José Aparecido Da Silva*
É comum pessoas mais brilhantes apresentarem maior escolaridade, assim como, as de maior escolaridade tenderem a ser mais brilhantes. E estes fatos, por mais simples que pareçam, eliciam, surpreendentemente, diferentes interpretações para estudiosos que medem inteligência e educação para uso em pesquisas. Suas diferentes abordagens levam a diferentes tratamentos analíticos que, sob o uso de diferentes metodologias, variadamente impactantes no delineamento destes estudos, resultam em diferentes interpretações dos dados obtidos. Educação e inteligência, estudadas desde as primeiras pesquisas empíricas sobre estes tópicos, voltam a sê-lo quando escores de testes de inteligência e resultados educacionais – usualmente avaliados pelos anos de educação integral ou qualificação mais alta alcançada, bem como, pelas séries escolares ou desempenho nos escores dos testes educacionais – são mensurados, aproximadamente, ao mesmo tempo, gerando uma correlação típica de 0,50. Todavia, a correlação entre inteligência e educação demanda mente aberta no que toca à interpretação causal. Talvez, pessoas mais inteligentes ganhem acesso a maior e mais elevado nível de educação.
É possível que maior escolaridade eleve escores nos testes de inteligência; que configure para os estudiosos definirem pessoa e situação, genética e ambiente, causa e efeito, discernindo-os. E isto ainda que as influências possam fluir em ambas as direções. Estudos longitudinais, que mensuram, primeiramente, a pontuação em testes inteligência e, posteriormente, o desempenho educacional, tal como avaliado pelos anos despendidos em educação integral, obtenção de maior qualificação ou escores de avaliações educacionais, revelam, entre ambos, correlações de moderado a alto. Correlações variam entre 0,60 a 0,96 quando testes de inteligência são aplicados aos 11 anos. Desempenhos educacionais são aferidos aos 16 anos de idade. Logo, a principal conclusão que emerge de tais estudos é que inteligência tem mais fortes efeitos causais nos resultados educacionais do que vice-versa.
Por outro lado, estudos que examinaram a relação entre tempo de escolaridade e inteligência tentaram, certamente, capturar o reverso da cadeia causal. Seus resultados geralmente suportam a observação de que mais tempo na escola leva a maior inteligência. Por exemplo, estudo indica que determinado sistema escolar requeria, para ingresso de crianças, que estas tivessem seis anos no dia 1º de abril, o que lhe permitiu comparar os escores das crianças cujas datas nascimentos caíram exatamente antes ou depois daquele ponto divisor. Isto porque, efetivamente, as crianças tinham a mesma idade cronológica, mas um ano de diferença em escolaridade. Os dados revelaram que crianças de oito anos de idade, que tinham recebido um ano extra de escolaridade, desempenharam de forma mais similar àquelas escolarizadas aos 10 anos, do que àquelas de oito anos de idade. Vale notar que os resultados revelaram, também, que os testes de inteligência mais afetados foram aqueles mais saturados com o conteúdo curricular ensinado nas escolas, enquanto testes de inteligência fluída, que capturam habilidades para resolver problemas originais e inéditos, foram menos afetados. No geral, as correlações entre escolaridade, duas medidas de inteligência não-verbal e uma medida de inteligência verbal variaram entre 0,49 a 0,68, concluindo-se que educação influencia inteligência, mas alguns testes de inteligência foram contaminados por incluírem conteúdo ensinado no currículo.
Considerados juntos, os resultados indicam que inteligência causa diferenças nos desempenhos educacionais, assim como, educação causa diferenças na inteligência e que a interação ocorre em ambas as direções. É claro que nem todas as pessoas obtêm o mesmo benefício de uma dada oportunidade educacional, bem como, que as mesmas oportunidades educacionais não estão disponíveis para qualquer um. Neste caso, distinguir entre processos envolvidos na educação e inteligência é difícil porque isto requer mensurações que possam, simultaneamente, estabelecer atribuições causais em momentos apropriados e identificar influências genético-ambientais, e suas relações, no momento da mensuração. Um problema que surge é inteligência e educação serem, comumente, usadas como possíveis causas e mediadores de outros resultados. Por exemplo, epidemiologistas, sociólogos, psicólogos, economistas, demógrafos, cientistas sociais, entre outros, incluem inteligência e educação como possíveis influências sobre ampla variedade de fatores humanos, nestes incluindo saúde e doenças, funções cognitivas no envelhecimento, mobilidade social e nível socioeconômico. Como inúmeros indicadores educacionais são mais prontamente disponíveis a estes estudiosos, os mesmos fazem uso, mais frequentemente, da educação como uma “variável controle”, quando, na realidade, o “confundidor”, ou a causa comum nas análises, poderia ser a inteligência.
Sendo educação um alvo muito mais fácil, enquanto inteligência situa-se para além do alcance dos estudiosos, e muito mais longe para dirigentes políticos, muitos colocam que o fomento da educação, enquanto objetivo de políticas públicas, pode melhorar indicadores econômicos e de saúde da população. Políticas dirigidas à educação visam ampliar a escolaridade mínima, aumentando a porcentagem da população com nível universitário. Mas, estudiosos e dirigentes políticos devem estar cientes que o ingrediente ativo pode ser, talvez, outro: a inteligência.
Professor Visitante da UnB-DF*