Tribuna Ribeirão
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Neurociência da vida cotidiana (6): Amor romântico 

José Aparecido Da Silva* 

Para estudiosos das teorias culturais do Amor três questões se sobressaem: 1ª) Qual é o papel da cultura no Amor?, 2ª) O Amor é universal?, e 3ª) O Amor manifesta-se de diferentes formas em diferentes culturas?. Embora o Amor Romântico possa parecer algo muito natural para todos nós, muitos estudiosos têm constatado que o mesmo parece uma invenção ocidental, não encontrada em outras culturas. Compartilham desta posição não só os psicólogos, estudiosos do comportamento que são, mas, também, antropólogos, sociólogos e historiadores que endossam a mesma concepção. Há estudos que sugerem que o Amor Romântico não existe em países não ocidentais, exceto, possivelmente, para a elite daquelas nações que tem tempo para cultivá-lo. Em posição contrária, os psicólogos evolutivos argumentam que o Amor Compassivo é inato na natureza humana, sendo baseado em processos biológicos universais, aplicando-se às pessoas e a todas as coisas. Apaixonar-se pode rápido ou lento, intenso ou sutil, e disparado por inúmeros fatores.  

Estudiosos  enumeram que alguns dos antecedentes do apaixonar-se são: gostar recíproco (O quanto duas pessoas se gostam?); aparência (O quanto alguém é atraído pelos atributos corporais de outra pessoa?); traços de personalidade (O quanto alguém é atraído pelos traços de outrem, como, por exemplo, pela inteligência, atenção, generosidade, humor, etc., de outra?); similaridade ( O quanto duas pessoas tem em comum, como, por exemplo, meio sócio-cultural, experiências, interesses e atitudes?), familiaridade (Quanto tempo duas pessoas ficam juntas?); influência social (Famílias de amigos, outras pessoas e redes sociais que aprovam/desaprovam um dado parceiro); preenchendo necessidade (Uma pessoa preenche as necessidades de outro e mostra carinhos e respeito por este? O parceiro faz a pessoa feliz? Acaba com o sentimento de solidão da outra pessoa? Manifesta alguma forma de apreciação do outro?); excitação (A pessoa vivencia fortes reações fisiológicas quando ela encontra um parceiro em potencial? Vivencia batimentos cardíacos acelerados ou respiração ofegante?); prontidão (O indivíduo está pronto para um novo relacionamento ou continua sofrendo com a perda de um relacionamento anterior?); isolamento (Duas pessoas sentem-se sozinhas quando juntas?); outros indícios (Há algo em uma pessoa que atraia outra em particular?). Assim, como é possível observar, diferentes variáveis podem influenciar se duas pessoas irão se apaixonar ou não. 

Ainda que os resultados de variados estudos mostrem que o Amor Romântico seja quase universal no mundo, nós não podemos categoricamente concluir que cada pessoa irá se apaixonar alguma vez na vida. Estudos também nos revelam que, embora o Amor Romântico possa ser controlado por algumas variáveis culturais, ele nunca será inteiramente suprimido. Não é muito claro que as pessoas se apaixonam mais freqüentemente quando sua sociedade desaprova o Amor Romântico, mas é plenamente possível que as pessoas apaixonem-se mais ou menos freqüentemente dependendo da organização social de sua cultura e ideologia. Assim considerando, a ênfase cultural dada a cada uma dessas variáveis pode fazer a diferença. Mas, a despeito da importância, do papel, das variáveis culturais, ambientais (sociais, educacionais, econômicas, entre outras) sobre o amor, particularmente sobre o amor romântico, podemos nos perguntar: Onde está no cérebro o Amor? O amor romântico, onde está? Acevedo e colaboradores, num estudo intitulado “Neural correlates of long-term intense romantic Love”, publicado na revista SCAN (2012) 7,145-159, procuraram desvendar os correlatos neurais do amor romântico intenso e de longo prazo usando a técnica de imageamento de ressonância magnética funcional (fMRI, na sigla em inglês). Para isso ela e membros da sua equipe requereram que dez mulheres e 7 homens, casados ​​há em média 21,4 anos, fossem submetidos às imagens de fMRI enquanto visualizavam imagens faciais de seus parceiros.  

As imagens de controle incluíam um conhecido altamente familiar; um amigo próximo e de longa data; e uma pessoa pouco familiar. Efeitos específicos para o parceiro intensamente amado e de longo prazo foram encontrados em: (i) áreas do sistema de recompensa rico em dopamina e dos gânglios da base, como a área tegmental ventral (VTA, na sigla em inglês) e o corpo estriado dorsal. Tais dados foram consistentes com resultados de estudos de amor romântico em estágio inicial; e (ii) várias regiões implicadas no apego materno, como o globo pálido (GP, também chamado de paleoestriado, é uma estrutura sub-cortical do cérebroque integra o telencéfalo), substância negra, núcleo da Raphe, tálamo, córtex insular, cingulado anterior e cingulado posterior. Correlações de atividade neural em regiões de interesse com os escores de questionários amplamente usados na área mostraram: (i) respostas VTA e caudadas correlacionadas com escores de amor romântico e inclusão de outros (valorização de outros) no ego (self); (ii) respostas do GP correlacionadas com pontuações de amor baseadas na amizade; (iii) respostas do hipotálamo e do hipocampo posterior correlacionadas com freqüência sexual; e (iv) respostas no núcleo caudado, septo/fórnice, cingulado posterior e hipocampo posterior correlacionadas com escores de obsessão obtido nos questionários. No geral, os resultados sugerem que, para alguns indivíduos, o valor da recompensa associado a um parceiro de longo prazo pode ser sustentado, semelhante ao novo amor, mas também envolve sistemas cerebrais implicados no apego e na ligação entre pares. 

Em suma, os dados de Bianca Acevedo e equipe (2012) mostraram que as respostas baseadas nas imagens de um parceiro amado e de longa data foram associadas aos sistemas cerebrais que foram identificados como sendo tão importantes como o ‘gostar’ das recompensas primárias. Além disso, os resultados mostraram ativação do GP posterior e insular do córtex em função de pontuações de amor baseadas na amizade. A ativação dessas regiões no contexto atual sugere aspectos do ‘gostar’ ou ‘prazer’ relacionados ao relacionamento com um dado parceiro. Portanto, o amor romântico, de alguma forma, ativa áreas muito especiais em nosso misterioso e enigmático cérebro. Talvez, Freud tenha tido, ou mesmo, tenha razão. 

Professor Visitante da UnB-DF* 

 

   

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