De acordo com Carlos García-Bedoya Maguiña, especialista em literatura peruana, a periodização desta pode ser dividida em duas etapas, uma de autonomia andina (até 1530), e outra de dependência externa (de 1530 até a atualidade). Na primeira, encontra-se a produção vinculada ao Império dos Incas, em território centro-andino (correspondente ao Equador, Peru, Bolívia e Chile), com manifestações poéticas (em língua quichua ou runa sami), líricas (harawis) e épicas (hayllis), emitidas por um bardo (harawec), cantor e contador de histórias, em funerais, festas, parrandas (filmagens dramáticas), matrimônios, brigas, guerras e outros eventos, característicos dos rituais da nação. Ao lado desse tipo de poesia, seguem-se as histórias orais que expressam os mitos de criação do mundo andino. Como elas chegaram até a atualidade? Narradas nos trabalhos dos primeiros cronistas, como em Inca Garcilaso, que recupera poesia quéchua, e em Guamán Poma de Ayala, relator do mito das cinco idades do mundo. Exemplos? Em Adolfo Vienrich, autor de “Azucenas quéchuas”. Considerada por alguns, como José de la Riva Agüero, representante do movimento político intelectual Hispanismo, uma manifestação literária “insuficiente” para representar a literatura peruana no Cânone, “Azucenas quéchuas” é entendida por Luis Alberto Sánchez, intelectual peruano atuante em vários gêneros, como obra agregadora de elementos da tradição, influentes na literatura posterior, como, por exemplo, na obra do autor peruano Mariano Melgar, capaz de apresentar a literatura mestiça ou crioula (misto de produção indígena e espanhola) de então.
Literatura pré-hispânica, que, recompilada, apresentou ao mundo trabalhos como os de Adolfo Vienrich, com a obra “Tarmap Pacha Huaray” (Azucenas Quechuas, 1905) e “Tarmapap Pachahuarainin” (Fábulas quechuas, 1906), é neste contexto que Jorge Basadre, historiador, com suas obras “La literatura inca” (1938) e “En torno a la literatura quéchua” (1939), acompanhado de José María Arguedas, com seus estudos antropológicos e folclóricos, em especial sua tradução de “Dioses y hombres de Huarochirí”, único texto quechua popular conhecido dos séculos XVI e XVII, oferecem, ao público, um quadro completo e coerente da mitologia, ritos e sociedade de uma província peruana antiga.
No século XX, Martin Lienhard, estudioso literário, historiador, antropólogo e professor emérito da Universidade de Zurique, dedicou-se a esta questão em seus ensaios “La voz y su huella” e “Escritura y conflicto étnico-cultural en América Latina”, assim como, Antonio Cornejo Polar, acadêmico, professor de literatura e crítico cultural, conhecido particularmente por sua teorização do conceito de heterogeneidade, com suas obras “Escribir en el aire: ensayo sobre la heterogeneidad socio-cultural en las literaturas andinas”, Edmundo Bendezú, com seus ensaios “Literatura Quechua” e “La otra literatura” e Gerard Taylor, com “Ritos y tradiciones de Huarochirí”, “Manuscrito quechua del siglo XVII” e “Relatos quechuas de la Jalca”.
Precisamente, é Bendezú quem afirma que a outra literatura (feita ou escrita em quéchua) se constitui, desde a conquista, em uma literatura permanente, com tradição de quatro séculos e sistema marginal, oposto ao dominante (de veia hispânica). Nas suas palavras, há uma grande tradição (“enorme massa textual”) marginalizada e deixada de lado pelo sistema escritural ocidental, já que esta “outra” literatura é, como o quéchua, plenamente oral.
Por sua vez, quando se usa o termo “literatura del decobrimento e conquista”, cunhado por Francisco Carrillo Espejo, o objeto a ser analisado pertence ao período que inclui todas as obras produzidas durante o processo de descobrimento e conquista do Peru, inaugurado em 15 de novembro de 1532, em Cajamarca, com a captura do último Inca, Atahualpa, e finalizado com a destruição do Império Inca e a fundação da cidade de Lima. A literatura relacionada a este período, ainda que não escrita necessariamente durante este marco temporal (como se vê nos últimos cronistas em tocar o tema), vincula-se aos eventos desenvolvidos antes ou durante este. As principais manifestações literárias deste período são as crônicas, cartas de descobrimento e relações. Nesta segunda etapa, o corpus mais abundante e difundido encontra-se em espanhol e foi escrito, geralmente, por membros das elites. Os estudos literários mais importantes realizados sobre este período incluem a “Enciclopédia histórica de la literatura peruana”, de Francisco Carrillo Espejo, e os diversos livros sobre os cronistas antigos, publicados por Raúl Porras Barrenechea, um dos pensadores peruanos mais importantes do século passado. Professor de renome, historiador, ensaísta, diplomata e político, Barrenechea tinha, como paixão, o ensino. Em suas aulas, do nível secundário ao superior, bem como, em reuniões sociais, seminários ou conversas, sempre buscando transmitir sua paixão pela história e pelo pensamento peruanos, o que deixou uma marca indelével em inúmeras gerações.