Feres Sabino *
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O primeiro ato que imprimiu na minha lembrança infantil um apelo chamado Brasil, sem dúvida, aconteceu quando a professora me designou para declamar um poema no dia 7 de setembro. Ele teria uma gesticulação nada espontânea, não fosse a dedicação da minha irmã, que me fez repetir tantas vezes a declamação que o Brasil se tornou íntimo, assumindo o pequeno menino com a maior suavidade. Foi a primeira fala em público.
7 de setembro.
Um grito de independência, em torno do qual vagarosamente foi se formando o núcleo daquilo que seria minha convicção em fazer do meu país um território livre e justo.
No entanto, o tempo foi se esticando, e o Brasil que era um país injusto continuou a sê-lo, mesmo com a tentativa de democratização dos benefícios sociais, em decorrência de políticas públicos que se apresentavam, às vezes, perante outros governos e países, mas sem vassalagem.
Se esse Brasil sonhado cresceu 7%, entre 1930 a 1980, o que aconteceu para esse retrocesso espantoso, e que de 2010 aos dias atuais continuou retrocedendo, depois daquele período exuberante, cuja taxa de crescimento era a maior do mundo?
A China não estava atrás do Brasil? A Coreia do Sul não estava atrás do Brasil?
Nossas elites civis e militares se revelaram absolutamente incapazes de projetar a experiência do passado recente, apreender com ela, e construir uma hipótese de trabalho ideológica, coletiva, que desse continuidade ao “projeto nacional de desenvolvimento do Brasil”.
A realidade histórico-social-política não foi suficiente para formar e conformar mentalidades e ideias enraizadas no solo geográfico-social do país, conhecendo sua diversidade cultural, sua extensão territorial, seus rios caudalosos, a sua riqueza de subsolo, sua exuberância humana, e dar resposta de objetividade de análise e de proposição a um pais entregue, hoje, à sanha dos corretores do neoliberalismo, no mais rápido desmonte do Estado de Bem estar social que se tem notícia.
Se os civis não souberam massificar a ideia democrática, juntando aos militares nessa formulação, estes muito menos o saberão fazê-lo com as suas lideranças atuais, a maioria entregues ao reinado de chavões ideológicos, que retiram do espaço público o debate franco, aberto e profundo, no qual se coloquem os brasileiros e os que aqui vivem para serem os operários do novo tempo.
7 de setembro.
Ao invés da data símbolo da infância, da vida adulta, ela se converte claramente em campo de prometida arruaça provocada pelo Presidente da República, que traz na sua “capivara” o registro de quem desejava explodir quartéis no Rio de Janeiro, como um terrorista nativo, e que depois, como deputado, já celebrava a tortura, a morte, o torturador, e os milicianos matadores do Rio de Janeiro.
Sinto dificuldade hoje para vislumbrar o Brasil livre e justo, que um dia me foi oferecido e assumido como hipótese de trabalho,convicto de que ele daria certo. No meu tempo histórico, certamente não haverá tempo.
Se o país está esvaziado do sentimento de nação, a vertente batida por nossos pés atuais é a do quintal sequestrado e manipulado por um Feitor obediente do interesse estrangeiro. Viva o fuzil! Abaixo o livro!
E não é que ouço o poema da infância!
* Procurador-geral do Estado no governo de André Franco Montoro e membro da Academia Ribeirãopretana de Letras