José Aparecido Da Silva
No longínquo 1949, Freud (1856-1939), em sua conferência 25 na que tratava da psicanálise, escreveu: “Não tenho necessidade de introduzir ansiedade para vocês. Cada um de vocês já tem vivenciado essa sensação ou, falando mais corretamente, esse estado afetivo, em um momento ou outro de suas vidas”. Ansiedade, assim como, raiva, tristeza, desgosto, medo e muitas outras, são consideradas emoções negativsa básicas. Um dos pontos de partida para a pesquisa psicológica sobre ansiedade é sua natureza multifacetada, podendo ser entendida como moderada ou extrema, transitória ou duradoura e útil ou lesiva. Por outro lado, há, também, uma gama de diferentes maneiras de vivenciar ansiedade, com diferentes conseqüências para o funcionamento e comportamento de uma pessoa em seu cotidiano. Ademais, ansiedade é das mais pervasivas e genuínas de todas as emoções humanas, permeando todas as culturas. Uma variedade de intervenções para manejo da ansiedade tem sido desenvolvida e avaliada ao longo das últimas 4 décadas tanto para as formas normativa e subclínica, bem como para as formas clínicas de ansiedade. As intervenções e as orientações comuns têm sido a tradicional medicamentosa, cujas moléculas têm aumentado sua eficácia e segurança em função do profundo conhecimento que temos tido acerca da psicofarmacologia e das estruturas e funcionamento do cérebro. Por outro lado, as intervenções ditas psicológicas têm variado desde a psicanalítica à terapia cognitivo-comportamental e mais recentemente à perspectiva cognitiva, essencialmente espelhando a evolução das terapias comportamentais. As recentes intervenções têm essencialmente focado sobre tratamentos dirigidos em direção às facetas emocionais, cognitivas e comportamentais da ansiedade.
Um programa guiado de redução do estresse baseado na atenção plena (mindfulness) foi observado ser tão eficaz quanto o uso do medicamento padrão-ouro – o antidepressivo comum escitalopram – para pacientes com transtornos de ansiedade, de acordo com os resultados de um ensaio clínico randomizado e inédito liderado por pesquisadores do Centro Médico da Universidade de Georgetown. Tais descobertas acabaram de ser publicadas no JAMA Psychiatry (2023 800 (1): 13-21) e foram endossadas pela Força-Tarefa de Serviços Preventivos dos Estados Unidos que, pela primeira vez, recomendou o rastreamento de transtornos de ansiedade devido à alta prevalência desses transtornos. Elizabeth Hoge, médica, diretora do Programa de Pesquisa sobre Transtornos de Ansiedade e professora associada de psiquiatria em Georgetown e primeiro autor do estudo, afirma: “Nosso estudo fornece evidências para que médicos, seguradoras e sistemas de saúde recomendem, incluam e forneçam reembolso para a redução do estresse baseada na atenção plena como um tratamento eficaz para transtornos de ansiedade, porque a meditação da atenção plena atualmente é reembolsada por muito poucos provedores”, “Uma grande vantagem da meditação mindfulness é que ela não requer um diploma clínico para treinar alguém para se tornar um facilitador de mindfulness. Além disso, as sessões podem ser realizadas fora de um ambiente médico, como em uma escola ou centro comunitário.”
Os autores do estudo recrutaram 276 pacientes entre junho de 2018 e fevereiro de 2020 de três hospitais em Boston, Nova York e Washington, D.C., e designaram aleatoriamente pessoas para MBSR ou escitalopram. O programa de meditação para redução do estresse baseado na atenção plena foi oferecido semanalmente durante oito semanas por meio de aulas presenciais de duas horas e meia, um retiro de um dia de aula no fim de semana durante a 5ª ou 6ª semanas e exercícios diários de 45 minutos para prática em casa. Os sintomas de ansiedade dos pacientes foram avaliados no momento da inscrição e novamente ao término da intervenção, às 8 semanas, juntamente com avaliações pós-tratamento, às 12 e 24 semanas após a inscrição. As avaliações foram realizadas de forma cega – os avaliadores clínicos treinados não sabiam se os pacientes que estavam avaliando receberam o medicamento ou o programa de meditação. No final do ensaio, 102 pacientes haviam completado a meditação e 106 haviam completado o ciclo da medicação. Os pacientes eram relativamente jovens, com idade média de 33 anos e incluíam 156 mulheres, o que representava 75% dos inscritos, refletindo a prevalência da doença nos EUA.
Os pesquisadores usaram uma medida de avaliação validada para avaliar a gravidade dos sintomas de ansiedade em todos os transtornos, usando uma escala de 1 a 7 (sendo 7 sendo ansiedade grave). Ambos os grupos observaram uma redução em seus sintomas de ansiedade (uma redução média de 1,35 pontos para o programa de meditação e uma redução média de 1,43 pontos para a droga, o que foi um resultado estatisticamente equivalente), caindo de uma média de cerca de 4,5 para ambos, o que se traduz numa queda significativa de 30% ou numa de redução na gravidade da ansiedade das pessoas. Assim considerando, as intervenções padronizadas baseadas na atenção plena, como o programa de redução do estresse baseado na atenção plena podem diminuir a ansiedade, mas antes deste estudo, as intervenções não haviam sido estudadas em comparação com medicamentos ansiolíticos eficazes. “É importante notar que embora a meditação mindfulness funcione, nem todos estão dispostos a investir tempo e esforço para completar com sucesso todas as sessões necessárias e fazer práticas regulares em casa, o que aumenta o efeito”, disse Hoge, a autora principal do estudo.