Janeiro, talvez o mês que concentra o maior potencial de projetos individuais percorrendo o imaginário coletivo. Essa capacidade de projetar é exatamente o que diferencia o ser humano de outros animais, bem como, a certeza de nossa finitude.
Nessa realidade, caminhamos resvalando em pólos que compreendem a sociabilidade humana: amparo e desamparo; medo e esperança, o que inevitavelmente impõe certa medida de sofrimento. Se nascemos com relações sociais determinadas e as contraímos independentemente de nossa vontade, a forma como nos relacionamos e sofremos, parte de uma certa forma de ser em sociedade.
Dessa maneira, refletir sobre nossa saúde mental impõe também trazer em cena aspectos societais, em suas contradições e manifestações decorrentes da relação existência x consciência. Assim, o conceito de saúde mental se anuncia em movimento, tendo o contexto social prenhe de determinantes, tornando possível formular algumas questões, tais como: como nos vemos? Como vemos aqueles que entendemos diferentes?
Historicamente, o sofrimento mental é enfrentado em um terreno permeado por estigmas e preconceitos. Lembremos que até a década de 1970, no Brasil, a única possibilidade de se tratar pessoas em sofrimento mental se dava por meio de internações em manicômios. Em geral, quem eram essas pessoas? Pessoas internadas porque se sentiam tristes, porque eram epilépticos, alcoolistas, homossexuais, prostitutas, meninas grávidas violentadas pelos patrões.
Celebrar o “Janeiro Branco” é chamar a atenção para a permanente necessidade de se romper com esse passado recente, cujos matizes de preconceito e estigma ainda constituem a realidade de boa parcela de nossa sociedade. Trata-se de buscar a sensibilização para outras formas de sociabilidade e, consequentemente, para outras maneiras de cuidado, ou seja, propõe uma nova perspectiva de resgate da cidadania e de aparecimento do sujeito, que foi por muito tempo tolhido e anulado. “Janeiro branco” foi pensado tendo nesse mês a representação de certo marco de esperança e a cor branca devido ser a única cor em que todas as outras aparecem, portanto, traz um caráter democrático e profundamente inclusivo.
Afinal, como diria o poeta: “de perto, ninguém é normal” (Caetano Veloso).