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Já se fala de impeachment e de interdição

A semana foi pródiga de mais sandices por parte do presidente da República. O pior foi a agressão que fez ao presidente da OAB, Felipe Santa Cruz, cujo pai, Fernando Santa Cruz, é considerado uma das vítimas da ditadura militar, assassinado por forças do Estado Brasilei­ro, de acordo com documentos oficiais da Comissão da Verdade. Ele era militante da Ação Popular (AP), uma organização de esquerda que fazia oposição armada ao regime à época. Bolsonaro afirmou publi­camente que Fernando foi morto por outros companheiros da sua organização. O presidente da OAB entrou no STF com uma represen­tação contra o presidente para que ele apresente informações e provas que eventualmente tenha sobre o assunto.

Bolsonaro reagiu, dessa forma, contra o encerramento do pro­cesso da Polícia Federal que considerou Adélio Bispo inimputável pela facada que lhe deu. Ele se insurge contra a OAB por ter impedi­do a quebra dos sigilos dos advogados de Adélio. Em nota oficial, a OAB repudiou as declarações de Bolsonaro e prestou solidariedade à família de Santa Cruz. “Apresentamos nossa solidariedade a todas as famílias daqueles que foram mortos, torturados ou desaparecidos, ao longo de nossa história, especialmente durante o Regime Militar de 1964, inclusive a família de Fernando Santa Cruz, pai de Felipe Santa Cruz, atingidos por manifestações excessivas e de frivolidade extrema do Senhor Presidente da República.”

Aconteceram ainda durante a semana fortes reações de vários setores da sociedade, incluindo a ABI, contra a portaria de Sérgio Moro sobre a deportação de estrangeiros e contra as insinuações de Bolsonaro para incriminar o jornalista Glenn Greenwald, editor do site The Intercept Brasil, pelas revelações escabrosas da Vaza Jato. Desconhecendo o que afirma a Constituição, ele pressiona pela criminalização da garantia de sigilo da fonte para os jornalistas. Ele se insurge contra prerrogativas constitucionais de advogados e jornalistas. A temperatura se eleva a cada dia. Entre juristas, congressistas e acadêmicos, a hipótese de impeach­ment do presidente já se coloca no horizonte.

A jornalista Míriam Leitão demonstra sua repulsa a Bolsonaro: “o presidente decidiu brincar com mais um drama humano e dizer ao pre­sidente da OAB, que sabia como o seu pai havia morrido. Depois, criou a sua versão que culpa a esquerda. O que o presidente fez é repulsivo”. E prossegue: “Ele mostra, como definiu Felipe Santa Cruz, crueldade e a falta completa de empatia que os seres humanos têm uns em relação aos outros. O presidente brinca com o sentimento de um filho que nunca conviveu com o pai”. Bolsonaro não tem sentimento de dor humana. É bom lembrar que, ainda esta semana, debochou publicamente do massa­cre de 58 presos de Altamira, no Pará.

Depois de assinalar que Bolsonaro se coloca “como o conhecedor dos segredos da ditadura” e de “informações sonegadas”, Míriam ainda escre­veu: “O presidente se sente no direito de manipular as informações que foram sonegadas ao país e às famílias e jogar a culpa sobre as vítimas”. E finaliza: “A Constituição anda sendo desrespeitada diariamente pelo presidente da República. É hora de lembrar o que disse o grande Ulysses Guimarães ao promulgar a nossa Carta Magna em 88: ‘Temos ódio à ditadura, ódio e nojo’. Ontem foi o dia de sentir nojo”. O impeachment, sem dúvida alguma, está no horizonte dessas palavras.

Mas a grande novidade da semana é que uma direita mais civilizada já demonstra grande desconforto com esta verdadeira aberração política que ela mesma ajudou a criar. Uma declaração de Miguel Reale Junior foi icônica. Ele foi um dos autores do pedido de impeachment da presidenta Dilma. Ele afirmou: “Estamos realmente num quadro de insanidade, das mais absolutas. Não é mais caso de impeachment, mas caso de interdição. Hoje o presidente da Repú­blica se sentiu no direito de ofender a todos nós, não só os advoga­dos, mas todos que prezam pelos direitos humanos, provocando o presidente e a OAB”. Já se fala em impeachment e em interdição por absoluta falta de condições, inclusive mentais, do presidente para governar o país. Aliás, não foi por outro motivo que ele foi afastado dos quadros do Exército durante o regime militar.

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