Os músicos e os não-músicos atualmente festejam os 150 anos do extraordinário compositor Sergei Rachmaninov, que nasceu em Semionov, na Rússia, tendo morrido nos Estados Unidos, depois de ter encontrado um grande sucesso internacional.
Merece ser registrado que, pouco tempo antes de Rachmaninov chegar aos Estados Unidos, os negros pobres ali residentes já compunham músicas, tendo como instrumento apenas a “tábua de lavar roupa” que, com seus anéis, ensejavam o aparecimento constante de novas composições, surgindo o que se denominou “jazz”.
A criatividade constante dos negros com seu único instrumento, a incrível “tábua de lavar roupa”, no final do século XIX, ensejaram criações musicais norte-americanas cuja onda alcançou todo o canto do mundo. Com o tempo, muitas dessas canções norte-americanas já não tiveram qualquer raiz na música negra, pois os brancos também seguiram suas sendas, compondo e recompondo suas canções, com outros instrumentos mais sofisticados.
Uma delas foi originariamente calçada no trabalho de Rachmaninov. Trata-se de sua obra mais aplaudida e mais conhecida, ou seja, o seu “Concerto número 2” para piano e orquestra.
Antes de tecer algumas palavras sobre o “Concerto número 2”, parece-nos importantíssimo lembrar que o tema principal da música originária do compositor russo, foi tomado por compositor norte-americano, convertendo-se num famoso disco gravado em 1945 pelo cantor Frank Sinatra, batizado como “Lua Cheia e Braços Vazios” (“Full Moon and Empty Arms”). É escusado dizer que também a versão popular teve enorme sucesso. Até hoje a canção está gravada no Google com a voz de Sinatra.
A obra originária de Rachmaninov expõe um dificílimo duelo entre uma orquestra de um lado com um pianista solitário do outro lado. No seu encerramento, o concerto, como o nome indica, une o som majestoso do pianista com os músicos de toda a orquestra. A exposição musical de um não acompanha o outro. Consideramos grandes apreciadores do “Concerto número 2”, cujas frases musicais acompanham a nossa história porque suas notas estão gravadas até hoje nas pedras das nossas memórias.
A lembrança da tarde em que ouvimos o “Concerto” pela primeira vara o tempo. A resposta é evasiva, mas tem um palco, o Teatro Pedro II de Ribeirão Preto.
Naqueles tempos a cidade tinha mais de dois Conservatórios Musicais. Nossas professoras, quase todas mulheres, dedicavam seu histórico trabalho educando várias gerações de estudantes que, quase sempre, mas nem sempre, tornavam-se pianistas.
Uma vez por ano, os Conservatórios apresentavam seus alunos no palco do Teatro Pedro II. Adultos e jovens eram atraídos pelos novos mestres, ao som das teclas sonoras de seus pianos, quase sempre, mas nem sempre, refazendo as notas musicais de Frederico Chopin. Chopin era a grande atração.
Numa apresentação, hoje sem data registrada, uma jovem pianista, apresentou uma versão do “Concerto número 2”. De Rachmaninov! É desnecessário dizer que a jovem pianista não se encontrava acompanhada de qualquer orquestra. Apresentava-se solitariamente. Portanto, o destaque era exatamente aquele que inspirou o músico norte-americano quando criou “Full Moon and Empty Arms” para Frank Sinatra. A jovem pianista, Anna Maria, registrou sua história na nossa memória.
Como fazemos hoje para ouvir todo o “Concerto número 2”? Ouvimos pela TV. Há pelo menos três músicos notáveis: 1) um pianista chinês que reside nos EEUU; 2) uma pianista alemã; 3) e um insuperável e jovem pianista sul-coreano. Conseguem ressuscitar Rachmaninov, como também contribuem para retirar do fundo da nossa memória aquela tarde quando, pela primeira vez, no Teatro Pedro II, ouvimos a reprodução daqueles sons emitidos por uma jovem ao piano.