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Neuropsicometria Cognitiva (25): Covid-19 e a Disseminação da Pandemia

De acordo com a profunda análise feita por Taylor (2019), em The Psychology of Pandemics, as conexões humanas são os principais meios de disseminação de doenças pandêmicas. A gripe, por exemplo, é facil­mente disseminada pela inalação das gotículas de tosse e de espirros no ar, bem como, ao tocar boca, nariz e olhos após simples manipulações de fômites, objetos inanimados ou substâncias capazes de absorver, reter e transportar organismos contagiantes ou infecciosos. Exemplos são as superfícies contaminadas de espaços públicos, como portas, elevadores e microcomputadores, além de brinquedos, maçanetas, telefones, cédulas de dinheiro etc. A transmissão por gotículas suspensas no ar combinadas com altas densidades populacionais nas áreas urbanas, aliadas à disponibilidade de transportes rápidos, fazem com que a gripe, ou qualquer outra doença contagiosa similar, espalhe-se rapidamente para grandes e longínquas áreas.

Não obstante, algumas pessoas, de modo desproporcional, contribuem para o espalhamento da infecção. Essas pessoas são conhecidas como os superdisseminadores. Casos típicos, cerca de 20% das pessoas infecta­das, podem ser responsáveis por 80% das transmissões. Taylor afirma que um superdisseminador é provável de ser aquele que (1º) não é imunizado ou é imunocompromissado e, particularmente, susceptível à infecção; (2º) não se engaja nas atividades de higiene básica, como cobrir a própria tosse, e assim transmite a influenza; (3º) mantém contato com grande número de pessoas, embora alguma combinação de seus papéis sociais e ocupacionais (balconista, acensorista e outros de atividade social elevadamente ativa, além de pessoas que tenham contato regular com doentes, caracterizando-se como sensíveis à infecção, caso dos profissionais de saúde que lidam com pacientes mas se recusam a serem vacinados).

Ainda de acordo com Taylor, a superdisseminação é também modelada por outros fatores, incluindo a natureza da infecção e a imunidade de rebanho, referência aos benefícios da aplicação de vacinas recebidos por pessoas que não as tomaram. O efeito acontece de modo indireto. Indivíduos que recebem vacinas com vírus atenuados se transformam em vetores desses parasitas. Imunidade de rebanho, também reconhecida como imunidade comunitária, refere-se à proteção indireta da doença infecciosa que ocorre quando grande proporção da população torna-se imune à infecção, o que possibilita um grau de proteção para as pessoas que não são imunes. Fato, este, que impede a disseminação da infecção por quebrar a cadeia de contágio.

A superdisseminação é especialmente provável de ocorrer para doenças que têm períodos substanciais de incubação, isto é, períodos em que as pessoas infectadas são contagiosas porém assintomáticas, significando que a pessoa possa desconhecer o espalhamento das doenças para outros. Os períodos de incubação para a influenza podendo variar de pessoa para pessoa e podendo depender das cadeias de transmissão. Importante saber que um longo período de incubação significa que uma pessoa pode infectar muitas outras pessoas antes de tornar-se sintomática. Isto o que está, certamente, ocorrendo com a pandemia da covid-19 no mundo. Es­pecialmente no Brasil, onde grande parcela da população não mantém duas recomendações comportamentais fundamentais: isolamento e distanciamento social.
Obviamente, maneiras de reduzir a superdisseminação envolvem encorajar as pessoas a buscar a vacina­ção (ainda em estudo, no caso da covid-19) e a desempenhar ações de higiene básica, bem como, a encorajar as pessoas infectadas a permanecerem em casa e distantes de lugares públicos, incluindo hospitais, postos de saúde, pontos de ônibus, shoppings etc. Para este fim, as autoridades sanitárias devem advertir e orientar as pessoas a não visitarem hospitais e locais públicos se eles se percebem com sintomas associados à covid-19 ou qualquer outra doença infecciosa.

Neste contexto, também tem sido enfatizado que os programas de vacinação, quando existirem, visem especificamente os disseminadores, de modo a serem mais eficientes do que programas de vacinação coletiva dado indiscriminadamente. Isto se deve, por definição, ao fato de que os superdisseminadores, comparados à população geral, têm maior impacto na disseminação da infecção. Em termos de manejo pandêmico, se uma vacina se mostrar disponível e eficaz, pode ser útil encorajar a vacinação primeiramente para pessoas que trabalham em empregos que têm alto nível de contato com o público em geral ou contato frequente com as pessoas medicamente vulneráveis.

Em adição, a administração de vacinas às pessoas que têm muitas interações com outras pode envolver tanto programas de vacinação quanto campanhas educacionais que discutem especificamente o tópico dos su­perespalhadores nas escolas, nos ambientes de trabalho e em outros ambientes públicos. Quando uma vacina estiver disponível para a covid-19, muito provavelmente será necessário fornecer algum tipo de incentivo para as pessoas buscarem vacinação, pois muitos, por razões psicológicas, de personalidade, religiosas, alérgicas, místicas e outras, hesitam serem vacinados. Isto se configura, então, como o segundo capítulo do manejo eficiente da covid-19.

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