Luis Sepúlveda (1949-2020) foi um escritor chileno de pai militante do Partido Comunista e mãe enfermeira, de origens mapuche. Segundo estudiosos, Sepúlveda iniciou-se na escrita literária por influência de uma professora de História. Aos 15 anos, seguindo o exemplo do pai, ingressou na Juventude Comunista do Chile, ali permanecendo até 1968 quando, então, militou no Exército de Libertação Nacional do Partido Socialista. Findos os estudos secundários, o autor ingressou na Escola de Teatro da Universidade do Chile, da qual chegou a ser diretor. Anos mais tarde, licenciado em Ciências da Comunicação pela Universidade de Heidelberg, na Alemanha, retomou a escrita literária, de cuja vasta obra, toda ela traduzida em Portugal, conquistando a admiração de milhões de leitores no mundo, destacam-se os romances “O velho que lia romances de amor” e “História de uma Gaivota e do Gato que a Ensinou a Voar”.
Segundo estudiosos, “O velho que lia romances de amor” traz em suas páginas uma história de amor pela Natureza e pela leitura e de repulsa à exploração desregrada de recursos e ao menosprezo humano pelos bens mais preciosos do nosso planeta: as florestas e a sua biodiversidade. “Sua narração inicia-se com mais uma visita do dentista Rubicundo Loachamín a El Idilio, uma pequena povoação no seio da Amazônia. Somos apresentados ao Velho, a que se refere o título, quando o dentista o encontra no cais para lhe entregar mais alguns romances de amor, de que Antonio Jose Bolívar Proaño (o Velho) tanto gostava. A conversa entre os dois é interrompida pela chegada do administrador de El Idilio, também conhecido por “A Babosa” (devido ao facto de suar abundante e continuamente) e pela notícia da morte de um “gringo”, que tinha matado cinco crias de onça. É sob a ameaça dos ataques vingativos da onça fêmea que se desenrola a ação do livro, intrinsecamente ligado ao poder da astúcia animal e à força da Natureza, que o Homem se esforça por subjugar. Numa analepse, conhecemos a história de Antonio, o seu casamento com Dolores Encarnación del Santísimo Sacramento Estupiñán Otavalo, a dificuldade em conceber um filho, a vinda para a floresta e a morte de Dolores, vítima das febres da malária. Depois de enviuvar, Antonio Proaño adota o modo de vida dos shuar, “era como se fosse um deles, mas não era um deles”. Graças aos ensinamentos dos shuar, o Velho conhece a floresta como a palma da sua mão, todos os seus ruídos, perigos e os comportamentos dos animais, e é por isso um dos escolhidos para colaborar na caça à onça enfurecida. Um livro tocante, emocionante e profundamente verde, que nos insere nas entranhas da Amazônia”.
No prefácio de “O velho…”, ainda segundo estudiosos, o autor narra a sua experiência na selva Amazônica, na qual se inspirou para este romance. A linguagem simples, o estilo atual, as palavras certas, as ideias-base e a sua expressão são cativantes e aconchegam o leitor. A situação que dá início à história é inesperada, a ação tem picos de adrenalina intercalados com uma calma tropical, as descrições são realistas e permitem-nos visualizar o que é narrado como se se tratasse de um filme. O conhecimento que o autor revela em relação às tribos da Amazónia, e aos seus recantos, é impressionante, sendo esse saber transmitido através de todas as letrinhas, que sintetizam o coração da floresta Amazônica e dos que lá habitam (quer humanos, quer animais). Por último, mas de modo nenhum menos importante, é um livro com uma forte mensagem ambiental, alertando-nos para a avassaladora desflorestação e destruição de habitats que o Homem tem levado a cabo a um ritmo terrível, deixando sequelas na vida de tantos seres. Com frases curtas e poderosas, que fazem arder no peito a revolta, Sepúlveda capta a urgência do combate à sobre-exploração de recursos e à redução desmesurada da biodiversidade.
Em “História de uma Gaivota e do Gato que a Ensinou a Voar”, uma formosa gaivota, apanhada por uma maré negra de petróleo, deixa ao cuidado de um gato, momentos antes de morrer, o ovo que acabara de pôr. Zorbas, que é um gato de palavra, cumprirá as três promessas que nesse momento dramático lhe é obrigado a fazer: não comerá o ovo, criará a pequena gaivota que nasceria daquele ovo e, mais tarde, a ensinará a voar. O que nos ensina esta história? Vários e importantes valores para o desenvolvimento das crianças e dos jovens: Com esforço e dedicação tudo se consegue (O gato Zorbas nunca desiste de tentar pôr a gaivota Ditosa a voar); respeito pelo meio-ambiente (É uma maré negra que causa a morte da gaivota Kengah); o amor e a amizade são fundamentais para a vida (O amor, carinho e proteção de Zorba para com Ditosa tornam a sua missão um sucesso); ser contra a xenofobia e racismo: todos diferentes, mas todos iguais (Um gato cria e educa uma gaivota: uma dupla inicialmente impossível, mas que funciona maravilhosamente), lealdade, confiança e cumprimento de nossas promessas (Zorbas mantêm-se fiel à promessa feita a Kengah), e a união faz a força (a cooperação e a ajuda dos amigos de Zorbas tornam a sua responsabilidade de criar Ditosa bem mais fácil e um sucesso).
Em 2016, Luís Sepúlveda recebeu o Prémio Eduardo Lourenço – que visa galardoar personalidades ou instituições com intervenção relevante no âmbito da cooperação e da cultura ibérica. Para além de romancista, o autor também foi realizador, roteirista, jornalista e ativista político. Em 1970 venceu o Prêmio Casa das Américas pelo seu primeiro livro, “Crônicas de Pedro Nadie”, e também uma bolsa de estudo de cinco anos na Universidade Lomonosov de Moscovo. No entanto, só ficaria cinco meses na capital soviética, uma vez que foi expulso da universidade por “atentado à moral proletária”. Membro ativo da Unidade Popular chilena nos anos 70, Sepúlveda teve de abandonar o país após o golpe militar de Augusto Pinochet. Viajando e trabalhando no Brasil, Uruguai, Bolívia, Paraguai e Peru, o autor viveu no Equador, entre os índios Shuar, participando numa missão de estudo da UNESCO. Em 1979, alistou-se nas fileiras sandinistas, na Brigada Internacional Simon Bolívar, que lutava contra a ditadura de Anastácio Somoza, na Nicarágua. Depois da vitória da revolução sandinista, Sepúlveda trabalhou como repórter. Em 1982, rumou a Hamburgo, movido pela sua paixão pela literatura alemã. Nos 14 anos em que lá viveu, alinhou-se ao movimento ecologista e, enquanto correspondente da Greenpeace, atravessou os mares do mundo entre 1983 e 1988. Em 1997, instalando-se em Gijón, na Espanha, na companhia da mulher, a poetisa Carmen Yáñez, ali fundou e dirigiu o Salão do Livro Ibero-americano, destinado a promover o encontro de escritores, editores e livreiros latino-americanos com os seus homólogos europeus. Luís Sepúlveda vendeu mais de 18 milhões de exemplares em todo o mundo e as suas obras estão traduzidas em mais de 60 idiomas.