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Inteligência e seus descontentes (28): O lado escuro do QI na meritocracia

Há muitas críticas acerca da associação entre QI e meritocracia, mesmo quando a mesma funciona eficientemente. Uma das desvan­tagens da meritocracia intelectual é que, no século 21, ela incentiva a balcanização e polarização social. Progressivamente, os cidadãos associam-se com pessoas que têm condições econômicas e níveis de inteligência similares. Às vezes, digo que apenas olhando o CEP da região que alguns indivíduos residem posso inferir com quem eles se associam e as condições de qualidade de vida em que habitam. Como consequência, pessoas são progressivamente pobres em entender os pontos de vistas e desafios de pessoas que estão em diferentes níveis de QI. Sempre digo que lhes faltam empatia cognitiva. O fato de muitos líderes em negócios, organizações e governos serem pessoas, em geral, inteligentes, significa que tomadores de decisões são desconectados das necessidades das pessoas médias ou abaixo da média que experienciam as consequências das decisões tomadas nas altas esferas administrativas. Isto invariavelmente resulta em descontentamento com líderes políticos sociais e em convulsão social.

Outro problema com a meritocracia baseada no QI é que ela cria a ilusão de que os beneficiários ganharam seu caminho ao topo da hierarquia social. De fato, quando um emprego altamente bem remu­nerado requer formação universitária e domínio do conhecimento e habi­lidades, pode parecer que estes esforços devem ser recompensados. Todavia, o vento que a inteligência fornece em variadas arenas da vida faz com que a vida seja mais fácil para as pes­soas com QI mais elevado dominarem muitos desafios cognitivos que a meritocracia requer que as pessoas sobrepujam. Por exemplo, evidências contínuas revelam que inteligência é correlacionada com velocidade de aprendizagem e aptidão, o que significa que as pessoas inteligentes serão hábeis para aprender um currículo educacional mais rapidamente e com poucos erros. Não obstante, devemos deixar claro que alta inteligência não é garantia de sucesso e nem baixa inteligência indicativo de fracasso. Há muitas outras variáveis que podem afetar a interação entre inteligên­cia e desempenho em diferentes arenas ao longo da trajetória da vida.

Por último, a meritocracia intelectual tem a desvantagem de ser uma espécie de aristocracia herdada. Isto ocorre porque inteligência é parcialmente herdada e pais brilhantes, os quais são mais prováveis de estarem no topo da hierarquia social, são mais prováveis de terem crianças que são mais brilhantes do que a média. A herança genética irá ajudar suas crianças prosperarem na meritocracia, exatamente como os pais fizeram. Classes sociais passam de uma geração para outra, ainda que imperfeitamente, o que é contrário aos valores de muitas sociedades democráticas ocidentais. Ao contrário de muitas barreiras sociais, e até mesmo de barreiras intelectuais e econômicas, as barreiras genéticas numa meritocracia baseada no QI podem ser muito mais difíceis de serem recuadas, bem como, de ser tão prejudiciais como as barreiras sociais que sustentaram hierar­quias mais antigas.

Devido a estas conside­rações, entendo que para alcançarmos uma sociedade mais justa e igualitária, mas que respeita as diferenças individuais inerentes às pessoas, tal sociedade deve, por fun­damento e sempre, promover as habilidades cognitivas, os talentos individuais e as competências individuais e agregá-las a favor do bem estar coletivo. Devemos pensar numa inteligência adaptativa.

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