Tribuna Ribeirão
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O deus dinheiro! (parte IV) 

Cleison Scott * 
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Em seu ensaio ‘Desenvolvimento sem Trabalho’ Domenico de Masi avisa que elaborou a análise da atual falta de trabalho desde uma perspectiva histórica da questão. Creio que na nona tese é onde se encontra o maior desencorajamento para a aplicação prática de suas sugestões: 
 
A eventualidade de suprir a humanidade de bens e serviços de que ela precisa, com o uso mínimo de trabalho humano, implica a necessidade de se projetarem novas formas ‘políticas’ de alocar as tarefas e de distribuir as riquezas”. 
 
Isso exigiria uma mudança radical na forma do poder econômico se relacionar com o mundo que ele domina. Se as tais sociedades secretas existissem realmente, talvez isso fosse mais fácil de se conseguir através do convencimento de seu comando central, de que, em longo prazo, iriam ganhar muito mais que agora. Como não existem exige uma conscientização, num âmbito mais amplo, difícil de ser alcançado. A postura humana de querer o máximo no menor tempo possível é o maior entrave para a aplicação prática de soluções altruísticas, as quais, podem até realocar recursos momentaneamente, mas, NUNCA causar reais prejuízos efetivos a quem quer que seja. 
 
Com sua contumaz visão otimista Keynes acreditava no ser humano, e, por saber que no fundo o homem não trabalha por dinheiro, afirmou: 
 
Tenho certeza de que, com um pouco mais de experiência, nós nos serviremos do nosso generoso dom da natureza de forma completamente diferente dos ricos de hoje que[sem levar nada e ninguém em consideração só lutam para acumular] e traçaremos para nós um plano de vida totalmente diverso, que não tem nada a ver com o deles. Ainda por muitas gerações, o instinto do velho Adão continuará tão forte dentro de nós que precisaremos de ‘algum’ trabalho para ficarmos satisfeitos.Faremos, para servir a nós mesmos, mais coisas do que costumam fazer os ricos de hoje e ficaremos mais do que contentes em ter obrigações, deveres e rotinas a cumprir. Mas, além disso, teremos de nos empenhar com cuidado para compartilhar desse ‘pão’ a fim de que o pouco trabalho que ainda resta seja distribuído entre o maior número de pessoas”. 
 
Durante a crise de 1929 George Orwell decidiu ver com os próprios olhos e sentir na própria pele as agruras pelas quais passavam os milhares de desempregados que perambulavam pela Inglaterra em busca de emprego, comida e abrigo. Sobre suas andanças, aventuras e desventuras escreveu ensaios, os quais, foram organizados por Matinas Suzuki Jr e colocados em um livro pela Companhia das Letras. No ensaio ‘O Albergue’, escrito em 1931, Orwell se refere ao instinto do velho Adão assim: “Passei a pensar que o tédio é o pior de todos os males de um vagabundo [de fato de qualquer ser humano], pior que a fome e o desconforto, pior ainda do que o sentimento de ser socialmente desfavorecido”. 
 
Keynes em sua perspectiva de 1930 dizia que, turnos de três horas de trabalho por dia e quinze horas semanais deveriam ser suficientes para manter o velho Adão apaziguado com o prolongamento das necessidades de trabalho humano. 
 
Embora confiante Keynes não perdia, por isso, o senso da realidade: 
 
“Assim, pela primeira vez desde sua criação, o homem estará diante de seu verdadeiro e constante problema: como empregar sua libertação das agruras econômicas mais prementes, como empregar o tempo livre que as ciências e os juros compostos lhe granjearam, para viver bem, de forma agradável e sábia? Os incansáveis criadores de riquezas poderão levar todos nós junto com eles para o seio da abundância econômica”. [ou para o inferno como acabaram fazendo] 
 
E aqui, neste ponto com uma simples frase, porém com enormes implicações, Keynes indica como este sonho maravilhoso seria factível: 
 
“Porém, somente poderão gozar da abundância, quando ela chegar, aqueles que souberem manter viva a arte da vida e levá-la à perfeição, sem se venderem em troca dos meios de vida”. 
 
Em 1930 ele não poderia prever a revolução tecnológica dos anos 50 com a invenção dos computadores, os quais trouxeram para as atividades administrativas as mesmas consequências que a automação industrial trouxe para a produção de bens. Esses fatores resultaram na dramática aceleração do desemprego e na velocidade de acumulação de riquezas através dos juros compostos, o que fez do mercado financeiro um cassino global. De outra parte, aumentou o alcance de domínio e controle de quem detém o poder tornando a sempre existente concentração de renda, um fator corriqueiro em nossas vidas e que aumenta geometricamente. (continua) 
 
* Administrador de empresas com especialização em Marketing 

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