O juiz Augusto Martinez Perez, da 4ª Vara Federal de Ribeirão Preto, afirmou não ter dúvidas sobre a participação de servidores públicos – entre prefeitos, secretários municipais e vereadores – em um amplo esquema de fraude em licitações e cartelização nos contratos de merendas de pelo menos 50 municípios paulistas. Por ordem do magistrado, a Polícia Federal foi às ruas para cumprir 27 mandados de prisão temporária e 57 de busca e apreensão nesta terça-feira, 26 de novembro.
Na região de Ribeirão Preto, a PF cumpriu cinco mandados de prisão. O magistrado também bloqueou cerca de R$ 2 bilhões de todos os acusados. Empresários e servidores públicos de Franca, Orlândia, São Joaquim da Barra e Taquaritinga foram denunciados e a Justiça de Ribeirão Preto expediu mandados de prisão temporária de cinco dias. Policiais federais prenderam José Luiz Rodrigues Zavier, Cleibe Ribeiro da Silva, Cleire de Souza e Adriana Maria Pedrassoli.
A PF também apreendeu aparelhos eletrônicos do ex-prefeito de Franca, Alexandre Ferreira, que foram devolvidos. No processo, um dos empresários investigados disse que nunca falou com o então prefeito francano e ressaltou que não conhecia Ferreira. O responsável pela operação, delegado Bruno Rigote, informou na coletiva de imprensa, na sede da PF de Ribeirão Preto, que ninguém foi preso na metrópole.
A segunda fase da Operação Cadeia Alimentar mira fraudes no fornecimento de merenda escolar no período entre 2013 e 2017. Entre os alvos da operação estão três empresários, quatro lobistas, quatro servidores públicos, uma vereadora do litoral paulista, um procurador de município, três ex-prefeitos, dois secretários municipais e cinco ex-secretários de prefeituras. Os alvos são acusados dos crimes de cartelização, fraude a licitações, falsidade ideológica e organização criminosa.
Ao abrir a decisão que autoriza a Cadeia Alimentar 2, o juiz Perez relembrou citação proferida por ele mesmo na primeira etapa da operação. “A Lei de Licitações é ignorada e o caráter competitivo da licitação é letra morta.” “Há indícios veementes da prática dos delitos de associação criminosa, além do crime de fraude nas licitações, tudo a recomendar a custódia temporária dos envolvidos”, diz o magistrado.
Perez destaca, ainda “registro não existir dúvidas quanto à participação dos investigados em associação criminosa nos vários municípios relacionados pela autoridade policial, sempre de forma estável e com divisão de funções”. A segunda fase da operação foi deflagrada com base nas delações premiadas de José Geraldo Zana e Jorge Luiz Rodrigues, dono e funcionário do frigorífico Mult Beef, respectivamente, em Brodowski. Além de fatos já conhecidos dos investigadores, os delatores apresentaram provas de envolvimento de agentes públicos e políticos no esquema.
O Ministério Público aponta que os investigados direcionavam licitações para favorecer empresas mediante pagamento de propina de 10% do valor do contrato. A fraude ocorria por meio de simulação de concorrência, ajuste prévio de preços e inclusão de exigências técnicas que limitavam a participação de outros interessados. O processo corre em sigilo de Justiça. De acordo com o juiz Augusto Martinez Perez, da 4ª Vara Federal de Ribeirão Preto, a Polícia Federal aponta para o envolvimento de integrantes do esquema delatados pelo dono da Mult Beef que não foram atingidos na primeira fase da Operação.
As provas obtidas nas buscas realizadas nesta terça-feira serão usadas para comprovar os fatos citados pelo empresário. “As medidas restritivas pleiteadas se prestam a obter provas de novos delitos, eis que provavelmente continuam a praticar fraudes até os dias de hoje, uma vez que alguns continuam exercendo cargos públicos, ou exercem atividade empresarial participando de certames licitatórios, ou são ‘lobistas’ buscando a satisfação de interesses próprios ou encobrindo a participação de terceiros (via de regra políticos)”, afirma Perez.
A prisão temporária dos alvos visa impedir a “destruição ou ocultação” de provas, segundo o magistrado. “Havendo indicativos de que os investigados continuam em atividade, envolvidos em crimes relacionados a fraudes em processos licitatórios e corrupção de servidores, com mais razão se justifica a prisão temporária, de modo a garantir a higidez da colheita da prova”, afirmou o juiz federal.
Perez é taxativo. “De outro lado, a prática de crimes de forma habitual e profissional há anos é indicativo seguro de risco à ordem pública, valendo o registro de que é provável a manutenção pelos investigados de contratos ativos com a administração pública, tudo a recomendar a sua interrupção de modo a evitar que os mesmos esquemas delatados estejam sendo empregados nesses contratos.”
Mais de 240 policiais federais cumpriram 57 mandados de busca e apreensão e 27 mandados de prisão temporária em 27 cidades do Estado de São Paulo. O Ministério Público Federal (MPF) indicou que as irregularidades sob investigação na segunda etapa da Cadeia Alimentar abrangem contratos de 23 municípios paulistas: Americana, Barretos, Barueri, Cubatão, Franca, Guarujá, Guarulhos, Iperó, Itapetininga, Jandira, Jarinu, Limeira, Marília, Morro Agudo, Paulínia, Peruíbe, Pirassununga, Porangaba, Rio Claro, São Carlos, São Roque, São Vicente e Sorocaba.