Nos últimos vinte e sete anos e meio quem visitou o Bosque e Zoológico Municipal Dr. Fábio de Sá Barreto, em Ribeirão Preto, com certeza, viu uma mulher negra, de estatura pequena, atarefada, entre uma atividade ou outra, prestando atendimento aos animais do local.
Funcionária do Bosque, desde 1994, após ser aprovada no concurso para bióloga, Marisa dos Santos, hoje com 57 anos de idade, é o que se pode chamar de amante da causa animal. Adora a profissão e, ao longo dos anos, acumulou momentos e experiências que tiveram grande parte registrada por meio de fotos que ela guarda com muito carinho.
Nas imagens existem desde momentos de afagos com leões, até cenas em que ela amamenta – com mamadeiras -, recém-nascidos filhotes de tamanduás bandeira que perderam suas mães.
Na época em que começou a trabalhar, o Bosque tinha apenas o veterinário – que também era diretor do local -, o biólogo Lélio Favaretto. Ele também foi professor de Marisa na Universidade de São Paulo (USP), campus de Ribeirão Preto, onde ela se formou.
“Naquela época, eles precisaram separar a função de biologia da de diretoria, então me chamaram. No início foi uma batalha implantar normas e regras sobre cuidados com animais para o pessoal que estava acostumado a fazer do seu jeito”, relembra Marisa. Ela conta que enfrentou algumas resistências de antigos servidores, mas logo eles a aceitaram.
Natural de Batatais, mas morando em Ribeirão desde os dez meses de idade, Marisa fez mestrado em Zoologia na USP de São Paulo e é uma apaixonada pelo zoológico. Seus colegas da Sociedade Paulista de Zoológicos e da Sociedade de Zoológicos do Brasil, sempre ressaltavam essa paixão.
“Só me dei conta realmente disso quando disse que iria me aposentar e dezenas de ex-estagiários, estagiários e os colegas de outras Instituições, disseram que não sabiam o que seria do zoológico sem o meu trabalho”, conta com certo orgulho. Porém, Marisa tem consciência de que existem outros profissionais com dedicação e amor semelhante ao seu.
Uma curiosidade sobre Marisa é que, desde criança, assistia a todos os programas de TV sobre animais. Também repetia para seus familiares que um dia trabalharia no Bosque. “Naquela época, só tinham programas de televisão sobre a África, a Europa e América do Norte, mas eles me fascinavam. Lembro-me dos seriados chamados Daktari e Cowboys na África que eram os meus favoritos”, recorda. O fascínio era tamanho que, aos 11 anos de idade, gastou todo o dinheiro da mesada – economizado durante meses -, para montar a enciclopédia “Os Bichos” da Editora Abril Cultural.
O desejo de trabalhar no Bosque também era alimentado pelas visitas que, semanalmente, fazia ao local. Marisa morava na Rua João Bim, no bairro Campos Elíseos, perto do local e ir até lá era algo fácil de ser feito. Volta e meia levava frutas para os animais. No passado houve um período em que isso era permitido.
Entre os animais residentes do Bosque os preferidos da bióloga são os tamanduás bandeira. A maioria chegou lá, ainda bebê porque tinha ficado órfão.
“Tenho uma relação especial com eles e muitas vezes os levava para casa por meses até desmamarem e comerem sozinhos,” relembra a bióloga explicando que na natureza os filhotes desta espécie dependem da mãe por muitos meses.
Dos animais que nasceram no local Marisa tem predileção pelo babuíno sagrado Kiko que atualmente vive em quarentena por ser muito idoso. Outro favorito é o urubu-rei Príncipe, espécie ameaçada de extinção que só reproduziu duas vezes nos vinte e sete anos e meio em que a bióloga trabalhou no Bosque.
Entre as histórias engraçadas que ela relembra está o dia em que o então tratador dos animais, “Seo Josias”, tropeçou em uma sucuri pensando que era um galho de árvore. Ao notar que era uma cobra saiu correndo e, pálido, entrou na sala da diretoria do Zoológico para falar sobre o passeio da cobra pelo recinto.
Aposentada desde o começo de julho deste ano, Marisa afirma que vai aproveitar o tempo livre para cuidar um pouco mais de si mesma. “O trabalho com animais silvestres é maravilhoso, mas exige que a gente se ponha de lado. Então, com a idade, preciso me cuidar. Vou melhorar meu Inglês, viajar para ver animais em seus ambientes naturais e se possível prestar assessoria em fauna”, explica.
Entretanto, ela ressalta que não irá deixar de visitar seus antigos amigos de trabalho e os animais do Bosque Zoológico com quem ela conviveu por mais de duas décadas e meia.
Conheça o Bosque
O Bosque e Zoológico de Ribeirão Preto têm cerca de 830 animais de 156 espécies sob seus cuidados. Fica localizado no Parque Municipal Morro do São Bento, um espaço de lazer com 250.880 metros quadrados de muita área verde com Jardim Japonês, lagos, flores, quiosques, pontes, alamedas para caminhadas e um mirante de 45 metros de altura.
No local existem 30 espécies de primatas, felinos e roedores, entre eles pumas, onças, capivaras, cervos, antas, saguis, micos raros e os divertidos macacos-prego. No setor de répteis faz sucesso o Terrário com suas serpentes peçonhentas e não peçonhentas (sem veneno) e lagos com tartarugas, lagartos e jacarés em extinção, como o jacaré-de-papo-amarelo.
Já no Aquário existem peixes brasileiros de várias espécies, raias e lontras. Também há aves de todos os tipos, como araras e tucanos. Desde 2011, os animais do Bosque Fábio Barreto recebem presentes em comemoração ao Natal. Neste ano não deverá ser diferente.
O Bosque Fábio Barreto atende cerca de três animais resgatados e feridos por dia. A maioria deles, vítima da própria ação humana, como as queimadas. Informações sobre bichos silvestres feridos ou perdidos podem ser passadas ao Corpo de Bombeiros (telefone 193), Polícia Ambiental (3996-0450) e do zoológico (99969-2728).