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O Equador e sua literatura (27): Eliécer Cárdenas 

Rosemary Conceição dos Santos* 

 Eliécer Cárdenas (1950-2021) foi um romancista equatoriano que, desde a juventude, questionou os sistemas repressivos. Segundo de nove irmãos, tal comportamento lhe fez permanecer pouco tempo nas escolas que frequentava, bem como, ser suspenso diversas vezes. Participando das reuniões dos Jovens Socialistas, com estes lutou contra o Ministério da Educação pela gratuidade nas matrículas universitárias. Em 1970, tendo sido preso durante a ditadura de Velasco Ibarra, continuou seus estudos, formando-se em Ciências Sociais, em 1976, pela Faculdade de Jurisprudência da Universidade Central do Equador. 

De acordo com estudiosos de sua obra, foi a mãe quem lhe incutiu o amor pelas letras, deu-lhe livros e ele começou a ler histórias infantis e poesias. De 1977 a 1978 escreveu o romance “Polvo y ceniza” (Poeira e Cinzas), no qual participou num concurso de romances da Casa da Cultura Equatoriana para escritores com menos de 40 anos, vencendo em primeiro lugar. O livro, publicado em 1979, é o romance mais vendido no Equador. A obra traz a figura lendária e mítica do herói bandido. As primeiras circunstâncias que o protagonista Naún Briones enfrenta ensinam-lhe que, devido à sua condição de cidadão de terceira ordem, deve ser limitado e submetido a um mundo enganoso e injusto, no qual não tem como escapar devido à sua condição social. Sem solução à vista, sua única alternativa é seguir o caminho do assalto, roubo e assassinato. Esta violência, então, faz germinar uma mudança: sua pessoa torna-se glorificada porque entende sua missão como sendo algo necessário para ajudar os abandonados e os miseráveis: trazendo bem-estar e saciando a fome dos necessitados. 

No Equador, o romance teve obras que se destacaram por carregar em si um acentuado significado político, regional e social. Este romance, alçando Cárdenas no auge da narrativa equatoriana na década de 1980, foi logo sucedido por outros sucessos literários, como, por exemplo, “Del silencio profundo” (1980), “Siempre se mira el cielo” (1985), “Las Humanas Certezas” (1986), “Morir en Vilcabamba” (1988), “Los diamantes y los hombres de provecho” (1989), “Diario de un idólatra” (1990), Una silla para Dios” (1997), “El oscuro final del Porvenir” (2000), “Las innumerables tribus de los muertos” (2004), “El viaje de Padre Trinidad (2005), “Raffles manos de seda: (la leyenda de un bandido) (2008), “El árbol de los quemados” (2008), “La extraña dama inglesa: novela de mistério” (2009), “El pinar de Segismundo” (2013), “El héroe del brazo inerte” (2013), “El enigma de la foto partida” (2013) e “Las antiguas mañanas” (2015). Para o teatro, Cárdenas escreveu “Morir en Vilcabamba” (1998). Como crônicas, deixou “Guerra y paz en Paquisha” (1981).Como contos: “Hoy, al general” (1971),”La incompleta hermosura : relatos” (1996), “El ejercicio y otros cuentos” (2004), “Relatos del día libre” (2004). Como artigos: “Háblanos, Bolívar (1983). 

Em 1991, Eliécer Cárdenas foi eleito presidente da seção Azuay da Casa da Cultura Equatoriana e ganhou o terceiro prêmio no Concurso Nacional de Novelas da Bienal com seu romance “Que te perdone el viento” (Que o vento te perdoe). Trechos de “Polvo y ceniza”? De acordo com especialistas, o fragmento a seguir é uma fotografia da ruralidade andina em que se misturam componentes de uma descrição telúrica elevada a um tom narrativo-poético, ao mesmo tempo que sentimos uma emoção sinistra na percepção do onisciente do Eu narrativo: “os retângulos amarelados da ervilha madura, os prados que estendem seu verde opaco até lamber os alicerces da casa muito branca e seus corredores de tijolos, seus pilares de madeira, suas portas de mogno pintadas […] Quando sua fama se esvai Ela se espalha, como um incêndio na grama no verão, e bastava ouvir seu nome para que simples viajantes se enchessem de medo”. Por outro lado, ainda segundo especialistas, encontramos a esfarrapada e velha elucubração da dor indígena diante do lamentável chicote do proprietário rural imune à sua dor. Um dos personagens, o condutor de mulas, falando submissamente com o Bispo, diz-lhe: “E mês passado, meu filho mais velho, Naún, começou a roubar: meio saco de farinha, duas galinhas […]. O menino está no caminho errado, Excelência. Diz que não é justo ver os grãos dos latifundiários apodrecerem nos celeiros enquanto a fome nos adoece, que os cães de Don Julio Eguiguren comem carne quando esquecemos o seu sabor”.  

Segundo estudiosos, a espreita da morte não impede o comportamento desafiador de Naún contra o estatuto do poder, razão pela qual o personagem oferece a sua vida e a sua luta com base na necessidade de mudança que cresce com o passar do tempo. Enfrentar a morte sabendo que vai morrer o torna um ser especial, uma figura autêntica transformada em lenda, um agente de valor mítico e necessário no contexto da época. 

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