José Aparecido Da Silva*
Os termos “avaliação” e “mensuração” são frequentemente utilizados como sinônimos. Porém, muitos autores entendem que é importante distingui-los. A mensuração é uma tentativa de quantificar a experiência individual da sensação ou percepção de qualquer evento psicológico em comparação com outros indivíduos vivenciando a mesma sensação ou com sua própria dor vivenciada em outros momentos (o paciente é controle de si mesmo). Por sua vez, a avaliação é parte de um processo global muito mais amplo do que uma simples mensuração, englobando desde a avaliação das características físicas e história do paciente em relação a aquele evento psicológico (por exemplo, dor, ansiedade, depressão, medo, felicidade, inteligência), bem como, aspectos sensoriais, emocionais, motivacionais, religiosos, crenças e valores pessoais acerca do evento psicológico em questão. Certamente os mesmos instrumentos escalares podem ser utilizados tanto para a avaliação quanto para a mensuração, mas os usos das informações diferem. As escalas de mensuração são essenciais na pesquisa, mas elas são também muito úteis na prática clínica onde esteja envolvida uma grande equipe. Uma avaliação global, considerando todas as múltiplas dimensões da sensação/percepção de um evento psicológico, é imprescindível, especialmente em contextos clínico-hospitalares.
Todavia, o quão bom é um instrumento (escala, questionários ou inventário) que tenta capturar estas várias dimensões de um constructo psicológico, digamos inteligência? Para aferir a qualidade de qualquer instrumento de avaliação e/ou mensuração, torna-se importante conhecer as propriedades metrológicas das medidas daquele fenômeno psicológico. Há centenas de instrumentos de mensuração/avaliação de divulgados na literatura científica. Entretanto, apenas um número limitado deles tem suas propriedades metrológicas de fidedignidade, validade e capacidade discriminativa aferidas apropriadamente do ponto de vista psicométrico. Cada instrumento possui vantagens e desvantagens quando usados na prática ou na pesquisa clínica.
Há muitos instrumentos de mensuração disponíveis e muito mais estão sendo desenvolvidos e testados. Como podemos decidir sobre quais medidas são adequadas num dado contexto clínico, de pesquisa? Existem três importantes aspectos que devem necessariamente ser levado em consideração. A medida deve ter utilidade clínica. Ela deve também ser fidedigna e deve ser uma medida válida daquele aspecto do constructo sendo mensurado e avaliado. Estas duas últimas características são extremamente importantes e sem que elas sejam aferidas nenhum instrumento para mensuração deve ser utilizado. A fidedignidade refere-se a replicação e a consistência dos resultados e a validade refere-se à relação entre os resultados e as dimensões-componentes reais do fenômeno que o instrumento está supostamente mensurando. Se um instrumento não for fidedigno torna-se impossível avaliar a sua validade, de forma que seria logicamente impossível ter um instrumento que seja válido, mas completamente não confiável. Portanto, um bom instrumento para a mensuração psicológica deve ser tanto fidedigno quanto válido, embora a validade seja considerada como a verdadeira medida da utilidade do teste.
A utilidade das medidas que são incorporadas na prática clínica depende da qualidade de sua fidedignidade e de sua validade. Medidas sobre as quais a fidedignidade e a validade são desconhecidas podem fornecer informação quantitativa, podem ser comumente usadas e podem até mesmo ser aceitas por companhias de seguro, mas elas não nos fornecem uma avaliação acurada e confiável da experiência psicológica de interesse. Nós não conhecemos exatamente o que elas de fato medem e o que nem o que elas almejam medir. A fidedignidade é frequentemente explicada em termos do processo de mensuração na física e engenharia. Há várias, embora comparáveis, definições de fidedignidade. De um lado, a fidedignidade refere-se à extensão em que as medidas são replicáveis – pelo mesmo examinador fazendo diferentes medidas do mesmo atributo ou por diferentes examinadores fazendo a mesma medida de um atributo. De outro lado, podemos também entender, de maneira mais parcimoniosa, a fidedignidade como a precisão de um instrumento e mensurações confiáveis como um procedimento consistente. Deste modo, a fidedignidade refere-se ao grau de consistência entre duas medidas de uma mesma coisa.. Nenhum instrumento será absolutamente consistente. Não obstante, torna-se necessário construir instrumentos, escalas, inventários, questionários que sejam o mais fidedigno possível.
Finalmente, a validade é considerada a característica mais importante na avaliação de um instrumento. O conceito refere-se à apropriação, significação e utilidade das inferências específicas feitas a partir dos escores dos instrumentos. A validade refere-se genuinamente à característica de se ou não um instrumento está mensurando alguns atributos do mundo real que supostamente ele está mensurando. A validade é a verdadeira medida de quão útil é o instrumento. O processo de validação de um instrumento é realizado acumulando evidências que suportam tais inferências feitas a partir dos resultados deste instrumento. Validade, portanto, não é um conceito unitário e há várias formas de estimá-la. Assim considerando, um completo entendimento destas propriedades psicométricas, das qualidades, dos instrumentos de mensuração psicológica, são fundamentais para o processo de construção de testes, escalas, questionários e afins, de modo que possamos criar ferramentas de avaliação que sejam psicologicamente significativas e confiáveis.
Professor Visitante da UnB-DF*