Esta semana Ribeirão Preto se despediu do jornalista José Mário Sousa. Com uma carreira destacada na imprensa da cidade, Zé Mário, como era chamado carinhosamente pelos amigos, faleceu na noite de segunda-feira (27), aos 69 anos de idade.
Ele ficou internado cerca de 10 dias no Hospital Ribeirânia, onde se submeteu a uma cirurgia para retirada de uma hérnia. Porém, seu quadro pós-operatório piorou e ele ficou internado cerca de oito dias na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI). No domingo chegou a ter uma melhora, mas após um agravamento do seu estado de saúde, veio a óbito.
O velório do jornalista foi realizado na Câmara de Vereadores de Ribeirão Preto.
Professor de fotografia e técnicas em redação em diversas faculdades, Zé Mário nasceu em Passos, Minas Gerais, mas mudou-se ainda jovem para Ribeirão Preto.
Dono de um jeito tranquilo e extremamente calmo ele iniciou sua carreira jornalística em 1970 como repórter fotográfico da Assessoria de Imprensa da Prefeitura de Ribeirão Preto, na época a cidade era governada pelo, então prefeito Duarte Nogueira, pai do atual prefeito Duarte Nogueira Júnior.
Nesta época atuou como repórter fotográfico nos jornais Diário de Notícias, Semanário Domingão, A Cidade e no Jornal de Sertãozinho. Já nos anos 1980 foi diretor do então Jornal de Ribeirão e do Jornal da Agropecuária, ambos pertencentes ao grupo Unaerp.
Neste período também foi coordenador do Projeto Rondon em Ribeirão Preto, uma parceria do Governo Federal realizada com os Governos Estadual e Municipal que, em parceria com as Instituições de Ensino Superior, tinha como objetivo somar esforços com as lideranças comunitárias e com a população, para a promoção da cidadania.
No final da década de 1990 fundou o semanário Enfim que se tornou referência na cidade por seu pioneirismo. Por sua redação passaram jornalistas como José Fernando Chiavenato, Carmem Cagno, Matilde Leone, Silvia Pereira, Helba Diniz, o já falecido Carlos Severino, o cartunista Pelicano e o repórter fotográfico Júlio Sian, entre outros.
Na época de faculdade, Zé Mário chegou a enveredar pelo teatro como autor da peça “Fala Zé”, encenada entre os anos de 1976 e 1977. O espetáculo que tinha como protagonistas os então colegas de universidade, Helen Albertin e Ivan Caires, foi premiado em um Festival Universitário realizado em Ribeirão Preto. Narrava a realidade de um casal operário diante da situação econômica e social do país em pleno Regime Militar. Também foram companheiros de faculdade dele, entre outros, Vera Moquenco, ex-diretora do jornal A Cidade e o jornalista Adilson de Freitas.
Um fato curioso protagonizado por Zé Mário e seus amigos de faculdade diz respeito ao livro Zero do escritor Ignácio de Loyola Brandão publicado originalmente em 1974, na Itália, após ter sido recusado por várias editoras brasileiras. Sua primeira edição nacional veio apenas um ano depois, mas em 1976 foi proibido em todo o país pelo Ministério da Justiça, por ser considerado atentatório à moral e aos bons costumes. Tem como um dos temas principais a repressão e o desejo de liberdade.
Sem poder comprar o livro proibido, os alunos fizeram cópias por xerox do livro e fizeram rodizio de três dias por aluno, para que todos pudessem lê-lo. A admiração pelo escritor foi tanta que a convite dos alunos Loyola acabou sendo o paraninfo da formatura deles em 1979.
O que dizer do Zé?
O Zé Mário era aquele cara tranquilo, amigo e muito determinado com o seu Jornal Enfim. Acreditava no bom jornalismo impresso e lutou muito pra manter o semanário vivo. Muitas vezes discutimos sobre a grande dificuldade de manter um veículo de comunicação na cidade.
Quem o conhecia de perto sabe que muitas vezes ele usou a gráfica que tinha para poder manter o jornal e, quando faltava anunciante, ele bancava. O Zé Mário foi também meu professor de fotografia. Ele ensinou uma boa parte dos profissionais que saíram do curso de jornalismo e publicidade da Unaerp. Foi um lutador incansável para a manutenção do seu sonho. Um exemplo de um jornalista que amava o seu ofício.
Perdi um grande amigo!
Zé Mário era um otimista ‘incorrigível’, sempre alegre e de um humor fino, próprio das pessoas inteligentes e experientes. Fazia uma espécie de sátira, frente às dificuldades que a comunicação nos impõe no dia-a-dia, com um bordão: “estamos sobrevivendo, apesar da crise”.
Vivemos do mercado, das assinaturas e da publicidade em nossos jornais, mas temos que respeitar a ética, denunciar, lutar contra interesses econômicos, ‘enfim’, exercer a profissão no fio da navalha. Todos os dias. Que possamos, um dia, como ele, descansar em paz, tão querido por todos!
A humildade faz grandes homens
Conheci o Zé Mario quando comecei minha jornada no fotojornalismo no início dos anos 2000, na redação do jornal Tribuna. Entre uma edição e outra ficava feliz em atender um pedido de fotografia do Zé Mario para ilustrar a capa do jornal Enfim ou alguma matéria de Antônio Carlos Nonino, jornalista daquele veículo. Em algumas ocasiões ia pessoalmente levar o pen drive com as imagens para poder prosear e aprender um pouco mais com o generoso professor. Ao longo de minha carreira conheci muitos outros jornalistas que, com certeza, como eu, se lembram do nome, do bom homem e do professor Zé Mario com carinho, respeito e admiração.