Rosemary Conceição dos Santos*
Juan María Montalvo Fiallos (1832-1889), ensaísta e romancista equatoriano, foi uma personalidade literária de ensaios marcados pelos anticlericalismo e pela oposição aos ditadores Gabriel García Moreno e Ignacio de Veintemilla, aos quais muito criticou. De infância humilde, presenciou seu irmão ser preso, encarcerado e exilado por enfrentar politicamente a ditadura de Juan José Flores, o que muito o marcou. O mesmo irmão que, em 1845, ao retornar do exílio no Peru, o levou consigo para Quito para continuar seus estudos. Tendo tomado gosto pela literatura e pelas letras por influência de seus demais irmãos, que muito se esforçaram para criar um ambiente favorável a sua instrução, Juan Montalvo iniciou o aprendizado de gramática latina, seguindo para a filosofia e, em seguida, ingressando na Universidade de Quito para estudar Direito, uma vez que as demais profissões da época, medicina e teologia, não o agradavam.
Em Quito, tornando-se amigo de poetas e políticos liberais, com os quais se reunia com frequência, passou a ler e a discutir a literatura de grandes autores românticos europeus, dos quais procurava as visões de mundo com as quais cotejava a sua. Em 1853, mudanças no setor educacional de seu país privaram-no de seu cargo de secretário escolar, o que desencadeou o abandono da carreira de Direito e o enviou de volta para seu lugar de origem. De acordo com estudiosos do autor, em sua casa o autor veio a vivenciar uma atmosfera sombria e melancólica desencadeada pelo falecimento de seus pais e de seus irmãos mais velhos, que muito o ampararam na juventude. Autodidata, Montalvo dedicou-se sozinho aos estudos, fazendo muitas anotações e enveredando-se pela gramática espanhola e por tratados de caráter linguístico. Quatros anos depois, em 1857, durante o governo de Francisco Robles, Montalvo foi nomeado civil com base na embaixada equatoriana em Roma. Meses depois, vindo a França, Montalvo permaneceu em Paris por seis meses, ali vindo a conhecer Don Pedro Moncayo, diplomata equatoriano, que lhe deu instalações para estímulo intelectual e convívio com celebridades francesas, como Lamartine e Proudhon.
Ainda segundo estudiosos, em 1858, em correspondência com seu irmão Francisco Javier, Montalvo envio textos para serem destinados à publicação em um periódico de Quito, chamado La democracia. Entretanto, estes escritos, que influenciaram uma parte importante da criação de sua futura revista, a Cosmopolitan, não foram bem-vindos no Equador, sua terra natal. Tal fato levou Montalvo a depressão, tornando-se melancólico por não estarem compreendendo sua visão de mundo. Foram palavras do autor, no El Cosmopolita: “La nostalgia consiste en un amor indecible por la patria y un profundo disgusto del país en que se está…, es un deseo de llorar a gritos al mismo tiempo que eso es imposible.”
Em Paris veio a falecer acometido de pleurisia, tendo o corpo embalsamado e exposto em um mausoléu em Ambato. Dentre seus livros, um dos mais conhecidos é “Las Catilinarias”, publicado em 1880. O título é tirado de Cícero e seu famoso discurso contra Catilina (“Até quando, Catilina, você vai abusar da nossa paciência?”), comparando esta à política equatoriana. Nos doze ensaios que compõem a obra, Montalvo faz uma crítica implacável a quem no poder, elaborando uma descrição da sociedade equatoriana de sua época sem poupar críticas a outros políticos ou setores do clero. Encontramos também inúmeras referências à sociedade europeia da época, que Montalvo conhecia muito bem por ter vivido vários anos em Espanha e França. Citações a obras literárias e episódios mitológicos também são frequentes para completar o discurso crítico. Nascido da confluência do infinito de autores, o pensamento de Juan María Montalvo apontava para o reconhecimento da liberdade do indivíduo e o respeito necessário a esse estado, além do desprezo por tudo o que restringiria as liberdades legitimamente adquiridas. É considerado um dos escritores mais frutíferos que o Equador teve no século XIX.
De sua autoria: O cosmopolita (1866-1869), O precursor do cosmopolita (1867), Masonismo Negro (1868), Dance sobre as ruínas (1868), O bárbaro da América nos povos civilizados da Europa, Diário de um louco, O livro das paixões, A ditadura perpétua (1874), O último dos tiranos (1876), Das virtudes e vícios, O regenerador (1876-1878), As catilinarias (1880-1882), Sete tratados (1882-1883) e Capítulos que Cervantes esqueceu (1895).
Professora Universitária*