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Noel, o filho de Vila Isabel

Dentre as vezes que fui ao Rio de Janeiro, por gostar tanto da Cidade Maravilhosa de outrora, queria conhecer tudo que já tinha lido a respeito de seus lugares históricos, principal­mente sobre a área que transito: música e cultura.

Vou falar de Vila Isabel, imortalizada nas canções de Noel Rosa – ele a chamava de “Cidade Independente”, e quem mora ali naquele pedaço não tem medo de bamba. Dizem até que São Paulo dá café, Minas Gerais dá leite, mas a Vila Isabel dá samba.

Ainda não tive a oportunidade de conhecer Vila Isabel, mas sei que ali tem uma calçada com a letra de uma das músicas de Noel Rosa. Tem também uma mesa com a escul­tura dele, sentado em uma cadeira, cigarro na mão e – não poderia faltar na cena – uma garrafa sobre a mesa. Tudo ali retrata sua vida boêmia. Quero ter o prazer de nela sentar e cantar pra Noel “Feitio de oração”.

Noel Rosa (11/12/1910-04/05/1937) viveu 26 anos, mas a intensidade com que viveu me dá a impressão de que ele tinha realmente que produzir tudo que o fez em um tempo muito curto. Sua obra é de tirar o chapéu. Nos bancos esco­lares, já tinha a manha de fazer paródias trocando a letra de músicas conhecidas, sempre fazendo letras sátiras com versos de rimas perfeitas.

Assim seguiu sua vida, tornando-se um compositor de primeira. A música o levou a conhecer o maestro Hervé Cordovil, nascido em 1914 e que nos deixou em 1979. Ele viria a fazer arranjos em parte da obra de Noel Rosa. Hervé é compositor de coisas belíssimas e que são cantadas até hoje, como “Pé de manacá”, “Sabiá lá na gaiola”, “Cabeça inchada”…

Tem até uma parceria com Adoniran Barbosa no samba “Prova de carinho”, em que conta que da corda mi do cava­quinho fez uma aliança pra amada. Mas tem uma história sobre ele e Noel que acho genial, de quando o compositor terminou de fazer o samba “Com que roupa”.

Naquele tempo não existia gravador, e a música tinha que ser apresentada ao vivo pro arranjador. Noel procurou o maestro e mostrou a composição, Hervé, arregalou os olhos e disse ao amigo: “Noel, você está louco, homem?! Não faço arranjo nesta música de jeito nenhum”. “Por que?”, perguntou Noel. “Ora”, respondeu Hervé, “porque ela é plágio do Hino Nacional Brasileiro. Tô fora, meu amigo.”

Noel estudou bem a canção, criou alguns desvios na melodia e nasceu “Com que roupa”. A vida boêmia de Noel Rosa lhe deu de presente uma doença que na época, se não bem tratada, levava o paciente para o subsolo como o levou, a famigerada tuberculose. Na época o doente era orientado a se cuidar em lugares altos e ele foi com sua esposa Lindaura pra Belo Horizonte, onde deveria ficar por uns seis meses.

Deixou no Rio sua amante Cecy, uma prostituta do cabaré que frequentava na Lapa. Noel era louco por ela, desejada pelos frequentadores daquela zona boemia. Noel Rosa, em Belo Horizonte, quebrou o tratamento, voltando a frequen­tar a noite na capital mineira até que descobriu de vez que a boemia era outro grande amor de sua vida.

Voltou pro Rio e teve enorme decepção. O tempo ausente fez com que sua amada Cecy batesse asas para o lado do can­tor e compositor Mário Lago, que era um dos que a deseja­vam. Mario desfilava com Cecy causando inveja a uma penca de boêmios. Noel mergulhou de vez na desregrada vida, até que, muito doente, se recolheu, sendo cuidado por Lindaura e por sua mãe até sua partida, em 1937.

Vila Isabel, me aguarde, na minha próxima viagem ao Rio de Janeiro, quero pisar em seu chão.

Sexta conto mais.

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