O juiz da 1ª Vara da Fazenda Pública de Ribeirão Preto, Reginaldo Siqueira, concedeu liminar em ação popular impetrada pelo Partido Democrático Trabalhista (PDT) e barrou as obra de dois empreendimentos na zona leste da cidade, área de recarga do Aquífero Guarani. Em caso de descumprimento, o magistrado impôs o pagamento de multa diária de R$ 100 mil. A decisão é de quarta-feira, 11 de outubro.
A Prefeitura de Ribeirão Preto não foi notificada e diz que só vai se manifestar depois de ter acesso ao conteúdo da ação. Já Ricardo Silva, presidente do Diretório Municipal do PDT, o ex-vereador e candidato derrotado nas eleições municipais do ano passado, diz que a decisão é “uma vitória da sustentabilidade. Na condição de presidente do Diretório Municipal do PDT, definimos que essa seria uma ação de partido e de bancada, tornando-se medida fundamental para a preservação do meio ambiente e de nossa água”.
“Durante o segundo turno das últimas eleições, afirmávamos que a proteção da região leste é medida que deve se impor, já que nossa cidade é abastecida por esse grande manancial de águas subterrâneas. A decisão judicial fortalecerá o debate em torno do Plano Diretor, no sentido de sensibilizar os senhores vereadores a inserirem o dispositivo necessário à proteção da área de recarga do Aquífero Guarani”, diz em nota.
O juiz Reginaldo Siqueira determinou a suspensão imediata das obras dos conjuntos Reserva Real e Parque das Gaivotas. Ele explica que o primeiro vai ocupar uma área de 500 mil metros com edifícios verticais de até quatro pavimentos, totalizando 2.500 unidades habitacionais, com capacidade para abrigar até 8.500 moradores, o que representa um incremento populacional de 22,89% na área de influência do empreendimento.
“Apesar de a área não se localizar nos setores da Zona de Uso Especial (ZUE), indispensável para a manutenção da impermeabilização do solo, ainda assim necessita de maior controle para evitar a contaminação em região de recarga do Aquífero Guarani”. Sobre o outro condomínio, diz que “a área do empreendimento apresenta porções localizadas em Zona de Proteção Máxima (ZPM), que não admite edificação e aterros e exige a conservação da vegetação natural, por exercer função de proteção de manancial e recarga de aquífero subterrâneo”.
O magistrado ressalta ainda que a aprovação do empreendimento na esfera municipal ocorreu na gestão passada, cuja parte da cúpula do Executivo, no que se incluem a ex-prefeita Dárcy Vera e o ex-superintendente do Departamento de Água e Esgotos de Ribeirão Preto (Daerp), Marco Antonio dos Santos, estão presos acusados de corrupção. O Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (Gaema) é contra a ocupação em massa da zona leste, por causa do Aquífero Guarani. O ideal, segundo especialistas, seria a destinação da área para chácaras de lazer, mas não com a construção de conjuntos habitacionais que gerem impacto no local.
O Aquífero Guarani é um reservatório subterrâneo de água com 1,2 milhão de quilômetros quadrados de extensão e que se estende por sete estados do Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai. Em Ribeirão Preto, cidade que mais usa o manancial – todo o abastecimento da população é feito via poços artesianos, 114 somente do Daerp –, segundo o Grupo de Atuação Especial do Meio Ambiente (Gaema), o reservatório sofre rebaixamento de um metro de profundidade por ano e, nas últimas décadas, o nível da reserva caiu 72 metros.
Nesta segunda-feira, 16 de outubro, a Prefeitura de Ribeirão Preto realizará, no Salão Nobre do Palácio Rio Branco, duas reuniões para apresentar o texto final do projeto de revisão do Plano Diretor. Também será divulgada uma prestação de contas sobre os trabalhos realizados e as contribuições que foram acolhidas para embasar o texto final. Uma das polêmicas do projeto trata exatamente da zona leste.
Para agilizar a aprovação do Plano Diretor na Câmara, a Prefeitura chegou a cogitar a retirada do artigo que trata da preservação da área de recarga do Aquífero Guarani, na zona leste. A estratégia é empurrar essa discussão para a Lei de Uso e Ocupação do Solo, que pode ficar para o ano que vem. Assim, constaria no Plano Diretor apenas uma breve menção sobre o manancial subterrâneo e não mais um artigo que proíba a expansão imobiliária na área de recarga.
A medida é vista com preocupação pelos promotores Luís Henrique Paccagnella e Cláudia Habib, do Gaema. Em novembro de 2015, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) derrubou uma liminar que protegia da expansão urbana uma área de 65 quilômetros quadrados – equivalente a nove mil campos do Maracanã – do Aquífero Guarani. A decisão suspendeu uma das maiores medidas já tomadas para preservação da segunda principal reserva hídrica subterrânea do mundo.