Muitas pessoas já entenderam a complexidade da situação decorrente da pandemia de coronavírus e estão aderindo às recomendações feitas pelas autoridades. No entanto, assim como ocorreu na Itália, outra parcela parece ignorar a gravidade e simplesmente continua levando a vida como se esse vírus altamente (e facilmente) transmissível fizesse parte de um filme de ficção científica.
Esse grupo adota atitudes egoístas, visando seus próprios interesses e caprichos. Só que já aprendemos pelos piores exemplos que isso terá um custo e a conta será entregue. O problema é que ela não chega apenas a quem de direito, mas é dividida com muitos, inclusive aqueles que obedientemente acataram às recomendações.
Um exemplo são os pacientes que aguardam na fila por um transplante de órgãos. Segundo o Prof. Dr. Ajith Kumar Sankarankutty, que é o atual Coordenador do Programa de Transplantes do HCFMRP-USP, os procedimentos só serão feitos em casos extremos e, mesmo assim, discutindo-se os riscos e benefícios com o paciente e sua família. “Precisamos considerar que agora todos os esforços das esquipes dos hospitais, leitos no centro de terapia intensiva (CTI) e bolsas de sangue devem ser priorizados no combate à epidemia”.
Além do transplante em si, a captação de órgãos doados também foi prejudicada. Dr. Sankarankutty explica que na atual conjuntura tem que se levar em consideração que o doador pode ter tido contato com alguém portador do coronavírus e até mesmo estar contaminado. “Em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte em que já está acontecendo a transmissão comunitária esse panorama fica ainda mais complicado”, relata.
O deslocamento aéreo dos órgãos em voos comerciais foi restrito, pois expõe as equipes ao permanecerem em ambiente confinado com 100 a 150 passageiros durante horas. O coordenador conta que em Ribeirão Preto os transplantes de pâncreas e rim estão temporariamente suspensos e os pacientes sendo manejados com insulinoterapia e hemodiálise, respectivamente. No caso do fígado, onde não há outros recursos, estão avaliando a gravidade caso e caso e analisando se vale o risco.
Se você não conhece alguém que precisa de um órgão, certamente sabe de uma pessoa que tem câncer. Elas também fazem parte do grupo dos imunodeprimidos, indivíduos que em razão de alguma doença de base possuem o sistema imunológico comprometido. No dia 15 de março, um importante periódico médico (Journal of the National Comprehensive Cancer Network) publicou um artigo sobre os cuidados com o paciente oncológico com o covid-19.
Saiba que, se contaminado, ele terá que interromper seu tratamento, como a quimioterapia. Para muitos, isso custará a vida, já que em grande parte das vezes o câncer não pode esperar. Dados de um estudo chinês conduzido em Wuhan, epicentro da doença, mostraram que dentre 32 pacientes com câncer que contraíram o coronavírus e precisaram de ventilação mecânica, apenas um sobreviveu.
Entendeu a seriedade da situação e a necessidade iminente do isolamento social? O covid-19 é muito mais do que uma “gripezinha”. Ele pode ter consequências catastróficas em termos populacionais e estruturais, pela quantidade de pessoas que pode atingir versus o potencial real do sistema de saúde para absorver esta demanda. O coronavírus também pode afetar outra parcela indiretamente, como o reflexo da impossibilidade de transplantar um órgão ou seguir com um tratamento antineoplásico.
Portanto, não se deixe levar pelas informações inventadas, sem fundamento e mesmo pelo pânico coletivo. Procure se atualizar por meio de fontes oficiais e não duvide das intenções por trás das medidas propostas pelas autoridades sanitárias. Agora não é hora para teoria da conspiração! Se, felizmente, você ou seus parentes próximos não integram o grupo de risco, olhe ao seu redor e encontrará amigos e conhecidos queridos cujas vidas certamente agora dependem da sua conscientização e responsabilidade. De uma forma ou de outra, fisicamente ou emocionalmente, o coronavírus vai afetar você.