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Morre Alfredinho, do Bar Bip Bip

A partida para o andar superior do dono de um bar seria coisa corriqueira, não fosse o Bar Bip Bip, em Copacabana, Rio de Janeiro; mas também não seria tão noticiado se seu dono não fosse Alfredinho, figura admirada pela nata do samba carioca. Todos os grandes sambistas do Brasil foram beber naquela fonte divulgadora do bom e velho samba.

Quando fui ao Rio de Janeiro pela primeira vez, isso faz uns cinco ou seis anos, no mesmo voo estava meu amigo, o compositor e cantor mineiro Evandro Navarro, radicado em Ribeirão Preto, mas que na época morava no Rio e tentava por lá sua carreira artística. Eu até gravei “Mais que o mar”, uma belíssima música que ele compôs em homenagem à Cidade Maravilhosa.

Já no Aeroporto Santos Dumont, ao nos despedirmos, Evandro disse que eu não poderia voltar pra Ribeirão Preto sem conhecer o Bar Bip Bip e seu famoso dono Alfredinho. Estava hospedado no hotel do Sesc e o bar ficava próximo, esperei o momento oportuno e fui lá picar meu cartão e colocar mais um bar no meu currículo (rsrsrs). Um grupo de chorinho alegrava o ambiente e notei que ninguém aplaudia os artistas, e só depois fui saber que era para não incomodar os vizinhos.

Este bar é considerado o menor do Rio de Janeiro, com apenas 19 metros quadrados. Imagine!!! Os músicos ficam lá dentro, o e público espremido com eles, de pé na calçada ou entre poucas mesas por ali espalhadas. Em certos momentos a rua lota e o comandante pede silêncio – e os vizinhos seguram a onda.

Músico que se preza precisa passar por ali. Não tem equi­pamento de som, é tudo no gogó, instrumentos de som alto são proibidos. Alfredinho contava que era de Niterói, atraves­sava a famosa ponte somente para beber neste bar, que fica localizado na rua Almirante Gonçalves nº 50, que morre na badalada Avenida Atlântica, aquela do famoso Calçadão de Copacabana, próximo ao Forte.

Ele não era o dono, mas era como se fosse, simplesmente frequentador diário do pedaço junto com Cristina Buarque de Holanda, irmã do Chico e que morava com a mãe numa esquina há poucos metros dali. Um belo dia, Alfredinho com­prou o ponto, e tempos depois o imóvel, e assim passou a ser o dono de fato e de direito.

Fui lá uma vez, de dia, havia somente um funcionário fazendo limpeza, pedi para observar somente, ele educada­mente permitiu e assim pude curtir aquele espaço cheio de pequenos quadros pendurados e muita magia. Conta Moacyr Luz, sambista carioca, que aplausos no bar são proibidos e só pode estalar os dedos. Se chegar alguém muito perfumado, Alfredinho pedia pra se retirar.

Disse também que, certa vez, chegou um jovem casal, Alfredinho estava sentado na porta de chinelos e bermuda, o rapaz estranhou o tamanho do bar e perguntou: “Aqui é o Bip Bip?” E o dono, sempre mal humorado, respondeu na lata: “Você não tá vendo a placa?”

O jovem engoliu a seco e pediu dois chopes. “Chope não tem”, emendou Alfredinho. “Só cerveja”. E o rapaz: “Então me vê duas”. Alfredinho, mais uma vez, deu na canela do jovem. “Olha aqui, rapaz, já vi que você não é da área, não temos garçom. Abra a geladeira, pegue a cerveja e marque seu nome num caderno ali no balcão e coloque risquinhos de quantas cervejas tomar. Depois você paga, mas pegue sempre de duas porque aqui só vendemos cervejas pequenas.”

O casal adorou o que estava acontecendo e os dois toma­ram quase meia geladeira. Semana passada Alfredinho se mandou, foi velado em seu bar com direito à roda de samba e tudo mais. O corpo foi levado em cortejo até o Cemitério São João Batista. Parte o homem, mas fica sua história.

Sexta conto mais.

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