Luiz Paulo Tupynambá *
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“Quando a meia-noite, me encontrar / Junto a você / Algo diferente vou sentir / Vou precisar me esconder / Na sombra da Lua cheia / Esse medo de ser / Um vampiro, um lobisomem / Um saci-pererê” (Kleiton e Kledir)
Ela sempre foi, ao mesmo tempo, admirada e temida pelos humanos. Nas primeiras civilizações descobriu-se que seus ciclos de quatro etapas marcam os plantios e colheitas e que sua força gravitacional influencia os rios e as marés. Que a soma de doze ciclos lunares representa um ciclo anual dividido entre: Primavera, tempo de preparar o solo, separar as sementes e plantá-las. Verão, hora de cuidar da plantação, da colheita e armazenagem dos grãos; de festejar, acasalar e refazer laços sociais; caçar e pescar, salgar a carne, tratar das peles que serão roupas e cobertores; colher frutas e cogumelos, fazer compotas. Outono era o tempo de cuidar das roupas para o inverno que chegava, reparar os abrigos dos humanos e dos animais; tempo também de cuidar do espírito, de realizar ritos e peregrinações, pedindo aos deuses clemência e favorecimento. Inverno era o tempo de se recolher, refazer ferramentas e utensílios; tempo do temor, dos dias mais curtos com a escuridão estendendo seu manto protetor para as criaturas malévolas da noite.
Três ciclos lunares depois, todos sabiam e ansiavam por isso, os dias voltariam a ter mais horas claras, os pássaros voltariam a cantar, a neve derreteria sob o calor do carro voador de Apolo, trazendo assim a nova primavera e um novo ciclo da vida.
Sempre amada e temida pela Humanidade, os gregos a chamavam de Selene, sinônimo do termo “méne”, usado para designar um mês. Porém tinham o verbo “selêniazein” para designar pessoas “feridas pela lua, tornar-se lunático, convertendo-se desse modo em adivinho ou feiticeiro”. A crendice sempre a ligou a comportamentos humanos estranhos, como previsões, possessão e outras manifestações espirituais. Exemplo: a licantropia. Hoje reconhecida pela Psicologia como um tipo de psicose trans espécies, uma doença mental que afeta pessoas que apresentam alucinações e delírios em fases da Lua. Na licantropia ocorre a transformação do indivíduo em lobisomem.
Ao longo dos tempos, com seu desenvolvimento tecnológico, a Humanidade dominou a escuridão, clareando cada milímetro quadrado onde as criaturas da noite poderiam se esconder. Lobisomens, sacis, fadas e bruxas foram expulsos para as últimas nesgas não iluminadas do planeta. Hoje existem apenas em filmes “B” e séries açucaradas e sensualizadas com vampiras jovens de lábios carnudos e garotões bombados e peludos que correm atrás delas e de joviais vampiros de pele lisinha. É a sensualização puritana, tachando como pecado o desejo natural e carnal da espécie. Humano transformado em animal possuído e maléfico. Acenderam as luzes bem na hora do dropes de anis, Santa Rita Lee que nos proteja.
Crendices e manipulações à parte, parece que a Lua, em pouco tempo, se tornará o primeiro entroncamento espacial. Breve, por volta de cinco anos, teremos algumas colônias de prospecção mineral e pesquisa científica funcionando lá a pleno vapor. Estados Unidos e China devem ser os primeiros a ter suas instalações lunares operacionais.
Trabalhar em uma colônia ou base lunar será uma tarefa árdua e arriscada. São dezenas de obstáculos físicos, logísticos e operacionais. E o pior de todos é o acesso à água. Os estadunidenses dizem ter achado “indícios” de formações congeladas de água nos polos lunares. O problema está na quantidade de água, pois ela está misturada à poeira lunar. Seria extraída numa proporção de um litro de água para cada cinco toneladas de material lunar. Isso torna inviável essa fonte. Mas, como se sabe, numa corrida dessas ninguém mostra todas as suas cartas e o apressamento do programa Artemis mostra que os estadunidenses podem estar escondendo o jogo.
A mais recente descoberta de água foi feita pelos chineses em parceria com cientistas europeus. Encontraram pequenas quantidades de água dentro de grãos de vidro, de diferentes cores, que vieram para a Terra em amostras coletadas pela sonda chinesa Chang’e-5. Segundo a pesquisa, as pequenas esferas de vidro são formadas por colisões violentas de rochas espaciais com a superfície lunar. A quantidade de água armazenada nas esferas é estimada em 270 trilhões de quilos, segundo o estudo, que analisou 117 esferas coletadas na superfície da Lua, durante a missão lunar chinesa, em 2020.
A análise de diferentes tipos de átomos de hidrogênio nas amostras sugere que o bombardeio de partículas com carga que vem do sol, o chamado vento solar, e que contém átomos de hidrogênio com carga positiva, penetra nos vidros e se combina com o oxigênio presente neles. Quando a temperatura é suficientemente alta pela radiação solar, esses cristais também podem liberar parte de sua carga de H₂O. São esses cristais que promovem o ciclo de água na lua, segundo os pesquisadores chineses. Não te falei que na Lua tem bolinhas de gude cheias de água? Essa é apenas uma das surpresas que a Dindinha reserva para nós, humanos. Se a tratarmos bem, será o nosso trampolim para as estrelas.
Semana que vem vamos falar sobre os combustíveis do futuro.
* Jornalista e fotógrafo de rua