada), também colaborou regularmente com El Mercurio, El Correo, La Patria, El Liberal, Revista del Pacífico e Revista de Sul América, além de correspondente da imprensa estrangeira durante a Guerra do Pacífico.
Criador do gênero literário peruano intitulado “tradiciones”, contos que misturam história e ficção, voltados a divertir e educar o leitor, Palma conquistou grande público sul-americano, relatando-lhes fatos ocorridos durante vários séculos no Peru, com ênfase nos tempos coloniais e republicanos. Publicadas de 1872 a 1910, e oriundas de fontes primárias e narradores orais, foram traduzidas para o inglês sob o título “The Knights of the Cape and Thirty-seven Other Selections from the Tradiciones Peruanas of Ricardo Palma” (ed. por Harriet de Onís, 1945) e, mais recentemente, sob o título “Peruvian Traditions” ( ed. por Christopher Conway e traduzido por Helen Lane, Oxford University Press, 2004). Contribuição considerável para a literatura peruana e sul-americana, ambas são classificadas, pela crítica, como obras do Romantismo do século XIX.
Seu estilo? Palma geralmente começa com um “teaser”, mencionando algum provérbio ouvido em sua juventude, ou algum incidente lido em antigos manuscritos ou crônicas, algum pequeno evento histórico que precise de explicação, ou algum costume antigo que mereça interesse. Ele então continua inventando diálogos para os vários personagens, concluindo com a exposição de traços salientes o suficiente para que possamos compreender o ocorrido. É decididamente irreverente para com a Igreja e para com sacerdotes. Por sua vez, após a morte de Palma, as “Tradiciones en Salsa Verde” vieram a público, sendo esclarecido o temor do autor de chocar o povo peruano com a natureza erótica das mesmas. Também de autoria de Palma é a obra “Monteagudo y Sánchez Carrión” (1877).
Notável estudioso das línguas de seu continente, Palma também escreveu uma série de trabalhos sobre o assunto, incluindo os “Neologismos y americanismo” e “Papeletas lexográficas”, trabalhando com afinco para que as contribuições latino-americanas e peruanas à língua de Espanha fossem reconhecidas pela Real Academia Espanhola. De acordo com especialistas, em 1999, uma conhecida casa de leilões de Londres anunciou a venda de um lote de 50 cartas que Ricardo Palma tinha escrito a um amigo argentino. O Ministério das Relações Exteriores do Peru convenceu a Biblioteca Nacional do Peru a participar do leilão. Fazia mais de 50 anos que o país não comprava patrimônio cultural no exterior. Hoje, essas cartas são mantidas na Biblioteca Nacional do Peru. A Universidade Ricardo Palma publicou recentemente as cartas de Palma em três volumes (2005–2007).