Dívida totaliza R$ 656 milhões e tem no Imposto Predial e
Territorial Urbano o maior número de devedores
Na quarta-feira, 30 de janeiro, a aposentada Benedita Prado Silva, de 73 anos, procurou a Secretaria Municipal da Fazenda para renegociar o pagamento do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) de sua casa localizada no Jardim Salgado Filho I, zona Norte da cidade. Com uma renda familiar de R$ 1 mil reais por mês dona Benedita tem em atraso o imposto referente ao ano passado, mas diz que o débito foi algo momentâneo e que irá quitá-lo o mais rápido possível.
Embora possa parecer um caso isolado, a realidade tributária da aposentada é algo comum em Ribeirão Preto. Levantamento feito pelo Tribuna junto à Secretaria Municipal da Fazenda revela que 105.909 contribuintes estão inscritos na Dívida Ativa do município pelo não pagamento de tributos municipais. O número representa 15% da população de Ribeirão Preto atualmente de 694.534 pessoas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Vale destacar que o débito é incluído na Dívida Ativa, na mudança do exercício fiscal – ou seja, de um ano para o outro.
O valor dos débitos também impressiona e totaliza R$ 656.261.345,86 que deixaram de entrar nos cofres municipais. A maior parte das dívidas refere-se à inadimplência no IPTU, R$ 148,2 milhões, ao não pagamento das Taxas de Funcionamento, R$12,9 milhões e ao Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza fixo (ISSQN): R$ 12,4 milhões. Só para se ter uma ideia do tamanho do rombo, o total que a Prefeitura tem para receber é superior ao Orçamento da Prefeitura de Sertãozinho para este ano, estimado em R$ 456 milhões.
Segundo o secretário da Fazenda de Ribeirão Preto, Manoel Gonçalves, a administração municipal tem trabalhado para receber este dinheiro. Ele destaca, porém, que existem alguns fatores que travam o processo. Os principais são o chamado “crédito podre” e o custo da execução fiscal. São consideradas como crédito podre as dívidas que dificilmente serão pagas porque, entre outros fatores, o devedor não possui bens para serem penhorados.
Já o custo de execução fiscal diz respeito ao valor que o município gastará com os trâmites processuais para fazer a cobrança judicial. Se ele for superior ao valor da dívida não compensa para a Prefeitura ajuizar o débito porque o valor da dívida será menor do que ela gastará para receber. No caso de Ribeirão Preto a lei Municipal 2687, de 2014, elaborada após análise deste custo, estabeleceu que somente dívidas de R$ 2 mil reais ou mais devem ser ajuizadas.
Com isso, as dívidas menores do que este valor acabam restritas a um processo administrativo que tem como maior penalidade a negativação do nome do contribuinte devedor por um período de cinco anos, como determina a legislação sobre o assunto. O secretário lembra ainda que a análise de títulos passíveis de recuperação depende de decisões judiciais e que a Secretaria realiza procedimentos periódicos de “limpeza” da dívida em função de decisão judicial que atinja determinada situação e que abranja vários contribuintes. “Temos priorizado as cobranças, mas isso demanda tempo”, completa o secretário.
Para o advogado especializado em Direito Tributário, Rodrigo Bernardes Ribeiro, a principal medida que o município precisa adotar para receber parte desta dívida é focar suas ações sobre o devedor. Ou seja, além de impetrar a execução fiscal é preciso que se “faça pressão” e tente encontrar bens passíveis de serem dados em garantia. “Não basta apenas ajuizar o débito. É preciso insistir e buscar mecanismos para recebê-lo”, diz.
20% de inadimplência no Daerp
Dados do Departamento de Água e Esgotos de Ribeirão Preto (Daerp), mostram que no final do ano passado o percentual de inadimplentes era de cerca de 20% do número de ligações. Como a cidade possui 194,4 mil ligações de água o total de devedores naquele período era de 38 mil usuários. A autarquia, contudo, não soube informar o valor desta dívida, já que o cálculo “não se trata de proporção direta. Muitos inadimplentes devem mais de uma conta”, explicou. Atualmente o Departamento está realizando a transição de seu sistema comercial o que possibilitará análise mais complexas sobre o assunto.
Para diminuir a inadimplência o Daerp tem notificado os inadimplentes e oferecido a negociação das contas em atraso e os débitos podem ser parcelados de acordo com critérios fixados no regulamento da autarquia. “Neste ano estão sendo programadas ações mais efetivas de redução da inadimplência, com a intensificação da cobrança amigável, a negativação do nome do usuário e a suspensão do fornecimento”, explica a Autarquia.
PRINCIPAIS DÉBITOS EM DÍVIDA ATIVA
IPTU R$ 148.255.192,75
TAXAS DE FUNCIONAMENTO R$ 12.973.517,20
ISSQN FIXO R$ 12.440.209,27
Priorizar a cobranças dos grandes devedores
Problema recorrente nos municípios, a cobrança da dívida ativa de tributos municipais esbarra em carência de pessoal, burocracia, falta de informatização e vontade política na implantação de um sistema efetivo de cobrança dos impostos atrasados.
Devido a essas dificuldades, o Poder Público deve priorizar o processamento e a cobrança de dívidas de grande valor, quer seja de IPTU, ISS, ITBI, taxas e tarifas em geral. Grandes devedores geralmente possuem bens e imóveis em condições de penhora.
Atenção especial à cobrança de ISS (Imposto Sobre Serviços) de bancos e instituições financeiras, que tradicionalmente são péssimos pagadores de tributos em que pese os astronômicos lucros do setor no Brasil nas últimas décadas. O poder da Federação Brasileira dos Bancos nos Tribunais Superiores (Brasília) é um capítulo à parte nesta disputa de cobrança de impostos entre Prefeituras x Bancos.
A situação é agravada pela reiterada criação de “Refis Municipal”, que tem seu lado positivo no aumento da arrecadação municipal e na possibilidade de quitação de débitos com desconto e/ou de forma parcelada. Mas, por outro lado, tem reflexos negativos sobre o contribuinte que paga seus impostos em dia e constata na prática que os inadimplentes são beneficiados por melhores condições de pagamento.
Visando facilitar e desburocratizar o pagamento de tributos, o Governo de São Paulo e algumas Prefeituras (exemplo de Igarapava) adotam o sistema de pagamento via cartão de crédito e de débito com possibilidade de pagamento parcelado. O contribuinte passa o cartão uma única vez e evita o transtorno de pagamentos mensais de boletos em bancos lotados e repartições públicas.
Marco Aurélio Damião – advogado especialista em Direito Público