NELSON GONÇALVES- FOLHAS MORTAS
Como radialista e jornalista realizei durante anos um programa que visava estabelecer a relação entre causa e efeito, crime e castigo daqueles que erravam e eram condenados pelos seus crimes. Visitamos quase todas as penitenciárias, com autorização dos chamados setores competentes e ouvimos as histórias daqueles que pagavam pelos seus erros em locais horríveis, verdadeiras masmorras e outros em melhores condições como os da Prisão Aberta Javert de Andrade em Rio Preto, onde os detentos tinham direito ao trabalho e ao lazer. Foram milhares de entrevistas e muitos lamentáveis acontecimentos onde encontrávamos pena para crimes cometidos e algumas vezes indícios de erros judiciários, muitos dos quais corrigidos quando as autoridades eram alertadas.
CANTOR NELSON GONÇALVES
O cantor Nelson Gonçalves era disparado o maior ídolo de todas as faixas etárias naquela época. Possuía uma voz que envolvia a todos e era reconhecida até por outro grande ídolo da música norte americana, Frank Sinatra, como sendo uma das que conseguiam os maiores registros musicais. Ele foi preso por uso de cocaína e ficou na penitenciária de São Paulo recluso. Depois de algum tempo houve uma mobilização de D. Agnello Rossi e do lutador de Box Eder Jofre, campeão mundial de sua categoria, para que houvesse possibilidade de o cantor ser liberto. Com o envolvimento da sociedade e apoio das autoridades houve uma luta-espetáculo entre Nelson, que havia lutado boxe também, e Eder. Sucesso total.
VISITA À RIBEIRÃO PRETO
O cantor veio à Ribeirão Preto e se apresentou no Restaurante do Bosque. Poucas pessoas estavam nas mesas sempre lotadas pelos apreciadores da boa música. Nelson se magoou. Pedimos a ele uma entrevista e ele respondeu afirmativamente que nos concederia no Umuarama Recreio Hotel, defronte à Faculdade de Medicina, onde estava hospedado.
UMA CERVEJA
Sentamo-nos em uma mesa no apartamento em que se encontrava e depois de abrir uma cerveja começou a falar rapidamente, quase sem pausas. Ele era gago e somente quando cantava disfarçava a sua dificuldade. Disse que já era o cantor das multidões quando em um espetáculo em uma boate, cansado de muitos shows, alguém lhe ofereceu um pó branco, a cocaína. No primeiro momento a sua cabeça se abriu para o espetáculo e ele realizou o seu show sem se queixar das horas consumidas nas viagens etc. No dia imediato não houve necessidade de lhe oferecerem, ele procurou o pó trágico. Já não o livrava do cansaço, mas agravava as suas dores. Disse-me que sua mulher trancava a porta para que ele, em recuperação, não pegasse litros de leite e pães da vizinhança para trocar com a cocaína. Janelas e portas de sua casa eram trancadas. Na oportunidade ele tinha um orfanato onde cuidava de meninas junto com sua lutadora mulher. Discorreu sobre sua vida longamente. Uma história de algumas alegrias e de muitas tristezas.
FOLHAS MORTAS
No final do programa perguntamos a ele qual a música que representava a sua vida. Ele respondeu cantando: “Folhas mortas”.
RECUPERADO
Com a ajuda de muitos e principalmente de sua família ele se recuperou do vicio e deu a volta por cima na sua carreira. Fez questão de quando aqui esteve visitar a Cadeia Pública que era na Rua Duque de Caxias e somente com um violão, sem qualquer aparelho musical, cantou para os presos preenchendo o vazio das celas e dos corações dos apenados. Grande Nelson Gonçalves.