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Minha primeira noção de céu!

Era domingo, Festa Litúrgica da Sagrada Família, Padroeira da Paróquia de Três Corôas (RS), onde fui batizado no dia 16 de junho de 1957 e crismado no dia 2 de novembro de 1959. Meu pai, com 27 anos de idade, como presidente do Conselho Admi­nistrativo Paroquial, passou o dia trabalhando na festa. O pároco e meu pai cultivavam profunda amizade.

Minha mãe, com 25 anos de idade, também estava presente. Éramos quatro filhos: o mais velho, com 6 anos; eu, com 4; o terceiro, com 2 anos; e minha irmãzinha, internada com uma enfermidade sem cura na época, com apenas 5 meses de idade. Ela faleceu no dia do enterro de meu pai.

Na manhã seguinte, dia 15 de janeiro de 1962, às 7 horas, meu pai cometeu suicídio. Disparou um único tiro no ouvido direito, que saiu no olho esquerdo. Minha mãe e nós três meni­nos estávamos na casa dos avós paternos. Meu pai deixou seu caminhão em frente ao atacado de cereais que possuía, subiu ao quarto do casal na residência sobre o mesmo atacado e disparou com seu revólver calibre 38.

Seu sócio, ao ouvir o tiro, chamou meu avô paterno para entra­rem juntos no recinto. Eu, sempre o mais curioso dos três, corri atrás e assisti aquela cena em que socorriam meu pai todo ensanguenta­do. Levaram-no ao hospital bem próximo de nossa casa.

Todo o povoado se concentrou em frente ao hospital numa corrente de oração, sem naturalmente compreender por que meu pai cometera o suicídio, que na minha modesta opinião é o ápice do encontro da coragem com a covardia. Meu pai sobrevi­veu por 12 horas.

Por volta de 16 horas recobrou a consciência e pediu para fa­lar com minha mãe, meu irmão mais velho e o padre. Segundo o próprio padre me contou anos mais tarde, meu pai balbuciou seu arrependimento e recebeu a então chamada “Extrema Unção”! Faleceu às 19 horas.

Quando minha mãe, minha avó paterna e minha tia (a irmã de meu pai) retornavam do hospital, estávamos todos apreen­sivos por notícias. Quando meu irmão mais velho perguntou pelo pai, nossa tia apontou para um pôr de sol magnificamente indescritível de tão belo.

O sol se despedia, debruçando-se sobre uma montanha rochosa que fica diante da casa de nossos avós. Ela nos disse: “Vejam como o céu se vestiu lindamente. Foi para receber o pai de vocês. Agora ele está lá, no colo de Deus, acariciado por Nossa Senhora”!

Certamente gravado em meu subconsciente, ao alcançar a adolescência, ganhando minha primeira máquina fotográfica, passei a fotografar pôr de sol. De todas as minhas fotografias, as que mais me agradavam eram as de pôr de sol. Com o passar do tempo descobri que naquele pôr de sol me fora dada minha primeira noção de céu!

Durante o mês de setembro refletimos amplamente a pre­venção ao suicídio. Quis minha história de vida colocar-me em contato com a morte, que dói tanto, por meio do suicídio de meu amado pai. Ao longo de meu ministério presbiteral, acompanhei com profundo zelo e sensibilidade pastorais, as famílias que, como a minha, precisaram lidar com o suicídio.

E não foram poucas. O suicídio não só mata quem se suicida. Mata também um pouquinho de cada membro da família que se vê obrigada a entregar uma pessoa que ama com tamanha crueldade. Meu pai teve a graça do arrependimento e da Unção dos Enfermos. Continuo acreditando no dedo de minha tia apontando para aquele belíssimo pôr de sol, minha primeira noção de céu!

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