Maria Ysabelle e Maria Ysadora, de 2 anos, gêmeas siamesas que nasceram unidas pela cabeça, já estão em Patacas, distrito de Aquiraz, distante 35 quilômetros de Fortaleza, no Ceará, onde nasceram, e só voltarão a Ribeirão Preto esporadicamente para visitar a equipe médica do Hospital das Clínicas que comandou todo o processo de separação – inédito no Brasil – e os voluntários que colaboraram para manter a família na cidade durante o período do tratamento e cirurgias, que durou dois anos.
Elas embarcaram com os pais para o Ceará na manhã desta sexta-feira, 29 de março, e a partir de agora serão acompanhadas em Fortaleza pelo neurologista Eduardo Jucá, médico responsável pela transferência das meninas para o HC de Ribeirão Preto, em 2017. Uma foto divulgada no perfil do Hospital das Clínicas em uma rede social mostra as irmãs e os pais acomodados no voo, que deixou o Aeroporto Estadual Doutor Leite Lopes. As gêmeas ainda usam proteção nas cabeças e aparecem vestidas com macacões azuis e blusas cor-de-rosa.
De acordo com o HC, a boa evolução após o complexo processo de separação permitiu que as duas tivessem alta e pudessem voltar à terra natal. Em janeiro deste ano, o pai das meninas, Diego Freitas Farias, disse que sonhava levar as filhas para conhecer o mar. A família havia planejado celebrar o Ano-Novo em Aquiraz, mas a viagem teve que ser adiada em razão da cicatrização de Maria Ysadora, já que ela havia passado por uma cirurgia de enxerto. Desde a separação, a família morava em um condomínio fechado e se mantinha com a ajuda de amigos, em Ribeirão Preto.
Elas receberam alta médica do HC Criança, unidade do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (HC-FMRP/USP), em 7 de dezembro. Agora, em Fortaleza, vão passar por reabilitação, que deve durar um ano – ficaram deitadas muito tempo na cama, e agora precisam de trabalhos de fisioterapia para fortalecer a musculatura e desenvolver os movimentos.
As gêmeas deixaram Ribeirão Preto depois de um ano cheio de batalhas – entre fevereiro e outubro de 2018, passaram por cinco cirurgias até a separação. A família contou com o apoio de voluntários, e assim conseguiu mobiliar o imóvel onde estava e outros itens necessários para as crianças e também para os pais. Para o neurocirurgião Ricardo Oliveira, que também acompanhou o tratamento, a evolução motora e cognitiva das meninas é considerada boa. As duas foram separadas depois de uma série de cinco cirurgias que começou em fevereiro. A separação definitiva ocorreu em 27 de outubro. As duas irmãs têm desenvolvimento normal, como qualquer criança da idade delas, estão aprendendo a falar, brincam juntas e até já ficam sentadas para se alimentar.
As irmãs passaram por cinco cirurgias desde fevereiro. A última, como em todos os procedimentos que envolvem as siamesas, contou com apoio de 30 profissionais. A operação de separação das gêmeas craniopagus é inédita no Brasil – a equipe do HC de Ribeirão Preto foi a primeira a realizar esse tipo de cirurgia. O médico norte-americano James Goodrich, referência mundial no assunto e que criou o método de separação de siamesas por etapas, acompanhou a operação. Segundo ele, antes da cirurgia por fases era muito difícil salvar as duas pessoas e os pais, muitas vezes, tinham de escolher quem sobreviveria.
Todo o processo de separação das meninas foi custeado pelo Sistema Unificado de Saúde (SUS). Nos Estados Unidos, uma cirurgia de separação como a delas custa cerca de R$ 9 milhões. A equipe que participou da cirurgia de separação foi composta por neurocirurgiões, cirurgiões plásticos, neurorradiologistas, anestesistas, pediatras intensivistas e enfermeiros – foram homenageados pelo prefeito Duarte Nogueira Júnior (PSDB) e pela Câmara de Vereadores.
A primeira operação ocorreu em 17 de fevereiro e durou cerca de sete horas. A segunda cirurgia, em 19 de maio, teve duração de oito horas. A terceira cirurgia ocorreu em 3 de agosto e se estendeu por oito horas. A quarta cirurgia aconteceu em 24 de agosto, quando os médicos implantaram expansores subcutâneos para dar elasticidade à pele e garantir que, na separação total de corpos houvesse tecido suficiente para cobrir os dois crânios. A última levou mais de 20 horas.