Líderes da Câmara dos Deputados já discutem mudar o salário mínimo de R$ 1.040 proposto pelo governo Jair Bolsonaro (PSL) para vigorar em 2020. O valor, incluído no projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), não garante um ganho real (acima da inflação) para os trabalhadores e repercutiu negativamente no Congresso Nacional.
Para lideranças, a proposta do governo, que garante apenas a correção da inflação pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), pode comprometer a tramitação da reforma da Previdência, porque 23 milhões de beneficiários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) ganham um salário mínimo (hoje de R$ 998). Ao todo, cerca de 48 milhões de brasileiros recebem o piso salarial.
A estratégia dos deputados é alterar o valor na Comissão Mista de Orçamento (CMO), por onde a LDO terá de passar antes de ser votada, ou apresentar um projeto de lei com uma nova política de valorização do mínimo. A regra atual perde a vigência no fim do ano. O tema foi discutido ontem em reunião do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), com lideranças dos partidos do Centrão, como PP, PR, PRB, SD e Podemos.
Embora o governo afirme que ainda não definiu uma política salarial (e tem tecnicamente até dezembro para apresentar uma), líderes querem garantir um aumento real para o piso em 2020. Rodrigo Maia deu o tom na terça-feira, 16 de abril, da articulação ao afirmar que “tudo” o que a Câmara puder fazer para valorizar o salário dos brasileiros, será feito.
“Agora, qualquer encaminhamento populista gera um benefício no curto prazo e um prejuízo no longo prazo”, alertou. Maia lembrou o que ocorreu na semana passada com a Petrobrás. Depois que o presidente Jair Bolsonaro determinou que a empresa suspendesse o reajuste do preço do diesel, o valor de mercado da companhia recuou R$ 32 bilhões.
“Temos de tomar cuidado. Se a gente encaminhar uma valorização do mínimo acima das limitações do Orçamento, vamos aumentar o déficit público, gerar restrições fiscais e prejudicar o crescimento do Brasil.” Ele adiantou que o Congresso pode tomar uma decisão divergente do governo no curto prazo.
O presidente não deve trabalhar pela derrota da proposta do governo, mas pode intermediar uma “solução meio termo” para segurar um movimento mais “agressivo” por parte da maioria dos deputados, que gostaria de ver aumento real mais expressivo. O deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), que esteve na reunião com Maia, defendeu a mudança na CMO para se manter no ano que vem a regra atual, que prevê reajuste de acordo com a inflação dos 12 meses anteriores acrescida do crescimento da economia de dois anos antes.
Até este ano, o piso nacional era corrigido pela inflação do exercício anterior medida pelo INPC, mais a variação do Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e dos serviços produzidos no país) de dois anos anteriores. Como a lei que definia a fórmula deixará de vigorar em 2020, o governo optou por reajustar o mínimo apenas pela inflação estimada para o INPC, mas terá de apresentar um projeto de lei se quiser definir uma política de reajuste ou deixar o valor ser negociado no Orçamento de cada ano.
No entanto, a política de correção do mínimo, informou o secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, será apresentada nos próximos meses. “O aumento do salário mínimo é apenas paramétrico, usando a correção pelo INPC. Estamos colocando esse valor como previsão. Não é a política do salário mínimo. O governo tem até dezembro para apresentar, e assim o faremos”, declara. Ele calcula que cada aumento de R$ 1 no mínimo terá impacto de R$ 298,2 milhões no Orçamento.
Para um integrante da equipe econômica, o governo vai precisar conversar com sua própria base para conseguir aprovar o novo piso. Se a regra atual fosse aplicada, a correção real seria de 1,1% em 2020, o que representaria custo extra de R$ 3 bilhões. O dilema para as contas públicas aumenta quando PIB estiver crescendo acima de 2% real. O impacto nas despesas do governo sobe e, com o teto de gastos (mecanismo que impede que as despesas cresçam em ritmo superior à inflação), pressiona ainda mais o Orçamento.
Com base na cesta mais cara do país – a de São Paulo, de R$ 509,11 – o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) calculou em R$ 4.277,04 o valor do salário mínimo necessário em março deste ano para suprir as despesas de um trabalhador e sua família com alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência. O valor equivale a 4,29 vezes o salário mínimo vigente no Brasil, de R$ 998. O salário mínimo em 2018 era R$ 954.