O juiz Reginaldo Siqueira, da 1ª Vara da Fazenda Pública de Ribeirão Preto, determinou o bloqueio de bens no montante de R$ 769,6 mil da ex-prefeita Dárcy da Silva Vera (sem partido), da Confederação Brasileira de Automobilismo (CBA) e da Vicar, empresa responsável pelas provas da Stock Car. A decisão tem por base a verba para divulgação da primeira prova da categoria na cidade, realizada em 2010. A defesa da ex-chefe do Executivo municipal não vai comentar o assunto – imóveis dela foram bloqueados, como a casa no bairro da Ribeirânia e um apartamento na Vila Tibério.
O bloqueio é uma resposta a ação civil ajuizada pelo Ministério Público Estadual (MPE), que também cobra a reparação dos recursos repassados pelo Ministério do Turismo na ordem de R$ 2 milhões. Uma petição da CBA foi anexada ao processo em que a entidade oferece sua sede como garantia para evitar um eventual bloqueio dos ativos financeiros, que somam mais de R$ 1 milhão, e caso os R$ 769,6 mil fossem bloqueados, implicaria na paralisação das atividades, no pagamento de funcionários e também na organização de corridas de automóvel.
A sede da confederação fica em área nobre do Rio de Janeiro, na rua da Glória, na Zona Sul da cidade, e o imóvel está avaliado em cerca de R$ 5 milhões. Ninguém da Vicar foi encontrado para comentar a decisão. Dárcy Vera foi condenada, em 23 de abril de 2018, pelo suposto desvio de R$ 2,2 milhões provenientes do Ministério do Turismo (MTur) para realização de uma das etapas da Stock Car, em junho de 2010, primeiro ano da competição em Ribeirão Preto e que levou cerca de 45 mil pessoas à Zona Sul da cidade. A ex-chefe do Executivo municipal, que exercia o primeiro mandato à frente do Palácio Rio Branco (2009-2012), nega a prática de crimes.
O juiz Eduardo José da Fonseca Costa, da 7ª Vara Federal de Ribeirão Preto, condenou a ex -prefeita a cinco anos de prisão em regime semiaberto. O magistrado acatou denúncia dos procuradores da República e impôs penas de dois anos por desvio de recursos públicos em proveito próprio ou de terceiros e de três anos por dispensa indevida de licitação – trata de dois artigos diferentes, mas foram somadas para chegar ao total determinado pela Justiça.
O processo está em fase de recurso e tramita na 11ª Vara do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3), em São Paulo. O relator é o desembargador Nino Toldo. A defesa de Dárcy Vera sustenta que ela não cometeu crime e merece ser absolvida. Os procuradores acusam a ex-prefeita de ter cometido improbidade administrativa e afirmam que o município teria “confessado” a culpa ao devolver o valor diretamente aos cofres da cidade, quando foram constatadas as irregularidades.
O entendimento do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre convênios de repasse de verba federal não permite que os recursos recebidos, ou as obrigações advindas dos convênios, sejam repassados integralmente a terceiros. Darcy Vera, no entanto, havia assinado, em maio de 2010, termo de convênio entre a prefeitura de Ribeirão Preto e a Confederação Brasileira de Automobilismo, contratando a entidade para promover os serviços de publicidade do evento sem que fosse feito procedimento licitatório.
A terceirização do objeto do convênio do Ministério de Turismo foi ilegal, e serviu para o desvio da totalidade das verbas públicas federais recebidas para a CBA. As despesas da prefeitura com a CBA sequer foram comprovadas. A prestação de contas das verbas públicas foi apresentada ao MTur de forma ineficaz e inidônea: consistiu apenas em quatro recibos, desacompanhados de notas fiscais, emitidos pela empresa Vicar Promoções Desportivas S/A, a quem a CBA teria “quarteirizado” o objeto do convênio, diz a Procuradoria Regional ao afirmar que a contratação deveria ter sido feita via licitação.
A advogada da ex-prefeita, Maria Claudia Seixas, recorreu por entender que “não há, e isso é bem certo, comprovação da autoria delituosa no entendimento da defesa.” O caso passou a ser investigado pelo MPF depois que a União reprovou por duas vezes a prestação de contas do convênio e notificou a administração a devolver a verba. Segundo o governo federal, Dárcy Vera não comprovou a aplicação do valor.
O processo não tem relação com o caso de corrupção da Operação Sevandija, que gerou a condenação de Dárcy Vera a 18 anos, nove meses e dez dias de prisão – em regime fechado – pelos crimes organização criminosa e peculato na ação penal dos honorários advocatícios. É acusada de chefiar um esquema que teria desviado R$ 45,5 milhões dos cofres públicos. Ela nega e diz que vai provar inocência. A ex-prefeita está presa na Penitenciária de Tremembé desde 19 de maio de 2017.
Em 2013, o governo municipal assinou um acordo, parcelando a devolução – corrigida em R$ 2,346 milhões – em 24 vezes para não correr o risco de perder outros convênios federais, como recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Sobre a devolução de verba pela prefeitura, o juiz Eduardo José da Fonseca Costa argumentou que o ressarcimento não minimiza a responsabilidade da ré porque foi feito com dinheiro público, “caracterizando-se o prejuízo ao erário municipal”, disse o magistrado.
Ribeirão Preto sediou quatro etapas da Stock Car entre 2010 e 2014. No primeiro ano, o município e a União celebraram um convênio para ações de publicidade do município no evento: R$ 2 milhões foram repassados pelo governo federal e R$ 200 mil disponibilizados pela prefeitura – ao fazer o ressarcimento de R$ 2,346 milhões, Dárcy Vera pagou R$ 346 mil de “juros”.
Na prestação de contas, no entanto, a execução financeira da verba, ou seja, os documentos fiscais que comprovariam os gastos do recurso, foram reprovados por duas vezes e o Ministério do Turismo determinou que a prefeitura devolvesse o valor. A advogada Maria Cláudia Seixas disse em abril do ano passado que tudo será esclarecido ao final do processo e que provará a inocência de sua cliente. A CBA disse anteriormente que está á disposição da Justiça e que o contrato com a prefeitura é legal. A Vicar não se pronunciou.