José Aparecido Da Silva*
De acordo com vários estudiosos, a memória é um processo extraordinariamente complexo tanto no nível biológico quanto no nível cognitivo (por exemplo, Ruiz-Vargas, 2010; Manual de psicologia da memoria. Madrid: Síntesis). Apesar do progresso e da sofisticação tecnológica das últimas décadas, os estudiosos da memória ainda entendem que é um mistério como o cérebro armazena e recupera a experiência e como a experiência retida, ou armazenada, se expressa a nível cognitivo e guia nossas ações e comportamentos.
Nosso cérebro utiliza a experiência para solidificar uma base de conhecimento a partir da qual recupera a resposta adequada a cada situação concreta. O processo que possibilita tal atividade é justamente o que denominamos de memória. Por esta razão, podemos afirmar que a função básica da memória humana é dotar os indivíduos do conhecimento necessário para guiar suas ações adaptativas independente da complexidade das situações. Talvez, por isso, um estudioso da inteligência humana tenha afirmado alhures que o cérebro não computa as respostas aos problemas, senão que as recupera de sua memória porque o cérebro não é um computador, mas um sistema de memória.
Assim considerando, a memória é uma adaptação evolucionista. Nossa sobrevivência só é possível porque dispomos de complexos sistemas de memória que registram, armazenam e recuperam a informação que em cada momento nos garantirá a resposta mais eficaz ou adaptativa. Na verdade, a grande contribuição da memória é nos permitir tirar proveito de tudo que vivemos, ou seja, nos beneficiarmos da experiência e, assim, aprender da v ida, do viver. Memória é, pois, a capacidade dos animais para adquirir, armazenar e recuperar diferentes tipos de conhecimento e habilidades.
Tradicionalmente, os estudiosos têm considerado que para entender como funciona a memória, a mesma deve ser fragmentada em diferentes formar, tipos ou sistemas. Este é, certamente, um domínio interessante, pois se trata de investigar a arquitetura, ou estrutura, da memória. No passado distinguiu-se entre uma memória primária e uma memória secundária. Depois a dividiram em memória de curto prazo e memória de longo prazo; outros a classificaram em registro sensorial, em armazenagem em curto prazo e em armazenagem em longo prazo, organizados sequencialmente por meio dos quais fluiria a informação. Mais tarde, estudaram-na como memória explícita e memória implícita destacando as formas que os diferentes sistemas de memória têm que expressar seus conteúdos.
Mais recentemente, a neurociência cognitiva da memória tem proposto dois grandes objetivos para tentar decifrar seus mecanismos e seus processos: o problema da base molecular da memória e o problema dos sistemas de memória. Para o renomado estudioso da memória humana, Daniel Schacter (The cognitive neuroscience of memory: perspectives from neuroimaging research. Philos Trans R Soc Lond B Biol Sci. 1997 Nov 29;352(1362):1689-95.) as abordagens da neurociência cognitiva para a memória tentam elucidar os processos e sistemas cerebrais que estão envolvidos em diferentes formas de memória e aprendizagem. Neste analítico estudo, ele examina as pesquisas recentes de pacientes com lesões cerebrais e os estudos de neuroimageamento que abordaram a distinção entre formas de memória. A memória explícita refere-se à lembrança consciente de experiências anteriores, enquanto a memória implícita refere-se aos efeitos não conscientes de experiências passadas no desempenho e comportamentos subseqüentes.
Ele mostra evidências que sugerem que uma forma implícita de memória conhecida como priming está associada com alterações nas regiões corticais posteriores envolvidas no processamento perceptual; algumas das mesmas regiões podem contribuir para a memória explícita. A formação do hipocampo e o córtex pré-frontal também desempenham funções importantes na memória explícita. Em adição, Schacter discute evidências de estudos recentes de varredura PET (Tomografia por Emissão de Pósitrons) que sugerem que as regiões frontais estão associadas a esforços estratégicos intencionais para recuperar experiências recentes, enquanto a formação do hipocampo está associada a algum aspecto da lembrança real de um evento.
Um estudioso certa vez comentou que: considerando que o tempo é contínuo o presente acabou de se tornar passado. Logo, percepção é impossível.e toda a psicologia se reduz a memória e imaginação. Deixando de lado a imaginação, uma grande parcela de nosso pensamento depende em muito da nossa memória. (Hunt, E. (2010): Human Intelligence. Cambridge University Press, p.155).
Professor Visitante da UnB-DF*