Tribuna Ribeirão
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‘Venham todos, senhores, ver o grande faquir’
A cidade amanheceu plena de papeis. Os postes estavam com cartazes ainda respingando a cola dos impulsionadores do espe­táculo. O grande faquir viria visitar Ribeirão Preto e lançava um desafio a quem conseguisse ficar um mês encerrado em uma urna plena de pregos imensos, sem comer e sem beber água ou qualquer outra bebida. Oferecia um dinheiro considerável a quem ousasse a participar do seu repto. A emissora de rádio existente na oportunidade anunciava aos quatro ventos o feito do artis­ta que havia participado de cursos com os maiores monges do Oriente, nos mosteiros dos anacoretas, onde aprendeu a ficar sem comer, sem beber, etc. Somente seus assessores poderiam retirar as suas emissões do tipo 1 e do tipo 2.

Filas de curiosos
Filas imensas de curiosos se formaram na rua Duque de Caxias ao lado do hotel que fazia parte do “Quarteirão Paulis­ta”, cujo salão, com entrada lateral, seria feita a apresentação. A população que visitava o faquir precisava pagar um dinheiro considerável na época.

As comadres e aposentados da Praça XV
Os que comentavam os acontecimentos da cidade teimavam que não era verdade. Outros contestavam e garantiam que ele seria capaz, pois tinha a força do pensamento adquirida nos mosteiros dos altos das montanhas do Tibet. A discussão tomou conta de Ribeirão Preto. Até nas escolas o assunto foi debatido com as professoras sendo questionadas sobre a possibilidade de o pro­metido ser cumprido.

Autoridades participam da abertura
Foi programada uma abertura pomposa, com o Hino Nacional, o de Ribeirão Preto e palavras dos políticos comemorando o acon­tecimento. O faquir mesmo, não falou nada. Estava dentro de uma urna transparente, em cima de pregos ponteagudos – não havia explicação porque as peças não perfuravam a pele e a car­ne do artista e os boatos ainda eram mais insistentes. Ele ficaria dia e noite naquelas condições.

Plantão
Alguns curiosos montaram plantão diuturno para saber o que se passava. Houve quem se escondesse em telhado de lojinhas próximas e ficava a vasculhar o ambiente. Até uma determinada hora, permanecia um guarda civil da antiga Guarda Civil Estadual de plantão para organizar a fila e dar uma olhadela no tal faquir.

Eis que, no entanto, todavia e contudo…
Em dado momento da madrugada, os vigias de plantão constataram a entrada de vários galões de vidros com sucos e outras vitaminas para dentro do salão enfeitado. Alguns juram que viram: havia um tubo de borracha que se adaptava aos galões e o dito faquir tomava os sucos e vitaminas puxando os líquidos por dentro da urna. Um jornalista, chamado a constatar o logro, foi até lá e fotografou o fla­grante. O faquir saiu rapidinho de cima dos pregos e deixou a urna e seus ajudantes para trás, só não deixando o dinheiro arrecadado que era o bastante para ele se manter por alguns meses.

Faquir fajuto
Somente em Ribeirão Preto o embuste foi descoberto. Nunca mais ele passou por aqui. Nem pagou a conta do hotel. Tempos depois, apareceu na televisão, que ensaiava seus primeiros pas­sos. Todos os credores se manifestaram, cobrando o referido ar­tista das Arábias ou do Oriente, como preferia dizer. Foi um fato comentado em prosa e verso por muito tempo.

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