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O clube dos nonagenários

O operoso Zequinha Vianna, em interessante grupo que mantém no Facebook, Lembranças Ribeirãopretanas, publicou anúncio de 1918 do dentista Antônio Rodrigues da Silva, que mostra as suas competências profissionais e os serviços que oferecia à população. Fui seu paciente nos anos 1950/1960. Tinha horror a ir ao dentista, talvez impressionado pelas estórias que minha avó materna contava, do suplício que tinha sido, quando jovem, ser tratada num tempo precário, em que o motor era movido a pedal e os instrumentos pri­mitivos. Ressaltava que um dos seus tios teve que abrir tanto a boca, que caiu o queixo, numa consulta.

Seo Tonico, como o chamávamos, me atendia com serenida­de, tentava aplacar meus medos e com sua voz suave e caridosa, ia me tratando. Nascido em Bonfim Paulista – naquele tempo Vila Bonfim – povoado distante da cidade, quando criança, brincava nas ruas poeirentas com minha avó Luiza TonzarChúfalo, pois os pais eram vizinhos. Estudou odontologia em Juiz de Fora e retornou imediatamente para nossa cidade. Em 1924, foi um dos fundadores do primeiro instituto de ensino superior de nossa cidade, a Escola de Pharmacia e Odontologia de Ribeirão Preto, hoje incorporada à USP local. Durante mais de 50 anos, foi o Provedor da Santa Casa, onde, junto com o Tesoureiro Manoel Penna, meu avô, foram os esteios daquela instituição.

Manoel Penna, original de Areias, no Vale do Paraíba paulista, era órfão de ambos os pais, passou muita dificuldade e em 1911 veio tentar o eldorado na pujante capital do café. Trazia no bolso dinhei­ro suficiente para pagar alojamento e se alimentar durante 30 dias. Alugou um quarto na Pensão Sampaio e foi admitido no Antigo Banco Construtor, de Antônio Diederichsen, onde fez rápida carrei­ra profissional, chegando a ser sócio do antigo chefe e seu sucessor. Ambos sempre se preocuparam em suprir as necessidades dos mais carentes, ajudando várias entidades locais. Dentro deste escopo, uma das atividades mais gratificantes a Manoel Penna era seu trabalho na Santa Casa. Diariamente até completar 80 anos, ficava religiosamen­te das 10 às 12 horas na Tesouraria do hospital.

Na Pensão Sampaio, Manoel Penna travou amizade com os filhos dos proprietários, notadamente Palmo, que trabalhou a vida toda na empresa, e Ângelo. Este tinha uma tabacaria nas lojas do hoje Centro Cultural Palace e por muitos anos foi uma das poucas for­necedoras de fumo e tabaco da cidade, uma verdadeira instituição na cidade que crescia. Gostava de cultivar orquídeas. Foi ele quem, através de meu pai João Palma Guião me incentivou a abraçar este hobby, que mantenho até hoje. Ângelo Sampaio também, ajudava a tocar o Asilo Padre Euclides, conjuntamente com Alfredo Porto e, depois da morte deste, tornou-se responsável pela instituição.

Nas lidas com a Santa Casa e o Asilo, o trio se relacionava com o Dr. Luís Felipe Tinoco Cabral, médico naquele hospital. Formado em São Paulo, o dr. Tinoco Cabral havia morado naquela cidade, no Consulado de Ribeirão Preto, pensão localizada na rua Major Sertó­rio e que atraía os ribeirão-pretanos que precisavam se mudar para a capital para estudar. O “cônsul” era meu pai João Palma Guião, que se tornou grande amigo de Tinoco Cabral. Depois de formado, Dr. Tinoco Cabral passou um tempo nos Estados Unidos, se aperfei­çoando, atitude pioneira na época. Da grande amizade entre eles nasceu o Clube dos Nonagenários, assunto para a próxima quinta.

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