José Eugenio Kaça *
[email protected]
A proibição do uso de celulares pelos alunos da educação básica no Brasil ressuscitou o velho dilema da falta de qualidade na educação básica pública brasileira, que a mais de um século vive no perrengue. A educação básica pública de tempos em tempos passa pelas chamadas “modernizações”, que são propostas feitas na maioria das vezes por políticos descompromissados com a qualidade da escola básica pública, que serve majoritariamente aos filhos dos pobres. A segregação era a marca da educação básica pública até boa parte do século 20. O ensino era dividido em ensino primário, chamado popularmente de grupo escolar, ginásio e secundário. A quase totalidade dos filhos dos pobres não concluíam o ensino primário, pois quando aprendiam a ler, e parcas noções de matemática, abandonavam a escola, pois precisavam trabalhar para ajudar no sustento da família. E as outras fases da educação básica eram só para as classes mais abastadas.
A falta de vergonha e dignidade dos intitulados “patriotas”, que vão até a terra do Tio Sam, para lamber suas botas, não é novidade, acontece desde que o Tio Sam passou a ser o poderoso da vez, e a chamada “elite” brasileira cair de quatro. Nos anos 1960, o do Império do Norte expandiu seus tentáculos para a América do Sul, e vislumbrou o Brasil como uma oportunidade de negócios, mas precisava que os trabalhadores brasileiros fossem mais qualificados, ai a educação básica entrou no radar. A Aliança para o Progresso, era um programa surgido na esteira da Guerra Fria, para ajudar financeiramente o desenvolvimento da educação nestes países, mas no fundo era o combate ao comunismo. O dinheiro chegou ao Brasil, e a contra partida era democratizar o acesso das crianças nas escolas.
Em 1971, o governo militar promulgou a Lei 5692, que fundia o ensino primário e ginasial, no ensino de 1º grau de 8 anos, e o ensino secundário, que era dividido em: cientifico e clássico, no ensino de segundo grau, e com isso achavam que por osmose a educação básica pública iria percorrer o caminho do sucesso; mas desilusão. Com esta medidas esperava-se que o problema da evasão escolar fosse minimizado, no entanto, algo deu errado. Em 1977 entraram na 1ª série do primeiro grau; 6.436.434 alunos, e concluíram a 8ª série em 1984; 865.149 alunos, conclusão: apenas 13% dos alunos concluíram o primeiro grau.
A mácula que a repetência e a evasão escolar causa nos educandos é cruel. Em 1920, o Professor Sampaio Dória falou pela primeira vez em progressão continuada, para evitar a reprovação da primeira para a segunda série do ensino primário. Depois Paulo Freire tentou implantar na rede pública de São Paulo quando foi Secretário da Educação, mas houve resistência e o projeto foi boicotado. Em 1996, a nova LDBEN (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) trouxe em seu bojo pela primeira vez a progressão continuada. A ideia da progressão continuada no ensino fundamental é que os alunos aprendam e progridam no seu próprio ritmo, dentro de ciclos que que duram mais do que um ano letivo, a ideia é que os alunos se apropriem de todos os conhecimentos exigidos até o fim de cada etapa do ensino fundamental, entretanto a realidade foi outra, e a progressão continuada foi transformada em promoção automática, com os alunos chegando ao final do período analfabetos, e os criminosos não foram punidos.
E até hoje essa cambada de entreguistas acusa a progressão continuada pelo fracasso escolar. A falta de estratégias e as desastrosas políticas para a educação básica vai transformando o ambiente escolar em um manicômio. Substituíram os livros didáticos por apostilas de qualidade duvidosa, compraram tablets para os alunos, pagaram caro e não entregaram; como não entregaram os tablets, perimiram que os alunos levassem seus celulares, que a princípio seria para o uso pedagógico, entretanto, perdeu-se o controle, e a velha disciplina imposta pela força voltou com força. A proibição dos celulares nas escolas, sem que haja um debate, com a finalidade de promover a cidadania, não vai dar certo – vai ser mais conflito, mas talvez essa seja a deixa para se implantar uma educação policialesca. Como alguns parlamentares canalhas já propuseram; que a polícia militar tome conta das escolas básicas públicas. Quando a pressão é excessiva, o parafuso espana, e ninguém segura a mola!
* Pedagogo, líder comunitário e ex-conselheiro da Educação