Por Hugo Luque
Quando veste o kimono, Lívia Pietra Gmeiner Borges, de 11 anos, se sente em casa. A jovem ribeirão-pretana é, atualmente, uma das grandes revelações do jiu-jítsu na cidade e já vive, desde muito cedo, o verdadeiro dia a dia de uma atleta profissional. Todo esse esforço tem dado resultado, já que, apesar da pouca idade, a garota carrega medalhas para uma vida inteira.
Contudo, a luta dela vai além dos tatames. Apesar do rendimento impressionante, apresentado em tão pouco tempo, e da vontade incontestável de vencer, a família precisa recorrer à criatividade financeira para viabilizar os deslocamentos e manter a chama da paixão de Lívia acesa.
Filha de peixe…
O amor pela modalidade vem, principalmente, da influência e do olhar crítico do pai, Everton Borges de Lima, professor de jiu-jítsu. Praticante há anos, ele é um dos treinadores de Lívia na academia da equipe Grappling Fight Team (GFTeam), localizada no Quintino Facci II.
Apesar da inspiração caseira, o mentor garante que nem sequer precisou fazer muito esforço para que a filha gostasse de lutar.
“Sou praticante de jiu-jítsu e professor, então acredito que a minha influência foi uma motivação para ela começar a treinar. Eu comecei a dar aulas em 2019. Antes disso, era aluno, e a Lívia sempre vivenciou isso e sempre foi comigo para a academia. Quando me tornei professor, ela, então com apenas seis anos, quis fazer sua primeira aula e nunca mais parou”, conta o pai, orgulhoso.
Logo de cara, ficou claro para Everton que algo especial havia começado naquele instante. “Desde o início, percebi que ela tinha talento para o esporte e que se tornaria uma grande atleta”, acrescenta.
Dominante
Praticante da modalidade há cerca de cinco anos, Lívia não entrou no jiu-jítsu de brincadeira, embora para ela seja uma grande diversão. O pai e treinador estima que, até hoje, no âmbito regional, a garota tenha realizado 51 lutas e participado de 17 campeonatos, com impressionantes 17 títulos nesses torneios.
Além disso, está invicta em sua categoria na região de Ribeirão Preto, com finalizações em menos de dois minutos em todas as lutas. “Eu fiquei muito feliz. Cada medalha de ouro conquistada me motivou a treinar mais e sempre buscar o meu melhor”, revela Lívia.
Ela ostenta campeonatos por todo o Brasil. Entre as principais, alguns dos mais recentes. Em dezembro de 2023, a atleta mirim venceu o Campeonato Mundial da Confederação Brasileira de Jiu-Jítsu Esportivo (CBJJE), em São Paulo.
Já neste ano, apenas em quatro meses de competição, a jiujiteira foi campeã internacional duas vezes. A primeira na modalidade internacional kids da Federação Brasileira Internacional de Jiu-Jítsu (IBJJF), em fevereiro, na cidade de Florianópolis, Santa Catarina.
Por fim, no último mês de março, não deu chance às adversárias e se tornou bicampeã sul-americana da IBJJF, no Rio de Janeiro. Mas ela não quer parar por aí.
A menina prodígio ainda sonha em deixar sua casa cada vez mais decorada com medalhas de ouro. Entre elas, uma em especial. “Meu maior sonho é lutar no Pan-Americano Kids IBJJF, nos Estados Unidos, na cidade de Kissimmee, na Flórida”, conta a atleta.
A cidade, na região de Orlando, tem se transformado em um centro importante do jiu-jítsu mundial, inclusive com diversas academias fundadas por brasileiros. Neste ano, a primeira edição do Pan já aconteceu, no final de março. Contudo, o torneio será disputado novamente entre os dias 26 e 28 de julho.
Apesar disso, será difícil pegar o avião para a América do Norte ainda em 2024. “Estamos planejando o Pan Kids IBJJF nos Estados Unidos para o ano que vem, porque o custo é muito alto”, diz Everton.
Doces, rifas e vaquinha
Ser uma promessa do esporte exige muita disciplina. Por isso, Lívia não deixa os estudos de lado e segue uma intensa rotina planejada pelo pai, Everton, e pela mãe, Mariane Gmeiner Lopes.
“Na parte da manhã, de segunda, quarta e sexta, ela treina jiu-jítsu específico com drills e posições voltadas para competidores. No período da tarde, ela vai para escola e, à noite, ela treina em grupo. Terça e quinta ela treina funcional na parte da manhã e à tarde vai pra escola. No período da noite, treina novamente o jiu-jítsu em grupo”, comenta Everton, que faz questão de lembrar dos primeiros passos. “A Lívia sempre se destacou, desde a primeira luta que ela fez. Com oito anos, fez sua estreia em campeonatos, com três lutas, e finalizou todas as atletas da categoria”, acrescenta o treinador.
Embora o esforço de toda a família seja evidente, buscar um lugar ao sol em uma arte marcial globalizada e extremamente competitiva exige disponibilidade para se deslocar constantemente. Além disso, também é caro se manter na estrada, entre uma competição e outra.
Para ajudar a garota a continuar atuando nos campeonatos em 2024, a família teve uma ideia e abriu uma vaquinha on-line. A arrecadação, iniciada em dezembro do ano passado, reuniu cerca de 1,4% do valor total necessário. É possível auxiliar com qualquer quantia no endereço virtual vakinha.com.br/vaquinha/ajude-uma-atleta-de-jiu-jitsu-competir-em-2024.
Assim, ademais dos treinos diários, estudos e de auxiliar a família nos cuidados com a irmã mais nova, que também já foi iniciada nos tatames aos quatro anos, Lívia também mostra sua garra no tempo livre, já que não tem apoio público. “Como as viagens, hospedagens, alimentações e inscrições são caras, e não temos apoio da cidade de Ribeirão Preto, fizemos a vaquinha on-line e algumas rifas. Ela ajuda a vender doces na praça da bicicleta nos finais de semana, quando não tem campeonato. Quando tem competição, ela participa das lutas e depois vende seus doces e rifas”, detalha Everton.
Mesmo com as dificuldades, todavia, uma coisa é certa: sonho de pai é ver filho feliz. “Meu sonho é ver ela ser uma grande atleta e conquistar todos os sonhos dela. Fico com misto de ansiedade, apreensão e nervosismo, mas também muita felicidade e orgulho”, conclui o pai.