Por Guilherme Sobota
O escritor gaúcho Michel Laub aproveitou os primeiros meses da quarentena imposta pelo coronavírus para acertar os detalhes finais do seu novo romance, Solução de Dois Estados, agora disponível nas livrarias. Como o presente da trama se passa em 2018, a doença ainda não aparece, mas o livro se soma a produções recentes da literatura brasileira contemporânea que começam a explorar as transformações sociais e políticas resultantes na eleição daquele ano.
Sempre preocupado com a linguagem dos seus escritos, o autor conta aqui a história de dois irmãos, Raquel e Alexandre, criados em São Paulo sob o mesmo teto, mas cujas trajetórias e escolhas na vida se afastam quase que diametralmente. Raquel, vítima de bullying desde pequena por causa do seu corpo, tem tendências artísticas e vai buscar na vida no exterior ferramentas para lidar com os traumas do passado; Alexandre fica com a mãe, e passa a ditar a própria vida sob a égide da meritocracia, reproduzindo o liberalismo à brasileira.
No ano da eleição, Raquel, convidada em um evento patrocinado por um banco, sofre uma agressão física no palco do debate, e as incertezas que rondam o incidente funcionam como fio condutor do livro.
“O processo todo demorou mais do que eu esperava, então o que era uma história futurista (eu não tinha ideia de que o Bolsonaro iria ganhar a eleição, por exemplo) acabou virando uma espécie de romance histórico recente (que se passa num mundo pré-quarentena)”, explica Laub sobre seu oitavo romance, publicado também pela Companhia das Letras. “Mas as questões trazidas pelos personagens independem desses marcos. Eu queria escrever sobre perdão, perguntar se é possível conciliar visões de mundo tão opostas em temas como sexo, religião, identidade, responsabilidade individual. São essas visões que dividem de fato a sociedade brasileira, isso vai além do noticiário do momento.”
Solução de Dois Estados é narrado em primeira pessoa pelos personagens, que falam para uma documentarista alemã sobre o incidente – alinhavando assim uma costura das preocupações nacionais com o contexto internacional, outra exploração interessante do romance.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.