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O paradoxo da IA no ensino superior

A Inteligência Artificial (IA) tem sido tratada cada vez mais como algo inexorável para o mercado e res­ponsável por uma série de reflexões sobre educação. Há, no entanto, um paradoxo que me parece funda­mental: essa tecnologia é excepcional para descober­ta de padrões e raciocínio estatístico, algo bastante desafiador para nós seres humanos, mas ainda bastante limitada em outros processos, fáceis para nós, como aprendizado autodirigido, senso comum e julgamento de valor.

Arrisco dizer que o que chamo de paradoxo da IA nos leva quase que instintivamente a pensar na complementariedade entre inteligência artificial e educação formal de qualidade. A IA decretará o fim de um modelo de ensino superior baseado na mera reprodução sem fim de aulas quase sempre sem in­teração à distância. Há que se pensar em um ensino híbrido que se beneficie do melhor dos dois mundos, ensine os alunos a extrair o melhor da tecnologia e possibilite uma troca cada vez mais rica entre pares. Esse encontro deve resultar em um ciclo virtuoso na educação, acompanhado e incentivado diligentemen­te por professores sensíveis e preparados para essa mudança de cenário.

A IA terá de ser parceira de uma educação socrá­tica, onde a maiêutica, escola filosófica que valoriza a pergunta, será um instrumento fundamental na construção de uma boa interação homem-máquina. Afinal, em algum momento do que se chama educa­ção contemporânea se fez uma opção pelo chamado ensino crítico, que muitas vezes foi prejudicado pela ideologia do mediador, limitando a reflexão do aluno a vieses políticos, à direita ou à esquerda, empobre­cendo a relação de ensino-aprendizagem, seja na sala de aula ou por meio de uma tela.

Não há dúvida que para essa revolução em curso, há que se capacitar docentes e discentes para o debate, como faziam os gregos. E o atual cenário de polarização, incendiado e muito pelas redes socais e tecnologia, não contribui para essa exigência do ensino de olho no futuro. Hoje em dia o debate tem sido cerceado, a circulação de ideias limitada àquilo que ditam os algoritmos e vozes dissonantes têm sido silenciadas por um ou outro grupo de interesse e gerado um permanente estado de desconfiança entre as pessoas.

Há que se voltar a fazer educação pensando nos valores que a relação ensino-aprendizagem deman­da, para um futuro de prosperidade para todos. Não há solução individual para momentos históricos como esse que se avizinha. Com a adoção cada vez maior de sistemas de IA, urge a reponsabilidade da universidade na construção desse futuro, que se distancie gradativamente das distopias da literatura e do cinema estudadas no ensino superior.

O envolvimento coletivo e coordenado por gover­nos, empresas, academia e cidadãos será capaz de formular perguntas autênticas sobre como queremos viver no futuro e, para isso, será necessário retomar a sugestão do filósofo Emmanuel Mounier “é preciso retomar a revolta dos nossos 20 anos e as rupturas dos 25”.

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