Gianlucca Contiero Murari *
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A Justiça reconheceu, recentemente, um importante direito das pessoas que pretendem realizar a passagem do seu patrimônio para a próxima geração com mais tranquilidade e segurança, um dos instrumentos mais utilizados para isso é a criação de uma empresa, que recebe os imóveis que estão em nome dos pais, de forma a centralizar os bens de raiz da família, cujas cotas são transferidas aos filhos.
Além de vantagens tais como a igualdade da participação dos irmãos no patrimônio familiar, maior segurança quanto a riscos de terceiros, possibilidade de os pais continuarem no controle dos bens por toda a vida, dispensa de testamentos e inventários para passar os bens aos filhos, dentre outras, o planejamento patrimonial utilizando de uma empresa inclui vantagens tributárias.
Uma delas é o direito constitucional que esta empresa tem de receber os imóveis da família sem pagar o imposto sobre transmissão de bens imóveis, o ITBI. Isso se dá porque a Constituição Federal prevê que a empresa só deverá pagar este imposto se ela exercer atividades imobiliárias (compra, venda, locação, arrendamento de imóveis), do contrário, ela é imune ao ITBI.
Ocorre que as prefeituras têm negado esse direito constitucional às empresas, alegando que o sócio não pode conferir os imóveis pelo valor histórico e, se o fizer, será devido o ITBI sobre a diferença entre este e o valor de mercado dos bens.
Elas têm se utilizado, para tanto, do Tema 796 do Supremo Tribunal Federal (STF) que, em 5 de agosto de 2020 julgou um caso semelhante, em que o sócio conferiu o imóvel à empresa utilizando o valor de mercado, destinando o menor valor (valor histórico) ao capital social, mas utilizando-se, também, da diferença entre o valor histórico e o valor de mercado para outros fins contábeis (no caso, a criação de uma conta de reserva de capital).
Ocorre que, a partir deste julgado, muitas prefeituras começaram a aplicar o entendimento de que o ITBI deve ser cobrado sobre a diferença entre o valor venal e o valor histórico dos bens a todas as empresas, mesmo que o sócio não tenha aproveitado esse valor de mercado para finalidades diversas à integralização do capital social.
Foi o que aconteceu em um julgado recente envolvendo o Município de Bertioga, SP: ao criar uma empresa visando ao planejamento patrimonial, o sócio conferiu seus bens imóveis pelo valor histórico. Para a transferência dos bens à empresa, a prefeitura alegou que o sócio não poderia ter atribuído o valor histórico aos bens, e portanto exigiu o pagamento do ITBI sobre a diferença entre o valor histórico e o valor venal dos bens, com base no Tema 796 do STF. O empresário, inconformado, recorreu à Justiça.
Os advogados Ana Cristina de Paiva Franco Toledo, Gianlucca Contiero Murari e Diego Dantonio Nomiyama, do escritório Dosso e Toledo Advogados, que defendem o empresário, entendem que “as prefeituras estão agindo contra um direito líquido e certo que constitui uma garantia fundamental constitucionalmente prevista e deve ser assegurado para garantir efetividade ao planejamento patrimonial e à atividade empresarial”.
De acordo com a 15ª Câmara de Direito Público, corte responsável pelo julgado, houve o reconhecimento de que a base de cálculo do ITBI deve ser o valor declarado pelo contribuinte, que goza da presunção de que condiz com o valor de mercado, o que somente pode ser afastada pelo fisco mediante processo administrativo próprio (que hão existiu), conforme reconhecido pelo relator do processo, desembargador Raul de Felice.
A cobrança do tributo em desconformidade com a Constituição Federal e o Código Tributário Nacional violam o direito líquido e certo de muitos contribuintes, e atrapalha planejamentos patrimoniais e a atividade empresarial. Pelas razões acima expostas, é fundamental a assessoria jurídica especializada para a estruturação, elaboração e finalização de planejamentos sucessórios e patrimoniais.
* Advogado