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Mais de 1.000 rancheiros podem ser expulsos do Rio Pardo

ALFREDO RISK

Adriana Dorazi – especial para o Tribuna Ribeirão

Mais de mil famílias que possuem ranchos nas mar­gens do Rio Pardo nos muni­cípios de Jardinópolis, Sertão­zinho e do distrito de Cruz das Posses vivem a insegu­rança de, a qualquer mo­mento, verem o patrimônio ser tomado e demolido.

Uma Ação Civil Pública movida pelo Ministério Públi­co de São Paulo (MP-SP) em 2015, contra a Agropecuária Iracema Ltda. – que atualmen­te representa as antigas Usinas São Francisco e Santo Antônio – obriga que seja cumprida a legislação ambiental vigen­te, que tornou obrigatória a constituição de mata ciliar ou Área de Preservação Perma­nente (APP) para manuten­ção de rios perenes.

O impasse vem desde o ano 2000 quando foi firmado o pri­meiro Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) entre o MP e a agropecuária que deveria tomar medidas de preservação ambiental nas terras sob sua propriedade, mas ainda não havia pedido expresso para a retirada dos rancheiros.

Já em 2015, a abertura de um Inquérito Civil Ambiental para apurar a situação dos ran­chos deu origem à ação con­tra a Iracema. Na decisão de primeira instância a agrope­cuária foi condenada a remo­ver os ranchos e recuperar as áreas, mas recorreu. Em de­zembro do ano passado, mes­mo com o recurso, a decisão inicial foi mantida no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

E, agora neste mês de feve­reiro, foram julgados embar­gos de declaração e novamente mantida a decisão de primeira instância. A agropecuária ain­da pode recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao Supremo Tribunal Federal (STF), mas caso não obtenha decisão favorável poderá ser obrigada a pagar multa anual de R$ 60 milhões ao ano por descumprimento.

O que dizem os rancheiros

Segundo o advogado Fabrício Martins Pereira, os rancheiros estão sendo considerados como ‘invasores’, como pesso­as que não têm direito algum, quando na verdade, as usinas, por meio de seus diretores antigos, há mais de 40 anos, reconheceram essas famílias como possuidores dos lotes – Foto: ARQUIVO PESSOAL

O advogado Fabrício Mar­tins Pereira é representante de um grupo de rancheiros atingi­dos por essa decisão. Ele infor­mou que deverá ingressar com ação conjunta tentando anular esse processo de 2015 já que entende que não houve amplo direito de defesa de quem tem propriedade na área.

“Os rancheiros estão sen­do considerados como ‘inva­sores’, como pessoas que não têm direito algum, quando na verdade, as usinas, por meio de seus diretores antigos, há mais de 40 anos, reconheceram es­sas famílias como possuidores dos lotes, adquirentes de boa fé e que devem ter o direito de legalizar o que ainda for neces­sário por meio da lei de usuca­pião”, explica.

Fora da discussão jurí­dica, o advogado também busca junto aos poderes Le­gislativos de Sertãozinho e Jardinópolis apoio para que os proprietários não percam os investimentos feitos nos ranchos ao longo dos anos. “Queremos abrir um canal de diálogo, quem sabe propor um novo TAC desta vez com a participação dos rancheiros por meio do qual poderia se pensar em compensação am­biental a ser cumprida de ou­tra forma”, antecipa.

Haveria ainda ações indivi­duais dos rancheiros tramitan­do na justiça, o que aumenta a insegurança jurídica da ques­tão já que ainda poderão sair novas decisões em separado. Josimar Carreira é um dos ran­cheiros que aguarda apreensi­vo o desfecho do imbróglio. Ele tem rancho na área desde 1994 e comenta que há fa­mílias que residem de forma permanente no local, tiram o sustento da terra.

“Os rancheiros preservam a Natureza, cuidam dos ani­mais silvestres. Reflorestamos áreas onde antes tinha só cana. Há animais domésticos no lo­cal, socorremos muitos outros que são abandonados. Nunca recebemos fiscalização de de­núncia, multa, nada. Ajuda­mos até a proteger o meio ambiente contra poluição, incêndios criminosos. Não podemos ser punidos com base em uma lei que foi cria­da depois que já estávamos aqui”, afirma o rancheiro.

O rancheiro Josimar Carreira faz uma selfie no Pardo: há famílias que residem de forma permanente no local, tiram o sustento da terra – Foto: Arquivo pessoal

Iracema afirma que também é ré
A reportagem do Tribuna Ribeirão entrou em contato com a Agropecuária Iracema para saber qual o posiciona­mento sobre o processo. A assessoria de comunicação apresentou despacho do de­sembargador Miguel Petroni Neto, do TJSP, em apelação re­cente do processo, no qual ele destaca que “a presente ação foi ajuizada porque a ré não quer ingressar nos autos de cumprimento de sentenças, na qualidade de proprietária das áreas, para possibilitar a retirada dos ocupantes, a demolição dos ranchos e res­tauração das margens”.

Mas, o magistrado afirma que “cabe à apelante sim, ape­sar de seus protestos, promo­ver a retirada dos rancheiros e quem ocupar a área com cons­truções. Como a apelante vai operacionalizar isso não cabe ao Judiciário dizer, mas sim às autoridades administrativas e policiais que irão acompanhar o cumprimento da decisão, atendendo a peculiaridade de cada caso e a situação existente no local”, ordena.

Em nota, Edmo Bernar­des, assessor de comunicação corporativa da Agropecuária Iracema disse ainda que “vá­rios proprietários de áreas e os rancheiros são réus em di­versas ações distribuídas pelo Ministério Público do Estado de São Paulo sobre a questão. Nestas ações já houve a decisão judicial para a desocupação, demolição destas edificações irregulares, bem como a con­sequente recomposição am­biental das áreas ocupadas às margens do Rio Pardo que, se­gundo entendimento da Justi­ça, os rancheiros se assentaram indevidamente”, completa.

Não há confirmação se ha­verá novos recursos ao Supe­rior Tribunal de Justiça (STJ) ou Supremo Tribunal Federal (STF). A Iracema explicou que está na expectativa do trânsito em julgado da ação.

GAEMA – Núcleo Pardo fala em “ônus” para toda a sociedade
A pedido da reportagem do Tribuna Ribeirão, o Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (Gaema) do MPSP enviou nota sobre a ação. Confira na íntegra:

“A atuação do MPSP no combate às ocupações ilícitas em Áreas de Preservação Permanentes visa assegurar que elas (APPs) cumpram suas funções ambientais, indispensáveis à qualidade de vida e, espe­cialmente, à segurança hídrica na região da Bacia do Pardo.

Sabe-se que a qualidade da água sofre os impactos da urbanização desordenada e do desmatamento. Logo, a condição desse recurso depende diretamente da conservação das referidas Áreas de Preser­vação Permanente.

Ocorre que a ampliação do número de ranchos tem ensejado o aparecimento de verdadeiros bairros afastados dos núcleos urbanos, sem quaisquer serviços e infraestruturas de coleta e tratamento de esgoto, coleta de lixo, entre outros.

Portanto, a manutenção dessas ocupações ilícitas, a esmagadora maioria destinada ao lazer dos seus frequentadores (com raríssimas exceções), acarreta consequências cujos ônus serão suportados por toda a sociedade.

Justamente para evitar esse quadro, há décadas o MPSP tem ajuiza­do centenas de ações contra os ‘rancheiros’ e os proprietários rurais. Muitas dessas ações transitaram em julgado recentemente e o MP aguarda o cumprimento das sentenças”.

Segundo o advogado Fabrício Martins Pereira, os rancheiros estão sendo considerados como ‘invasores’, como pesso­as que não têm direito algum, quando na verdade, as usinas, por meio de seus diretores antigos, há mais de 40 anos, reconheceram essas famílias como possuidores dos lotes

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