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Meus amigos garçons

Hoje quero homenagear meus amigos garçons. Se tem uma classe para a qual eu tiro meu chapéu, é a deles. Cantei na noite por 30 anos e conheci profissionais maravilhosos. No saudoso restaurante Ponto Chic soltei o gogó por 16 anos e os titulares eram Seu Luiz, Geraldo – que já está no subsolo – e Juscelino. Eram completamente diferentes um do outro.

Quando a noite estava animada, Seu Luiz, pra me acompanhar num samba, passava a mão em duas colheres e me perseguia no ritmo. Era muito querido, alguns clientes só aceitavam ser atendidos por ele. Geraldo era o inverso, pouco sorria, mas era gente boa. Juscelino era o mais jovem, um serelepe, dava o maior nó nos dois parceiros. Muito rápido, prestativo ao extremo, uma espécie de faz-tudo, tipo daquele personagem “Severino”, vivido na TV pelo já falecido ator e humorista Paulo Silvino.

“Severino” era pau pra qualquer obra, mas deixava o diretor lelé. Foram tempos que só quem vivenciou pode avaliar. Quando o boca-bo­ca se espalhou, de que Sócrates picava cartão ali todo final de semana, havia fila na calçada esperando por uma mesa. Muita gente de cidades vizinhas vinha pra conhecer o Doutor, saborear o “filé à parmegiana” e a suculenta “feijoada” do mestre Toninho. O tempo passou e Juscelino continua a mil, hoje mantém em sua agenda uma lista de clientes vips no ramo gastronômico.

Fiz grandes amigos no Ponto Chic. Hoje, 25 anos depois, quando os encontro o papo rola solto. Entre eles lembro-me bem do Jorge e Cristina, eles bebiam bem e não tinham filhos. Eu chegava pra cantar as oito da noite e eles já estavam lá, eu saía depois da uma da madrugada e eles permaneciam lá (rsrs).

Na Choperia Degraus cantei por seis anos, tinha uns oito garçons. Lembro-me deles de paletó branco, calça preta, aquele paninho dobrado no braço… No sorteio das praças às vezes rolava um quiproquó, mas tudo terminava bem. Só sei que eles lutavam um pelo outro. A experiência da profissão faz com que o garçom fique calejado quando um cliente malan­dramente tem a intenção de dar o cano e sair de fininho. Aí, meu brother, ficam todos de olho na figura, eles se unem e a coisa ferve.

No Degraus vivi histórias incríveis com os garçons João, Dionísio, China, FM, Mexerica, Betão, Ismael, Correa e Cauby. O segurança Tarzan, que treinava alteres, botava ordem no galinheiro, o braço dele era da grossura das minhas pernas, ninguém encarava. Certa noite, um malandro sentou-se com a namorada próximo da saída, era praça do FM, que ficou de olho neles. Comeram e tomaram muitos chopes, a casa tava lotadaça, e num descuido o casal vazou.

FM deu o alarme, mas eles foram lisos. João, que ajudava o amigo, viu que na pressa esqueceram a chave do carro sobre a mesa. FM botou no bolso e passou umas duas horas, o malandro mandou a namorada falar com FM, que estava uma fera. O garçom falou: “Fala pro covarde do seu namorado vir buscar”. Tarzan, de braços cruzados e cara de pou­cos amigos, dava cobertura. A moça viu que a parada para o namorado seria indigesta, foi buscar a grana. Pagou e levou a chave.

Em outra noite no Degraus chegaram Jorge e Cristina, meus amigos do Ponto Chic, empurrando um carrinho de bebê. Jorge disse: “Buenão, adotamos Renatinho hoje e viemos festejar e batizá-lo na boemia”. Ri­mos um bocado e eles na maior felicidade. A casa lotou e horas depois FM gritou: “Ô, Bueno, seu amigo foi embora com a esposa e esqueceu o filho aqui, onde ele mora?”

“No Sumarezinho”, eu disse. FM entrou no seu Passat. Na avenida Francisco Junqueira, pareou com o Monza do Jorge e já foi gritando: “Hei, vocês esqueceram o filho no bar”. Jorge e Cristina, assustados, voltaram e carinhosamente colocaram Renatinho no conforto do carro. Porém, antes de irem embora, Jorge me disse: “Buenão, foi nossa pri­meira noite com o bebê, desculpe pela mancada, só falta nos acostumar­mos…” Renatinho tem hoje quase 30 anos.
Sexta conto mais.

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