Tribuna Ribeirão
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Noel na manjedoura 

Luiz Paulo Tupynambá 

Jornalista e Fotógrafo de Rua 

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No início da década de 30 do século XX os Estados Unidos enfrentavam uma recessão econômica. E não era uma recessão qualquer. Era A RECESSÃO, criada pela quebradeira geral provocada pelo “crash” da Bolsa de Nova Iorque, em 1929. Na época a Europa estava atolada em dívidas assumidas na Primeira Guerra Mundial e os países europeus mal conseguiam pagar os juros. 

Até 1929 os Estados Unidos pareciam ser os salvadores econômicos do planeta. Tinham uma economia vibrante, com as mais modernas indústrias, petróleo a rodo, alta produção agrícola e carne para empanturrar o mundo. Ouro, ferro e carvão pareciam brotar de qualquer buraco que se fizesse nas Montanhas Rochosas e outras. A mão-de-obra necessária para impulsionar a economia chegava aos vagalhões, vinda dos falidos estados europeus. Poloneses, italianos, irlandeses, alemães e outros cruzavam o Atlântico para estabelecer-se na “América”, onde qualquer indivíduo podia ficar rico, se trabalhasse duro para isso. Assim diziam os panfletos e anúncios de jornal publicados em diversas línguas na Europa. O trem econômico estadunidense puxava com força e rapidez a economia da Era Industrial e parecia imparável. 

Mas, no dia 24 de outubro de 1929, conhecido como a Quinta-feira Negra, o trem, sem aviso, descarrilou e caiu da ponte, arrastando tudo e todos para a maior recessão  econômica já vista. O sistema de financiamento do desenvolvimento baseado na captação de recursos via Bolsa de Valores e empréstimos bancários de curto prazo desmoronou por conta da especulação e das pirâmides financeiras criadas por aproveitadores. Milhares de empresas faliram muito rapidamente e milhões de trabalhadores perderam seu posto de trabalho entre o café da manhã e o almoço. A nação que vivera a década de 20 como uma grande festa passava agora por uma imensa ressaca, sem perspectiva de recuperação a curto prazo. 

Nesse ambiente árido, já na época uma empresa internacional, a The Coca-Cola Company viu-se num ponto de quase falência. A recessão causou uma queda abrupta em suas vendas. Mas como recuperar as vendas num ambiente avesso a qualquer “gasto supérfluo” como os refrigerantes? 

A década de 20 foi a década da afirmação do “marketing estratégico”, e a Coca tinha como presidente um gênio dos negócios e do marketing, Robert Woodruff. Adepto das novas ferramentas de marketing, ele sabia que se fariam mais vendas com apelos aos sentimentos das pessoas do que com o clássico “isto aqui é melhor e mais barato”. E o apelo aos sentimentos é muito forte em tempos de crise. A Coca-Cola enxergou isso e transformou uma campanha de Natal naquele que é o mais espetacular movimento de “marketing” da Era Industrial. 

Os objetivos eram: estancar a queda nas vendas, fazendo com que os operários e suas famílias, maioria de seus clientes, voltassem a comprar o refrigerante deixando de enxergá-lo como supérfluo. Em segundo lugar, ampliar as vendas no inverno, pois a bebida era vista como típica do verão (”a pausa que refresca”). Em terceiro lugar, gerar fidelidade de longo prazo, apresentando o produto como saudável e simpático para crianças e adolescentes. 

Como fazer isso? 

A maioria dos operários imigrantes conhecia São Nicolau, um santo católico do século IV, muito festejado até hoje em diversos países europeus. Bispo da Igreja Católica e considerado um taumaturgo (aquele que faz milagres) São Nicolau, além de milagreiro, era conhecido por sua generosidade, sempre ajudou materialmente a quem precisasse. No dia 3 de dezembro, data atribuída a seu nascimento, ocorrem as chamadas Festas Nicolinas em vários países europeus. Nelas as crianças bem comportadas ganham presentes supostamente deixados pelo santo em meias penduradas nos telhados e janelas de suas casas. São Nicolau, já conhecido pela maioria do público consumidor de Coca na década de 30, foi escolhido como protagonista da campanha de Natal da Coca-Cola para o inverno de 1931. Não a figura histórica, mas aquilo que ela representava: generosidade, compartilhamento, festa no mês de dezembro próxima ao Natal cristão e que falava diretamente às crianças que  adoravam a tradição dos presentes deixados nas meias pelo santo. 

Contratado pela Coca, o artista plástico Haddon Sundblom, orientado pelo departamento de marketing da Coca, criou a figura de Santa Claus. Um velhinho barbudo, rechonchudo e sorridente, sempre com sua roupa e gorro vermelho e uma garrafa de Coca-Cola na mão. Síntese de um marketing bem elaborado, a figura passa a ideia de que Coca-Cola é saudável, do Bem, traz tranquilidade, alívio e ganho material. E pode ser consumida nos meses frios de inverno. 

A primeira propaganda com a figura de Santa Claus foi veiculada na tradicional revista semanal “Saturday Evening Post” e o Papai Noel (como é chamado aqui) publicado ali é praticamente o mesmo até hoje. 

Se você perguntar a uma criança de qualquer classe econômica, o que mais a faz lembrar o Natal, será que ela vai responder “presépio com o Menino Jesus” ou “Papai Noel e os presentes”? Pois é. E você duvida que logo teremos um “baby Noel” deitado ali na manjedoura de palha no lugar do Menino Jesus? Eu não duvido. 

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