Por Antonio Gonçalves Filho
Parte das comemorações dos 72 anos do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM/SP), a exposição retrospectiva do pintor paraibano Antonio Dias (1944-2018) deveria ter sido aberta em março, mas a pandemia da covid-19 provocou o cancelamento da mostra. Prevista para ser inaugurada finalmente em setembro, quando o MAM reabrir, ela pode ser vista virtualmente, a partir desta segunda-feira, 27, na página do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM) no Google Arts & Culture, um recorte virtual da exposição Antonio Dias: Derrotas e Vitórias, que tem curadoria de Felipe Chaimovich. A prévia online será seguida esta semana por uma conversa pelo YouTube (sexta-feira, às 17 horas) entre Chaimovich e o atual curador do museu, Cauê Alves.
Um dos grandes nomes da pintura contemporânea brasileira e um dos poucos artistas cujo trabalho tem cotação internacional, Antonio Dias foi, na verdade, um artista multimídia, cuja obra, de forte conteúdo social e político, marcou definitivamente a arte brasileira dos anos 1960 em diante. A exposição reúne obras históricas também dessa década, raramente exibidas – e todas pertencentes ao acervo pessoal do artista.
Ao morrer, em agosto de 2018, Antonio Dias reuniu um acervo que cobre praticamente toda a sua trajetória artística. O conjunto dessas obras inclui tanto peças das quais Dias jamais se separou como trabalhos recomprados de terceiros. Trata-se, segundo o curador Chaimovich, de um conjunto deliberadamente “construído como uma representação do próprio artista”.
No período da inauguração online, de 27 a 31 de julho, o MAM vai promover em suas redes sociais conteúdos e atividades relacionadas à mostra propostos pelo setor educativo do museu, e ainda a citada conversa transmitida ao vivo no YouTube entre Felipe Chaimovich e Cauê Alves.
Antonio Dias começou sua carreira nos anos 1960 já muito bem orientado – ele estudou com o gravador Osvaldo Goeldi (1895-1961) no Atelier Livre de Gravura da Escola Nacional de Belas Artes, em 1959, no Rio de Janeiro. Esse breve aprendizado, segundo dizia Dias, foi fundamental em sua formação de artista, que, a exemplo do mestre, tinha um trabalho comprometido com causas sociais. Se Goeldi ilustrou a obra de Dostoievski e retratou os humilhados e ofendidos da sociedade brasileira, Dias participou ativamente da resistência à ditadura militar, produzindo uma obra de caráter político contra o regime. Com a convivência com o Grupo Frente, sua arte pop e figurativa mudou de rumo posteriomente, reincorporando a abstração.
A carreira internacional de Antonio Dias começou cedo. Logo após participar da mostra Opinião 65, foi convidado pelo crítico francês Pierre Restany a expor na Bienal de Paris. Foi a porta que se abriu para o cenário externo. Em 1971 recebeu uma bolsa da Fundação Guggenheim para uma série referencial, The Illustration of Art (há filmes dela na mostra).
Seis anos depois, em 1977, Antonio Dias começou outra série histórica, a dos papéis do Nepal. Ele passou cinco meses lá, produzindo papéis artesanais em Barabishe, localidade próxima da fronteira com o Tibete. O que deveria ser apenas seu Livro-Projeto – Dez Planos para Projetos Abertos (concebido em 1968) virou uma experiência (existencial e artística) marcante. Nessa viagem ao país asiático, na região do Himalaia, Dias conviveu com famílias nepalesas durante o processo de fabricação artesanal de papéis feitos com fibras e folhas e tingidos naturalmente, libertando-se das “formas rígidas que usava antes” em sua produção, segundo atestou.
Dois desses trabalhos estão na exposição. A série é considerada por muitos críticos o momento de virada de sua carreira. “Ele deixa para trás o olhar irônico para se concentrar na natureza do material com o qual trabalha”, observa o curador Chaimovich. No processo de realização dessas composições entram o óxido de ferro, pigmentos minerais como a malaquita e apenas uma cor (o vermelho).