Cabrito acaba com Papai Noel
Havia um grupo de casais que procurava a cada ano auxiliar as chamadas comunidades, com presentes, alimentos e até dinheiro, quando a necessidade fosse premente. As famílias envolvidas eram pessoas da classe média que lutavam o ano todo e queriam oferecer uma parte do que conseguiam para aqueles que julgavam que nada receberiam nas datas em que a fraternidade deveria imperar e o amor de Cristo multiplicar as ações do bem. Havia uma coordenação técnica em que cada casal auxiliava com uma parte do que havia colhido no plantio de seu trabalho. Não eram dez por cento, para não dizer dízimo. Era o quanto cada um poderia ajudar. Alguns com mais, outros com muito. Depósitos, mês a mês, eram feitos, e todos se juntavam nos finais dos anos para o amor ao próximo ser concreto e não somente nas palavras abstratas.
Escolha de um local bem simples e pobre
Por votação escolheram naquele ano um local distante, adiante da Vila Elisa, em uma favela conhecida por reduto do “Dito Cabrito”. O tal de Cabrito era alguém à margem das definições e que sempre preferia o capim fresco e verduras das plantações vizinhas, onde o pasto e o plantio eram mais adubados e cuidados. As pessoas que ele explorava com aluguéis caros eram aquelas que sempre tiveram dificuldades para sobreviver e eram exploradas por “vivaldinos” que não gostavam de trabalhar.
Ajuda ao próximo no Natal
Os casais solidários se reuniram e votaram para direcionar a ajuda aos que eles julgaram carecer de apoio. Os homens se vestiram de “Papai Noel” e as senhoras de “Mamãe Noel”. Arrumaram um trenzinho todo enfeitado com frases natalinas de amor ao próximo e que demonstravam a solidariedade. Sem que tivessem consultado os traficantes do local, enfiaram o veículo com músicas natalinas carregando-os e levando todos os presentes. Eram muitos. No meio do caminho um tronco impedia a passagem da novidade. As crianças assistiam de longe a chegada daquele objeto estranho que julgavam ser de outros mundos e não do delas. Eis que, de inopino, um jeep mal ajambrado com alguns mequetrefes em andrajos que determinaram a parada do tal trenzinho, objeto de desejo infantil. Determinaram que as senhoras e os senhores retirassem as fantasias e que lhes passassem os presentes, celulares, dinheiro e o que de valor possuíssem. Abismados, assustados e não compreendendo o motivo da ação violenta, todos entregaram seus pertences. Ainda par garantir o temor dos apavorados solidários atiraram de metralhadoras para o alto. Foi rápido. Amealharam os bens de valor e não deram às crianças os brinquedos comprados. Não se sabe o que fizeram. O certo é que a polícia, quando chamada, compareceu ao local, mas não encontrou viva alma. Ali imperava a “omertá”, a lei do silêncio. Ninguém ousava a dizer nada. Depois de alguns anos as administrações drenaram a chamada “Lagoa da Candinha”, que se situava ao lado da Favela do Dito Cabrito e um loteamento foi autorizado com asfalto, infraestrutura e iluminação (a maior inimiga dos bandidos). Acabaram com a favela e casas alugadas. Fim da lagoa onde ficavam os marginais para o tráfico. O progresso inibe as ações das quadrilhas. Reflexão para os governantes. Para os solidários um aviso: nunca tentem ingressar em uma comunidade sem consultar os prefeitos e autoridades do tráfico e de seus representantes, pois os resultados podem ter consequências sérias.