Por Ricardo Magatti
O célebre “ataque dos sonhos” do Santos havia ficado desfalcado com a morte de Coutinho em 2019 e perdeu Dorval, que morreu em decorrência de insuficiência cardíaca, no último dia 26 de dezembro. Mas as façanhas do quinteto ofensivo mais famoso do futebol brasileiro são indeléveis e permanecem vivas na memória dos torcedores. E as histórias continuam a ser contadas pelos outros integrantes, Mengálvio, Pelé e Pepe.
Para Pelé, Dorval foi o “melhor ponta-direita da história” e um “herói” no Santos. O parceiro do Rei do Futebol, conhecido pela velocidade e habilidade em campo, morreu aos 86 anos. Os dois jogadores chegaram ao Santos na mesma época e foram colegas de quarto na concentração e depois na pensão da Dona Georgina.
José Macia, o Pepe, concorda com o Rei do Futebol. “O Dorval foi um excepcional jogador. Uma perda sensível para o futebol brasileiro. Só não conseguiu ter mais chances na seleção brasileira porque havia um gênio chamado Garrincha, que desequilibrou em duas Copas”, diz ao Estadão o “Canhão da Vila”.
“Foi um jogador formidável. Jogava às vezes até na ponta-esquerda, no meu lugar. Era um craque”, completa Pepe sobre o antigo companheiro. O ex-jogador passa os últimos dias de 2021 em sua chácara em Socorro, no interior de São Paulo. Por isso, não esteve presente no velório de Dorval na Vila Belmiro, em Santos.
Antônio Wilson Vieira Honório, o Coutinho, foi o primeiro a se despedir. Em 11 de março de 2019, aos 75 anos, o centroavante, que se posicionava como poucos dentro da área, morreu em casa após sofrer um enfarte no miocárdio. Pelé, na ocasião, dissera que um dia faria tabelinha com o antigo companheiro no céu.
Todos os cinco são ídolos do Santos e alguns considerados os melhores atletas do futebol brasileiro em suas posições. Pelé, claro, é o Rei do Futebol, eleito o “Atleta do Século”. Mas não se tornaria Pelé sem a ajuda dos outros quatro jogadores do ataque mais fantástico da história do time da Vila Belmiro.
“Sem dúvida nenhuma, até hoje, em todo mundo, não apareceu um ataque em que os cinco jogadores estiveram em suas melhores formas técnicas e físicas na mesma época”, definiu Pelé há alguns anos. “Essa é uma das razões de eu ter me tornado o maior artilheiro do mundo em todos os tempos.”
Pepe corrobora o pensamento de Pelé e também considera que os cinco formaram o melhor ataque de todos os tempos. Mas não se esquece de Pagão, centroavante tão brilhante quanto Coutinho que não teve a sequência que gostaria em virtude das seguidas lesões Há muitos que o consideram superior a Coutinho, inclusive.
Os cinco formaram a linha ofensiva mais vitoriosa da história do futebol brasileiro. Nos seis anos em que jogaram juntos na década de 1960, Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe conquistaram cinco títulos estaduais, seis nacionais, duas Libertadores e dois Mundiais – façanha inédita que nenhum outro clube do Brasil sequer chegou perto. Atuaram juntos em 99 jogos e marcaram 295 gols. Foram 79 vitórias, nove empates e 19 derrotas. Somando os números individuais de Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe, foram 2.083 gols marcados em 3.281 partidas com a camisa santista.
O ataque mágico do Santos foi capaz de fazer mais de 100 gols em um campeonato e mais de uma vez. Graças ao talento e requinte desses craques, o Santos foi campeão nacional seis vezes, mostrando a supremacia no País na segunda metade dos anos 1950 e ao longo de todos os 1960. Com eles, o time alvinegro emendou uma sequência de mais de uma década inteira com títulos em todos os anos. Pelé (1091), Pepe (403) e Coutinho (368) são os maiores artilheiros da história do Santos.
Para o time dourado nunca houve fronteira. Nunca houve barreira que não pudesse ser transposta. Nunca houve adversário que fosse imbatível. Mengálvio considera que aquela formação foi uma obra divina. “Jogar naquele ataque representou tudo na minha vida. Só me deu alegrias. Tantos anos se passaram e ainda somos lembrados Sou muito feliz por presenciar tudo isso. Deus escolheu os elementos certos e botou para jogar. Ninguém ensinou a gente”.
O quinteto tem um lugar na calçada da fama do Museu Pelé, bem como outros ídolos, como Lima, Juary e Léo. No aniversário de 105 anos do Santos, em 2017, eles foram prestigiados pelo clube e também gravaram os seus pés no Memorial de Conquistas da Vila Belmiro.
O primeiro jogo do quinteto foi diante da Portuguesa, no dia 19 de abril de 1960, no Pacaembu, pelo torneio Rio-São Paulo. Apenas 900 espectadores viram a primeira vez em que o Santos reuniu seus cinco craques. O encontro terminou empatado em 2 a 2 A última vez dos cinco juntos ocorreu em 9 de janeiro de 1966, um domingo, na cidade de Abidjan, na Costa do Marfim, no estádio Félix Houphouët-Boigny. Eles se despediram com goleada sobre o Stade Club Abidjan por 7 a 1.
Terminou no noroeste da África a saga da linha ofensiva que está até hoje viva na memória dos amantes do futebol. O quinteto espalhou a magia do futebol bonito e ofensivo por 18 países das Américas, Europa, África e Oriente Médio. No Brasil, jogou 47 vezes; na França, nove, e na Itália, oito. “A gente fazia muitas excursões para as América, Europa e África. Todo mundo queria ver o grande time do Santos jogar”, recorda-se Pepe, ciente de que não se pode apagar a história que eles escreveram juntos.